Se
os agricultores utilizassem o sistema de plantio direto,
protegendo a superfície do solo contra o impacto direto
da chuva com uma cobertura morta, teríamos uma redução de
cerca de 80% na erosão, que é um dos principais processos
de degradação ambiental. A estimativa é de que o Brasil
perde anualmente cerca de 500 milhões de toneladas de terra
pela erosão hídrica. Estes dados são apresentados pelo professor
Zigomar Menezes de Souza, da Faculdade de Engenharia Agrícola
(Feagri) da Unicamp, que acaba de orientar pesquisa de mestrado
envolvendo a aplicação de cobertura de resíduos de milho
em cultura de feijão irrigado.
“Por meio do arraste das partículas do solo, há o transporte
de nutrientes, matéria orgânica, água, sementes, fertilizantes
e outros compostos, causando queda na produtividade das
culturas e reduzindo a capacidade de armazenamento dos reservatórios
de água, em conseqüência da sedimentação e assoreando de
córregos. Além de proteger o solo, a cobertura vegetal induz
a um maior armazenamento de água e melhoria dos atributos
físicos, químicos e biológicos do solo”, explica o docente.
Segundo Zigomar de Souza, o sistema de plantio direto segue
três princípios básicos: manter o solo sempre coberto por
resíduos vegetais, não mais revolver o solo (apenas nos
sulcos de semeadura) e empregar herbicidas para o controle
de plantas daninhas. “Nossa pesquisa focou somente uma das
etapas do sistema de plantio direto, avaliando aplicação
de resíduos de milho como cobertura do solo. Um dos motivos
porque o sistema não é mais praticado no Estado de São Paulo
é que ainda não temos uma planta de cobertura adaptada para
a região”.
O professor esclarece que as condições climáticas do Sudeste
são bem diferentes, por exemplo, do que as do Sul, onde
a técnica de plantio direto está disseminada por quase toda
a região e já existem várias plantas de cobertura adaptadas.
“Aqui temos mais chuva e mais calor, que aceleram a degradação
da cobertura residual para proteção da superfície do solo.
Optamos por testar o milho por que seu cultivo é bem difundido
no Estado de São Paulo e os resíduos estão disponíveis ao
agricultor”.
A
pesquisa
Para sua dissertação, a mestranda Carolina Maria Sánchez
Sáenz cultivou feijão irrigado no campo experimental da
Feagri, organizando tratamentos com diferentes quantidades
de cobertura (equivalentes a zero, 4, 6 e 10 toneladas por
hectare). Um dos objetivos foi monitorar a decomposição
dos resíduos de milho, os teores de matéria orgânica e de
água, e a temperatura do solo ao longo do ciclo da cultura.
A pesquisadora também avaliou atributos físico-hídricos
do solo, como densidade, porosidade e retenção de água,
além do nível de produção de feijão.
Carolina Sáenz constatou que nos tratamentos com cobertura
vegetal, independentemente das quantidades, houve maior
manutenção do teor de água no solo, em comparação com o
tratamento onde a superfície foi deixada descoberta (tratamento
testemunha). Entretanto, com a dose maior de cobertura (10
toneladas), registrou-se menor resistência do solo à penetração
das raízes, teor de água mais elevado e melhor equilíbrio
da temperatura ao longo do ciclo da cultura.
A taxa de decomposição dos resíduos foi semelhante em todos
os tratamentos estudados, mantendo-se baixa e garantindo
boa cobertura até a época da colheita, sem sofrer influência
da aplicação de nitrogênio – um adubo essencial em qualquer
cultura, mas que poderia acelerar a degradação da palha.
A utilização de maiores quantidades de adubo nitrogenado
e de resíduos de milho proporcionou um aumento na produção
de feijão. Outra constatação foi a elevação do teor de matéria
orgânica nos primeiros 2/3 do ciclo da cultura.
Na opinião de Zigomar de Souza, a pesquisa de Carolina
Sáenz, além de comprovar as vantagens desta técnica de plantio,
mostrou que as dosagens de resíduos de milhos não implicam
em diferenças importantes em relação aos atributos físico-hídricos
do solo. “Podemos dizer que, a partir de quatro toneladas
por hectare, a cobertura vegetal já estará proporcionando
benefícios ao agricultor. Estes resultados podem ser transportados
para todas as regiões do Estado de São Paulo, já que o clima
é praticamente homogêneo e a cultura do milho é praticada
em todo o território”.
Prós e contras
O professor da Feagri deixa claro que o maior benefício
do sistema de plantio direto está no meio ambiente, com
a redução significativa de 80% da perda de solo e de água
em comparação com o sistema convencional. Contudo, a literatura
também registra vantagens em relação às culturas, como maior
produtividade em anos de estiagem e necessidade de menor
volume de chuvas para o início do plantio, com a semeadura
na época adequada, devido ao solo estar sempre úmido.
O agricultor se beneficiaria ainda com o aumento da atividade
biológica do solo, graças à matéria orgânica produzida pela
cobertura vegetal, que também assegura condições térmicas
mais adequadas. Havendo menor evaporação e maior armazenamento
de água no solo, a germinação e a emergência das plantas
ocorrem de modo mais uniforme. “No aspecto econômico, temos
uma diminuição de 70% no consumo de diesel, já que o trator
não é tão utilizado”.
Zigomar de Souza ressalva, porém, que o sistema de plantio
direto apresenta exigências, como maior custo de implantação
e necessidade de melhor gerenciamento e de mão-de-obra especializada.
Outra dificuldade está no uso de herbicidas para o controle
de plantas daninhas, que é mais complexo do que no sistema
convencional. “Na agricultura tradicional, joga-se o corretivo
na superfície e simplesmente revolve-se o solo. No plantio
direto, uma aplicação como a de calcário (para corrigir
a acidez do solo) é feita em cima dos resíduos, o que requer
conhecimento técnico”.
Rotação
Outra grande vantagem do sistema apontada pelo docente da
Feagri é a exigência de rotação de culturas, como por exemplo,
alternando gramíneas e leguminosas a cada ano, eliminando
o monocultivo. Entretanto, Zigomar de Souza adverte que
o agricultor não deve esperar que todos os benefícios ocorram
já nos primeiros anos. “A cobertura vegetal constante e
os restos de culturas anteriores elevam o teor de matéria
orgânica, aumentando a atividade biológica do solo. São
ganhos significativos, mas que levam tempo. Já a redução
da erosão diminui sensivelmente já nas culturas iniciais,
o que justifica a implantação do sistema”.