O 13º ENEQ reunirá mais de mil participantes pesquisadores da área, professores da escola básica e alunos de pós-graduação e graduação , inclusive de universidades de outros países das Américas como Argentina, Uruguai e México. O encontro acontece de 24 a 27 de julho, ocupando o Ginásio Multidisciplinar, o Centro de Convenções e instalações da Faculdade de Educação e do Instituto de Química, as duas unidades que respondem pela organização. Da programação (disponível no site www.fe.unicamp.br) constam mini-cursos, conferências, mesas-redondas e apresentações de trabalhos em pôsteres.
O ENEQ nasceu da articulação de dois docentes da Faculdade de Educação, Roseli Pacheco Schnetzler e Mansur Lutfi (ambos apresentando formação inicial em química e pós-graduação em educação), com professores do IQ da Unicamp e da USP. “Naquele início, a preocupação já era a educação básica. Esse propósito continua, amplificado pela dimensão de uma comunidade de pesquisadores. Nos sucessivos encontros bienais, os temas se aprofundaram e a produção evoluiu”, afirma Maria Inês Petrucci Rosa.
Exemplo desta evolução é a introdução de uma inovação: a submissão de artigos completos e não apenas de resumos. “Com isso, recebemos pesquisas mais profundas, sinalizando para órgãos financiadores como a Capes com para a maturidade da comunidade na produção de conhecimento relacionado a investigação e pesquisa”, observa Maria Inês, acrescentando que o ENEQ desbravou um caminho que se mostrava muito árido há 25 anos, o da discussão da educação química no Brasil.
Ontem e hoje A docente da FE lembra que antes os trabalhos relacionavam-se estritamente com a metodologia do ensino em sala de aula, o que ainda ocupa boa parte das discussões, mas outras vertentes foram se somando. “Hoje há temas relacionados com currículo, avaliação, formação de professores, espaços não formais de ensino, história da ciência. A comunidade ampliou o espectro de debate e a partir disso se atingiu uma produção bastante diversificada”, constata.
Nos primeiros anos, até por falta de massa crítica, o ENEQ acontecia como satélite das reuniões da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), usando a mesma estrutura e organização. “Existiam pessoas interessadas nas pesquisas em educação química, mas elas não estavam aglutinadas. Os pioneiros graduaram-se por volta de 1970 e iniciaram suas trajetórias de químicos, professores e pesquisadores na universidade ou na escola básica. É porque já havia esse interesse que o evento foi criado”, diz Maria Inês.
Já em 1991, ao entrar no grupo de pesquisa da professora Roseli Schnetzler para o mestrado, Maria Inês se deparou com pós-graduandos de todo o Brasil. Aqueles orientados, que agora orientam, já formaram duas gerações. “Isso é muito importante. A USP e a UFRS também fizeram sua parte em diferentes momentos, constituindo-se em pólos irradiadores de educadores químicos, o que deu origem a essa comunidade numerosa, hoje espalhada por praticamente todo o país. Sem querermos ser pretensiosos, é uma história que predominou nesses 25 anos. Temos mesmo por que comemorar a data”.
Programação Outro aspecto enfatizado é o contato que o ENEQ possibilita com a escola básica através de seus professores, com os químicos de formação inicial e estudantes de graduação. Dentre os inscritos ns últimos encontros, aproximadamente 75% são professores da escola básica e alunos de graduação, e 25%, pesquisadores e pós-graduandos. “O evento é muito importante não só para a comunidade acadêmica de pesquisadores, tem grande impacto também junto a pessoas em formação, além de contribuir para a educação continuada dos professores do ensino básico”, destaca Maria Inês.
A montagem dos mini-cursos que fazem parte da programação começou há mais de um ano, com consultas à comunidade e convites a pessoas envolvidas em temas atuais. O resultado é um diversificado cardápio para atender à expectativa coletiva, que contempla cinema e ensino de química, informática no ensino, linguagem, experimentação, historia da ciência, formação de professores, currículo e temas correlatos à matéria, entre muitos outros itens.
O 13º ENEQ terá doze palestras metade delas abordando assuntos de interesse do ensino médio e nove mesas-redondas sobre temas que a comissão organizadora considerou atuais, como nanotecnologia e transgênicos. Destaque-se ainda a participação dos autores de livros didáticos de química selecionados pelo MEC, dentro do Programa Nacional do Livro do Ensino Médio em que a química entra pela primeira vez. É uma oportunidade para discutir a política que orientou a elaboração desta lista, do que ela representa e de como pode ser utilizada.
