| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 335 - 28 de agosto a 10 de setembro de 2006
Leia nesta edição
Capa
Ensino de Química
Cartas
História do IA
Baixa escolaridade
UPA 1
UPA 2
UPA 3
Açúcar
Moscas domésticas
Aulas de gramática
Viga de concreto
Biocerâmica
Painel da semana
Teses
Livro
Feira de Talento
Pintura sumi-e
Serpentes
 

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O lúdico marca a história da unidade onde
as aulas eram dadas sob a sombra das árvores

O instituto regido
pela práxis das Artes

Mais de 16 mil CDs e 7 mil LPs forram as paredes do amplo escritório de Rogério Cerqueira Leite na sua residência em Campinas. Seria a maior coleção de música clássica do país, mas ele não confirma, os outros é que dizem. Girando a cadeira, vai apontando as fileiras de discos medievais, renascentistas, do barroco alemão e italiano, do classicismo, os modernos, os especiais. Sobre a mesa, uma bela imagem do fotógrafo Gilberto De Biasi, em ângulo obtido da parte superior da Catedral Metropolitana, mostra a primeira apresentação do Coral da Unicamp, regido por Benito Juarez. Este evento realizado em 16 de novembro de 1971 marca a entrada da Universidade no campo das artes.

Quando morava num sítio em Valinhos, recém-chegado dos Estados Unidos, Cerqueira Leite promovia rodas de conversa sobre música erudita – na realidade, ele dava aulas sobre temas afins, o que faz até hoje. Entre os convidados freqüentes estavam pares da Universidade como Marcello Damy (Física), Friedrich Gustav Brieger (Biologia) e Aristodemo Pinotti (Medicina), com os quais comporia a comissão encarregada de planejar e implantar o Departamento de Música. Em torno desse núcleo musical se formariam os demais departamentos do Instituto de Artes idealizado por Zeferino Vaz, cuja criação era prevista por lei desde 1963. Mas esse ideal ainda demoraria a ser concretizado.

No ano de 1971 foram organizadas atividades de divulgação musical, visando avaliar a receptividade que um departamento de música teria na comunidade. Chegaram o maestro Benito Juarez para formar o coral universitário e o violinista Natan Schwartzman para colaborar na organização de um conjunto de instrumentos e na promoção de concertos. Já em abril, Benito regeu o Coralusp na Catedral e Natan, acompanhado de Cláudio Brito, ofereceu um concerto no Centro de Ciências, Letras e Artes de Campinas.

Apesar da preferência de alguns por Camargo Guarnieri, o escolhido por Zeferino para organizar o departamento foi o maestro Hans Joachim Koellreutter, que se dispôs a ajudar na estruturação e chegou a ministrar um breve curso de extensão universitária no Culto à Ciência, em junho de 1971. Dentre as condições impostas pelo maestro para ficar na Unicamp, estavam a contratação de professores da Alemanha e um espaço na agenda para cumprir compromissos no exterior. Acabou preterido.

Era consenso que a escola da Unicamp deveria diferenciar-se de todas as outras pela práxis da música, o que valia tanto para os professores contratados como para o currículo a ser elaborado. Fazer música era a principal função de Benito, Natan e Levy Damiano Cozzella. Para fazer música foram chamados, a partir de 74, Raul do Valle, Almeida Prado, José Luiz Paes Nunes, Fernando Lopes, Iulo Brandão, enquanto o japonês Hidetoshi Arakawa, talentoso luthier trazido pelo pessoal da Física, fabricava cravos que seriam reconhecidos como dos melhores do Brasil.

Almeida Prado responsabiliza Benito Juarez por instigar muitas de suas composições e de Raul do Valle e Cozzella, encomendando obras para a Orquestra Sinfônica de Campinas, que como maestro elevou a um nível quase internacional. Por muito tempo, portanto, o departamento não ofereceu cursos regulares. Até para justificar sua permanência, os professores realizavam cursos extensivos à comunidade, atraindo alunos de outras áreas como Economia, Física e Medicina.

