A Portaria nº 687 de 30 de março de 2006 aprovou a Política Nacional de Promoção da Saúde (PNPS). Nesse texto é dito de forma explícita que a Promoção deve ser entendida em um sentido mais amplo, não aquele apenas de combate às doenças e delineamento de políticas para dentro do setor saúde, mas sim como: “um mecanismo de fortalecimento e implantação de uma política transversal, integrada e intersetorial, que faça dialogar as diversas áreas do setor sanitário, os outros setores do Governo, o setor privado e não governamental e a sociedade, compondo redes de compromisso e co-responsabilidade quanto à qualidade de vida da população em que todos sejam partícipes na proteção e no cuidado com a vida” (MS, 2006).
Uma das estratégias para o cumprimento dessa política é, segundo o texto, o trabalho em rede, pois permite desencadear mecanismos de mobilização e participação dos vários movimentos e grupos sociais. A rede favorece o planejamento das ações em saúde, essa entendida como produção social de determinação múltipla e complexa, possibilitando acessar as necessidades percebidas e vivenciadas pela população dos diferentes territórios, permitindo a construção de compromissos e co-responsabilidades em favor da vida, além de estratégias de redução das iniqüidades sociais, de participação social, de intersetorialidade e de interinstitucionalidade, para a construção de políticas públicas saudáveis.
No Brasil existem várias redes, uma das mais recentes é a Rede de Municípios Potencialmente Saudáveis (RMPS). Trata-se de um projeto de construção baseada no entrelaçamento de saberes e práticas, originados a partir de cada município participante, e em que são respeitados as suas características e os seus anseios. Sua missão é colaborar na elaboração das políticas públicas saudáveis de forma participativa e articulada por meio dos diferentes representantes. Conta com o apoio técnico da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS/OMS), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp/Faculdade de Ciências Médicas/Departamento de Medicina Preventiva e Social), do Instituto de Pesquisas Especiais para a Sociedade (IPES), dos 27 municípios membros e parceiros como o Comitê de Bacias Hidrográficas dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí - PCJ.
Criada em 2003, a RMPS já realizou 35 encontros e sete seminários; propiciou o intercâmbio com duas missões internacionais (Equador e Japão) e viabilizou a publicação de quatro livros, com o registro do conhecimento de diversos especialistas colaboradores, assim como o registro de ações de municípios participantes na construção de políticas públicas saudáveis.
A participação dos municípios é aberta, e se inicia com a assinatura do prefeito em um termo de compromisso com as políticas da Rede. Baseada na criação de redes sociais, na intersetorialidade e na transversalidade das políticas públicas, a RMPS tem por objetivos: apoiar as administrações municipais para que possam desenvolver um projeto de governo único e integrado; subsidiar gestores, técnicos, acadêmicos, organizações e sociedade para a elaboração de políticas públicas que considerem a promoção da saúde e melhoria da qualidade de vida; discutir, criticar, implantar e monitorar os projetos e as estratégias da Organização Pan-Americana da Saúde para os Municípios Saudáveis, por meio da construção de políticas públicas saudáveis, promoção da participação social de todos os setores e criação de iniciativas sustentáveis.
As teias – A RMPS adotou como estratégias de desenvolvimento a construção de teias de saberes e práticas, tecidas pelos atores sociais envolvidos na sua construção, incentivando: 1) ações intersetoriais e transetoriais; 2) fortalecimento dos diferentes atores sociais no sentido da participação transformadora e busca da autonomia; 3) construção de práticas que firmem os valores e desejos dos atores sociais em relação ao seu território, para que assim colaborem para o desenvolvimento local saudável e sustentável, respeitando os critérios de eqüidade social; 4) divulgação de experiências de sucesso nos municípios dentro e fora da Rede.
Entre as obrigações dos participantes foram definidos: assumir o cumprimento dos objetivos estabelecidos pela Rede; indicar representante(s) para a interlocução com a coordenação da rede; nomear um comitê de implantação e monitoramento dos projetos vinculados à rede; fortalecer a participação popular na elaboração das políticas públicas; mobilizar os diferentes segmentos da sociedade visando à construção da Rede local; desenvolver um projeto de governo único e integrado, através da intra, inter e transetorialidade; e desenvolver ações de cooperação intermunicipal.
