A prevalência dos transtornos alimentares vem crescendo de maneira assustadora e, talvez, seja essa uma das manifestações que fazem ver mais claramente os reflexos da cultura contemporânea na saúde mental das pessoas. Outro aspecto importante é que, muitas vezes, as pacientes não buscam tratamento por não acreditarem que estejam doentes e que o interesse pela perda de peso seja apenas fruto da necessidade de se manter dentro dos padrões de beleza estabelecidos pela sociedade.
De acordo com o coordenador do ambulatório, o psiquiatra Celso Garcia Júnior, as pacientes com anorexia nervosa recusam-se a se alimentar adequadamente, submetendo-se a dietas restritivas irracionais realmente patológicas que levam a evidente perda de peso, chegando a níveis inferiores a 85% do peso mínimo normal. Tal comportamento é secundário a uma perturbação da autopercepção da imagem do corpo e do medo mórbido de engordar, mesmo quando a própria vida é colocada em risco. Alguns trabalhos mostram que a mortalidade desta doença pode chegar a 20%.
Já a bulimia nervosa consiste de episódios recorrentes de compulsão alimentar, com ingestão de uma quantidade de comida definitivamente maior do que a maioria das pessoas consumiria em período e circunstâncias similares, associados a métodos compensatórios que visam prevenir o ganho de peso. Estes métodos podem ser, entre outros, o uso de laxantes e diuréticos, a auto-indução de vômitos, períodos de jejum e atividades físicas excessivas. Segundo os especialistas, ao se considerar objetivamente um episódio de farra alimentar, é necessário avaliar o contexto no qual a refeição ocorreu, já que algumas vezes por exemplo, durante uma celebração ou uma ceia festiva pode-se comer em quantidade que seria excessiva para uma refeição habitual, sem que isso seja classificado como sintoma de bulimia nervosa.
Manequim Há tempos, a atividade de “modelo-manequim” tem habitado os sonhos de meninas e mães, não necessariamente nessa ordem. Na cultura ocidental, a beleza feminina é idealizada com base na magreza: ser magra representa valores como competência, autocontrole, sucesso e sensualidade. Propagandas de dietas e cirurgias plásticas estão presentes em nosso cotidiano reforçando a idéia de a forma do corpo pode ser sempre alterada. Certamente este contexto sociocultural pode ser considerado como um dos fatores causais dos transtornos alimentares.
Entretanto, o psiquiatra Celso Garcia Júnior destaca que este aspecto sociocultural provavelmente não é a principal causa da doença. O registro de anorexia nervosa e bulimia em populações orientais, onde esta preocupação estética é menor, denuncia também os fatores biológicos e psicológicos. Por isso, segundo Maria Marta Battistoni, psicóloga da equipe do Ambulatório de Transtornos Alimentares, a dinâmica da família é outro aspecto a ser avaliado. “Em muitas famílias os papéis de pai, mãe e filha não são claros, o que dificulta a necessária diferenciação entre os membros. Queremos atuar também nessas famílias, pois o problema pode estar mais nos pais do que na filha anoréxica”, explica a docente da FCM.
Serviço O Ambulatório de Transtornos Alimentares do HC é um serviço composto por uma equipe multidisciplinar formada por psiquiatras, psicólogas, nutricionistas, endocrinologistas e uma antropóloga. O serviço funciona às terças-feiras no Ambulatório de Psiquiatria e recebe pacientes encaminhados pelas unidades de saúde da região. Os agendamentos de consulta de triagem podem ser realizados diretamente no balcão do ambulatório (faixa laranja). Mais informações: telefone 19-3788-7514 ou e-mail.