O primeiro vestibular para Música foi realizado apenas em 1979, nas modalidades Composição e Regência – depois viriam Instrumento e Música Popular. O processo de seleção mereceu páginas no Jornal da Tarde, veículo que nascia priorizando as fotografias e por isso se deliciou com a imagem de estudantes realizando testes de aptidão nos jardins da Universidade. Trinta alunos entraram para a primeira turma de bacharelado. Como lembra Raul do Valle, vinham aprender muito mais do que nos grandes conservatórios, que se ocupavam primordialmente do piano e da música do século anterior, e cujos alunos não chegavam a estudar além de Debussy.

Artes Plásticas – Álvaro de Bautista deixou Madrid em 1976, a convite de Zeferino, com 30 mil dólares em materiais que doou à Unicamp para fazer funcionar uma escola de Artes Plásticas. Ainda encontrou o expoente da “arteônica” Waldemar Cordeiro – que faleceria uma semana depois – e Fúlvia Gonçalves dando aulas debaixo da árvore, no ajardinado onde agora está o Banespa e um estacionamento. Ao receber a chave do hoje velho galpão do IA, Bautista, que é engenheiro naval, vestiu macacão para manusear o concreto com que reformou o prédio e plantou com as próprias mãos mais de vinte ipês. Tendo realizado 60 cursos de extensão em sete anos, é justo que rogue para si o mérito de ter dado início às Artes Plásticas na Universidade.

Coube a Bernardo Caro, no entanto, conduzir o processo de institucionalização do Departamento de Artes Plásticas e do próprio Instituto de Artes, por determinação do reitor Aristodemo Pinotti, que mandou construir a sede atual. Cerqueira Leite havia ficado na coordenação do instituto até 1979, sem nomeação, e Almeida Prado respondia pelo expediente apenas informalmente, pois não possuía o título de doutor exigido para o cargo de diretor, assim como os demais professores da unidade. Caro foi o primeiro a obter o doutoramento em Artes, produzindo uma tese sobre a própria obra em vinte dias.

Eleito diretor, Bernardo Caro organizou o grupo que obteve a regulamentação do curso e abriu o leque das belas artes para a arte moderna. A institucionalização e o prédio novo não implicaram em formalidades. Sabem disso os alunos que, certa feita, decidiram realizar um experimento jogando sangue de boi nos corredores, rolando e deslizando sobre a meleca. A boa proposta de arte – opinião que ouviram da direção – resultou apenas no incômodo de eles mesmos ajudarem a limpar o local, antes que o sangue de boi secasse e impregnasse.

Artes Cênicas – Ao convidar o diretor de teatro Celso Nunes para criar um departamento de artes cênicas na Universidade, Cerqueira Leite acenou com uma verba equivalente a três salários de um doutor. Inviável. A solução apresentada pelo próprio dramaturgo foi trazer o Pessoal do Vítor, um grupo atuante que ele dirigia em São Paulo, formado por Paulo Betti, Eliane Jardini, Adilson de Barros, Reinaldo Santiago, Marcília Rosário, Waterloo Gregório, Anton Chaves, Marcio Tadeu Santos Souza e Avelino Bezerra. Para os atores era uma bela chance de fazer teatro para a população, dar aulas e receber um salário fixo. Para a Unicamp, a práxis de teatro.

O Pessoal do Vítor também deu aulas embaixo de árvores e seus espetáculos atraíam gente de dentro e fora do campus para os cursos livres. Momentos de pura criação, segundo Marcio Tadeu, único remanescente do grupo, que decidiu seguir carreira acadêmica na Unicamp. Ele participou do processo de institucionalização, na gestão Pinotti, ajudando a elaborar o curso, que se baseou bastante no currículo da Escola de Artes Dramáticas (EAD) da USP. A matriz daquele curso perdurou por 15 anos.

