Já existe uma hipótese já confirmada em outros países de que algumas espécies de predadores de grande porte, como a onça-pintada e o puma, desempenhariam um papel-chave na manutenção da diversidade em fragmentos de mata. Esses mesmos predadores são vulneráveis à extinção em ambientes fragmentados e, considerando este papel ecológico, seu desaparecimento levaria a uma série de efeitos diretos e indiretos que alterariam a composição das espécies no local. Uma das evidências para a detecção desses efeitos é a variação de abundância de pequenos mamíferos carnívoros, também chamados de mesopredadores, quando correlacionada com a dos grandes carnívoros.
Para estudar correlações entre a abundância de pumas e de mesopredadores, e apurar se a hipótese também se comprovaria em regiões neotropicais, o biólogo Marcel J. Franco Penteado se embrenhou em nove fragmentos da Mata Atlântica do Estado de São Paulo. Penteado esclarece que o termo “abundância”, utilizado na biologia, não significa exatamente a quantidade ou diversidade da espécie, mas uma medida que permite verificar variações demográficas, ou seja, o uso de uma área por uma determinada espécie ao longo do tempo.
A pesquisa indicou que nos fragmentos de maior área, com número relativamente grande de pequenos mamíferos carnívoros, há relações benéficas decorrentes da presença do puma para estas espécies, principalmente a jaguatirica, o jaguarundi e cachorro-do-mato. Já nas matas menores, limitadas para abrigar os carnívoros, sua ocorrência só é possível devido ao uso de outros remanescentes de mata próximos e também ao deslocamento dos animais de um fragmento a outro, o que depende diretamente da estrutura do ambiente adjacente, como plantações e pastos. No entanto, nesses fragmentos, o número de espécies de pequenos mamíferos carnívoros foi significativamente maior nos períodos de coleta de dados em que o puma também foi detectado.
A estratégia para estimar a abundância dos predadores na mata foi instalar armadilhas de areia com iscas de odor em vários pontos da Serra do Japi, Grota Funda, Reserva Ecológica do Vuna, Parques Estaduais da Cantareira e do Jaraguá, e em quatro pequenos fragmentos de mata na Fazenda Malabar, todas áreas da região sudeste do Estado. A partir da taxa de visitação em cada estação do ano, calculada a partir da identificação e registro das espécies que ocorrem em cada fragmento através dos padrões de pegadas (forma e tamanho), foram feitas análises estatísticas de correlação. O levantamento identificou treze espécies de carnívoros. A onça-pintada, uma das espécies ameaçadas de extinção, foi encontrada apenas na Serra do Japi. Também foram detectados rastros do lobo-guará, animal típico do cerrado, na Fazenda Malabar.
Segundo Marcel Penteado, outros estudos são necessários para verificar se o mesmo padrão de resposta das espécies de mesopredadores à presença do puma ocorre em ambientes estruturalmente diferentes. A dissertação de mestrado intitulada “As onças e as abundâncias de predadores intermediários em fragmentos de Mata Atlântica do Estado de São Paulo”, orientada pela professora Eleonore Zulnara Freire Setz, abre caminhos para novas pesquisas, pois constitui o primeiro registro desse tema no país.