Motivação O ENEQ vem contando com um público fiel ao longo dos anos e surgem dados novos para manter a motivação. “Está crescendo nas universidades brasileiras a locação de vagas para doutores em educação que tenham especialidade em ensino de química, o que faz com que as gerações mais novas visualizem aí um caminho estimulante e cheio de desafios”, assinala Maria Inês. Outro fator estimulante apontado pela professora é que o ensino de química, tradicionalmente relacionado à metodologia, abarca hoje um espectro bem mais amplo, com bom número de trabalhos teóricos que dialogam com a filosofia, sociologia, lingüística, psicologia social, antropologia e sociologia da educação, dentre outras áreas.
Segundo Maria Inês, esse diálogo se manifesta em trabalhos sobre o currículo, filosofia da ciência e história da ciência e do ensino, por exemplo. “Se a comunidade nasceu da preocupação com a sala de aula, hoje ela também se preocupa com questões mais abrangentes da sociedade, como atestam os temas dos mini-cursos. Atualmente, talvez devêssemos falar em educação química e não apenas em ensino de química. Já não se trata de uma questão essencialmente didática”, conclui.
Evento tira o professor da solidão
O ENEQ é um evento da Divisão de Ensino da Sociedade Brasileira de Química (SBQ), que congrega e divulga trabalhos acadêmicos da área de química. Depois da desvinculação com a SBPC, em 1992, o encontro ocorreu sucessivamente em Belo Horizonte, Campo Grande, Aracajú, Porto Alegre, Recife e Goiânia. Além da Unicamp, a realização do 13º ENEQ conta com a colaboração da USP (São Paulo, Ribeirão Preto e São Carlos), Unesp, UFSCar, Unimep e USF, instituições que oferecem cursos de licenciatura e cujos representantes compõem a comissão organizadora. Paralelamente estarão ocorrendo outros dois eventos estaduais voltados ao ensino de química: o 4º Simpeq Simpósio de Profissionais do Ensino de Química e o 3º Eppeq Encontro Paulista de Pesquisa em Ensino de Química.
A professora Adriana Vitorino Rossi, do Instituto de Química, que está na organização dos eventos na Unicamp, informa que o Simpeq é uma iniciativa do IQ e há cinco anos atende professores da rede pública da região de Campinas. “A realização conjunta do Simpeq com o ENEQ possibilita a esses professores a interação com pessoas de todo o Brasil, o que não acontece em um evento regional, quase municipal”, afirma. Já o Eppeq, segundo a docente, tenta promover a atuação cooperativa dos pesquisadores do Estado na pesquisa em ensino de química.
“A troca de idéias é muito importante porque o professor, em sala de aula, está preso à sua realidade. O conhecimento de outros universos é enriquecedor”, diz Adriana Rossi. Para ela, a variedade temática permitirá ao professor, que nem sempre pode ir à biblioteca, se atualizar e contextualizar suas aulas. “É a oportunidade de conhecer experiências distintas e ampliar a bagagem cultural”, acrescenta.
A professora Maria Inês observa que o professor, sendo um trabalhador intelectual, precisa obter esta bagagem para sobreviver numa sociedade em que a escola perdeu o papel de informar, deixando de ser o berço do conhecimento: “Antigamente o conhecimento era adquirido na aula e complementado, quando necessário, em uma enciclopédia. Hoje ele está na rede mundial e na mídia, e cabe à escola selecioná-lo, valorizá-lo, mediá-lo. Para lidar com essa avalanche de informações, o professor precisa se ver como intelectual, como sujeito que necessita investir em sua formação”, afirma.
O ENEQ, na opinião de Maria Inês, contribui para tirar o professor da solidão, colocando-o frente a diferentes pontos de vista e antagonismos. “A expectativa do professor, no evento, não deve ser apenas de aprender a ensinar um tópico da química. Ele vai entrar em contato com várias vozes, vindas de universidades diferentes, das escolas básicas, dos meninos que estão na graduação. São vozes heterogêneas e intensas, importantes para desenvolver a bagagem cultural necessária à formação da intelectualidade”.