Heloísa Villaboim, atuante na organização do departamento que agora coordena, ressalta que aulas como as de máscara e de circo reforçam o caráter diferenciado do curso, onde os alunos estudam em tempo integral e, além da técnica, têm sempre a pesquisa ao lado. Quando saem, carregam um preceito de Celso Nunes: o de sempre voltarem para realizar um trabalho na comunidade. Não por acaso, o distrito de Barão Geraldo, onde está a Universidade, tornou-se o pólo teatral da cidade, graças a alunos e ex-alunos que alugam galpões para oferecer espetáculos fora do circuito comercial.

Artes Corporais – Um projeto de expressão corporal para maestros, que Benito Juarez encontrou na gaveta de um antecessor na chefia do departamento, foi decisivo para que Antonieta Marília de Oswald de Andrade, dançarina de formação clássica e em crise existencial por causa de outra opção profissional, retomasse o caminho das artes. Contribuiu também seu PhD em Psicologia Social nos Estados Unidos, num momento em que na Música não havia um doutor que a representasse na Comissão de Graduação e em outras instâncias institucionais.

Imediatamente à sua contratação, em 1981, Marília de Andrade montou um grupo de dança com perto de 15 integrantes. Apenas dois possuíam formação em dança. Ainda assim, Pedro e o Lobo, o primeiro espetáculo montado pelo chamado Laboratório de Movimento e Expressão, lotou os dois teatros de Campinas – o que se repetiu em montagens posteriores – e chegou ao Teatro Municipal de São Paulo. Pinotti viu Pedro e o Lobo no teatro e pediu a Marília que criasse o Departamento de Dança – era maio de 1984 e o reitor queria realizar o vestibular no final do ano.

Sem referências para um curso superior de dança, Marília de Andrade reuniu um grupo para criar o currículo de seus sonhos, com disciplinas como consciência corporal, capoeira, danças regionais brasileiras e técnicas orientais. Embora o currículo tenha se inviabilizado com o correr dos anos, a implantação de um curso que priorizava a prática ganhou repercussão nacional e influenciou as novas escolas. Hoje, a teoria tem seu peso, mas os alunos continuam sendo dançarinos.

Artes Visuais – Na década de 70, Paulo Bastos Martins, preocupado em firmar um conceito para o uso de mais de um meio de comunicação, criou o termo “muitos meios”, que melhorou para “multimeios”. No início dos 80, a proposta de um curso de graduação em Multimeios foi levada à Reitoria por Haydée de Faria Cardoso, que recebeu a contraproposta de um curso de pós-graduação. No entanto, mesmo numa universidade de ponta, a aprovação do curso avançado e inédito no país exigiu uma explanação detalhada de Virgílio Noya Pinto junto ao Conselho Universitário. A primeira turma veio em 1986.

O Departamento de Multimeios foi inicialmente constituído pelos professores Adilson Ruiz, Hélio Lemos Sôlha, Paulo Bastos Martins, Etienne Saimain e Virgílio Noya Pinto, com a colaboração de Ubiratan D’Ambrosio, Jacques Vielliard e Eni Orlandi. Recentemente, professores especializados em cinema formaram o Departamento de Cinema. Para a graduação, surgiu o Departamento de Comunicação Social com habilitação em Midialogia.

As Artes hoje – O Instituto de Artes tinha 1.226 alunos matriculados no primeiro semestre, sendo 842 na graduação e 384 na pós-graduação. Na graduação, 365 alunos de Música, 124 de Dança, 155 de Artes Visuais, 111 de Artes Cênicas e 87 de Midialogia. No Mestrado estavam 221 estudantes (75 em Música, 45 em Multimeios e 101 em Artes). No Doutorado, 163 alunos (61 em Música, 48 em Multimeios e 54 em Artes). Foram produzidas até agora 255 dissertações de mestrado em Artes, 208 dissertações e 30 teses de doutoramento em Multimeios, e 48 dissertações e 11 teses em Música.

DOCENTES CONSULTADOS
Almeida Prado Alvaro de Bautista Heloisa Vilaboin Marcos Tadeu
Marília de Andrade Paulo Martins Raul do Valle Rogério Cerqueira Leite

 

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