JU - Qual deve ser o papel do reitor frente a situações de conflito na comunidade interna, envolvendo estudantes, funcionários e docentes, levando em conta o histórico de ocupação da Reitoria num passado recente?
Tom Zé - Embora esta pergunta pareça fora de contexto, uma vez que a conjunção de fatores que ocorreu no passado recente de 2016 não tem como se repetir, trata-se de uma questão essencial, que nos permite expor como consideramos a responsabilidade institucional e a liderança política para a resolução de problemas internos.
O reitor tem a responsabilidade institucional clara de garantir o funcionamento e a integridade da Universidade, e é da sua liderança política que decorrerá o êxito na solução de eventuais conflitos e problemas. Isto é um princípio básico a partir do qual reafirmamos que, sob o imperativo da autonomia universitária, o diálogo e a articulação com os diretores de unidades, assim como a integração dos docentes, funcionários e alunos, por meio de seus representantes, serão as formas prioritárias de condução de nossa reitoria.
A universidade possui regras claras de conduta de professores, funcionário e alunos, expostas em seu Regimento Geral, e mantém as instâncias de recursos que garantem direitos de cada corpo da comunidade: essas devem ser as diretrizes básicas presentes em cada eventual situação. Por sua vez, se a reitoria não pode esquivar-se das responsabilidades legais que o cargo e a instituição impõem, deixamos claro aqui que não há lugar para a repressão em nossas decisões, se ocorrerem conflitos de difícil solução. A história da Unicamp se caracteriza por conduzir momentos de crise por meio de diálogo e aproximações e, sobretudo, por encontrar no interior da Universidade, sem interferências externas, o equilíbrio e o respeito à institucionalidade.
Vale mencionar que este último ano que passamos, fortemente afetado pela pandemia, colocou em suspenso problemas vigentes fundamentais, como as questões salariais e as de permanência estudantil. A crise sanitária mostrou a todos uma universidade que não gostamos e não queremos, com o vazio das salas de aula e dos prédios, sem a convivência e sem a interação presencial. É de se esperar, com serenidade, que problemas antigos e novos deverão emergir quando retomarmos o cotidiano presencial no campus. As demandas de setores da comunidade fazem parte da gestão pública e, diante disto, a gestão “Unicamp: construindo o amanhã” será definida e caracterizada pelo diálogo, como é próprio da vida universitária e do convívio civilizatório. A solução dos problemas e conflitos que poderão advir começa pela sua prevenção, por meio do debate transparente a respeito das possibilidades da gestão quanto a quaisquer questões colocadas sobre uma mesa de negociações.
Finalmente, cabe nesta resposta uma postura de esperança e de otimismo, que são boas características para uma gestão serena e dinâmica. Nosso programa é voltado para o futuro da Unicamp, conforme expressa nosso slogan. Foi elaborado e construído por muitos profissionais da Universidade e podemos afirmar, categoricamente, que todas as áreas e segmentos participaram e estão contemplados em nosso projeto. Em nossa campanha já temos demonstrado, com palavras e posturas, que a gestão que queremos é aberta e movida pelo diálogo. Os acontecimentos recentes em nosso país demonstram a necessidade de que esse espírito de diálogo se manifeste para além dos muros da Universidade, sendo uma responsabilidade da Unicamp promove-lo em todos os setores da sociedade externa em que se faça institucionalmente presente.
Em especial, em nosso programa de gestão, reconhecemos o papel do reitor em capitanear esse processo, com responsabilidade, presença, discernimento, envolvimento e sabedoria. Não apenas aprendemos com os fatos do passado, mas temos clara noção da realidade que nós cerca e daquilo que a Unicamp poderá fazer em favor da nossa sociedade civil que tanto carece da tolerância e respeito às diferenças.
Mario Saad - Diálogo sempre, em todas as situações, quantas vezes forem necessárias. Sobre o passado recente citado no enunciado da pergunta, em que a Reitoria foi ocupada, lamentamos profundamente que a situação tenha escalado para tal cenário de violência. E não nos referimos especificamente à depredação do patrimônio público, mas, sim, ao fato de fragilizar uma relação que consideramos um pilar para a nossa instituição que é a relação professor-aluno. Faltou diálogo. Em situações de crise, o reitor e o vice-reitor têm o papel de conduzir o diálogo com as entidades representativas, sejam elas dos estudantes, dos docentes ou dos funcionários. Somos todos membros da comunidade universitária.
Muitas vezes ocupamos posições diferentes na estrutura organizacional e defendemos posições diametralmente opostas, mas, nem por isso, devemos nos enxergar como inimigos. Nossas lutas podem ser muitas vezes díspares, outras vezes complementares, e isso é um processo natural no contexto da democracia. Tendo ocupado os cargos de Diretor da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) e Instituto de Química (IQ), tanto eu como o Zezzi já enfrentamos duros embates, sempre respeitando todos os envolvidos até que uma decisão pudesse ser encaminhada com o consenso da maioria.
Sergio Salles-Filho - Em ambientes plurais sempre haverá conflitos e a universidade é uma instituição que deve cultivar a pluralidade. A diversidade de culturas e de opiniões representa um dos nossos diferenciais e nossa riqueza. A universidade é, por tudo isso, um lugar de fricção, de contraposições, de embate de ideias e de interesses. Sempre haverá diferenças, tensões e conflitos. O que devemos é transformar essa fricção em oportunidade para aprimorarmos a construção da nossa experiência democrática, cultivando os princípios de respeito mútuo e de exercício do contraditório e fortalecendo canais institucionais de explicitação de diferenças e de construção de soluções negociadas. Nosso esforço será sempre em nos manter na esfera do diálogo entre as partes e, quando necessário, com instâncias de mediação de conflitos.
Um dos fundamentos de nossa proposta é o de conduzir uma gestão baseada no diálogo, na busca de convergências e na construção de um ambiente de convívio saudável, empático e de confiança institucional. Este princípio deve ser respeitado nas diferentes situações vividas e nos diferentes espaços institucionais da Universidade, sempre no espírito do bem comum e da integração que nos motivam para a construção de Uma Só Unicamp.
Um princípio que tem guiado nossa atuação na Universidade, em todas as posições que assumimos, é a escuta. Quando um reitor estabelece permanentemente uma relação de aproximação com a comunidade, qualquer situação de conflito se torna mais fácil de ser equacionada e de encontrar uma solução pactuada. Ou seja, um bom relacionamento deve ser desenvolvido a todo instante, não apenas no Conselho Universitário e em suas câmaras e nem somente quando surgem situações de conflito.
Damos muita importância à institucionalização de uma cultura de diálogo na Universidade. É importante revisar e reforçar a participação dos diferentes grupos nas instâncias cabíveis, considerando a diversidade presente em nossa comunidade. A representação desses grupos em espaços institucionais é fundamental para que os conflitos encontrem soluções adequadas. Aqui estamos falando de garantir, em diferentes instâncias, representatividade das três comunidades, assim como, quando necessário representatividade de gênero, raça, carreira, áreas de conhecimento, entre outros aspectos que nos caracterizam.
A Unicamp tem investido na cultura de paz. Criou uma Câmara de Mediação e Ações Colaborativas, vem formando pessoas em mediação de conflitos. Daremos muita ênfase a esses canais pois acreditamos que são a forma adequada de construção de convergências para termos ambientes empáticos e confiáveis.