Uma avaliação preliminar do trabalho da RMPS, mostra que a sua atuação vem se dando segundo três eixos: uma proposta de caráter transversal, articulando questões específicas de cada município em um marco de interesses comuns; um “nó” dinamizador representado pela universidade, que tece e alimenta a rede, para aproveitar as potencialidades e necessidades dos municípios, visando um tratamento comum, capaz de agregar problemas e soluções encontrados nos diferentes municípios, de modo que cada experiência seja um subsídio para as demais; e a ausência de estrutura hierárquica e compromisso formal, o que lhe confere uma dinâmica especial e sustentável.
A mudança de prefeitos em 2004/2005 foi uma interessante prova para a RMPS, que saiu fortalecida, pois a maioria das propostas comuns em Rede tem sido assumida pelos gestores e técnicos municipais.
Um exemplo de atividade da RMPS ocorreu em março de 2005 onde foi realizado um curso para prefeitos e gestores das diferentes áreas: “Construindo o desenvolvimento saudável e sustentável”. Teve como propósito apresentar os princípios da Rede e subsidiá-los com conhecimentos em relação às metodologias e experiências exitosas desenvolvidas no Brasil, (inclusive nas cidades da própria Rede) que contemplam as estratégias de promoção da saúde, estimulando a reflexão sobre a elaboração do plano diretor de um município potencialmente saudável. Neste curso, foram pautadas, pelos gestores e técnicos, as prioridades nas seguintes áreas: meio ambiente – resíduos sólidos e qualidade da água; participação popular; aegurança – abordagem preventiva e promocional; saúde – Programa Saúde da Família; geração de renda e emprego. Essas prioridades se atendidas levam à de saúde melhorando a qualidade de vida. Os municípios que participaram tiveram a tarefa de durante o curso esboçar uma estratégia local que atendesse sua maior necessidade local considerando os princípios da promoção da saúde. Desde esse curso a RMPS vem pautando seus eventos nos temas levantados pelos participantes.
Funcionamento – Em conseqüência das características de funcionamento da RMPS, o processo de monitoramento e avaliação implica em um espaço de participação dos diferentes atores sociais, em dois níveis: intramunicipal, onde é possível identificar e articular as informações que acontecem na rede através de uma matriz, e no espaço coletivo da Rede, no qual é buscada a integração das políticas regionais, a partir das discussões dos sucessos e dificuldades locais no interior da Rede. Na dinâmica da RMPS interessa conhecer as novas linhas da política e, sobretudo, reconhecer os elementos da gestão municipal que permitem seu surgimento e sua sustentabilidade.
Dentro de alguns municípios o que se pode constatar é que, em vários deles, foram criadas redes (comitês, fóruns, grupos) compostas por pessoas do setor público e do privado que identificam, elaboram e integram ações que atendem as necessidades da população do território em que vivem. O grupo de pesquisadores que tem desenvolvido propostas de projetos de avaliação e monitoramento da RMPS é composto das seguintes pessoas: Dra. Ana Maria Girotti Sperandio (DMPS/Unicamp, OPAS-OMS), Prof. Dr. Carlos Correa (DMPS/Unicamp, IPES), Prof. Dr. Humberto de Araújo Rangel (IPES), Prof. Dr. Nelson Filici de Barros (DMPS/Unicamp), Dr Miguel Malo (OPAS-OMS) e gestores e técnicos dos municípios da RMPS.
A dinâmica da gestão participativa integrada se deve à flexibilidade e à insubordinação entre seus membros. Não existindo estrutura forte nem compromissos formais, o plano se desenvolve com estratégias pactuadas para atender às necessidades de gestores, técnicos e sociedade dos Municípios que participam. Em seu processo de desenvolvimento estimula-se a diversidade, e a proposta de município saudável como marco comum.