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Técnica identifica cédulas falsas
Pesquisadores do IQ detectam
falsificação
de dinheiro em até 10 segundos
JEVERSON
BARBIERI
Uma
nova técnica denominada Easy Ambient Sonicspray Ionization
(EASI), capaz de analisar qualquer tipo de superfície utilizando
espectrometria de massa, é a mais nova arma no combate a
falsificações, principalmente no que diz respeito a cédulas
de real, dólar e euro. A técnica foi desenvolvida pelos
doutorandos Gustavo Braga Sanvido, Renato Haddad, Ramon Sarabia
Neto e Livia Eberlin, do Laboratório Thomson de Espectrometria
de Massa, do Instituto de Química (IQ). Coordenados pelo
professor Marcos Eberlin, os trabalhos contaram com a colaboração
dos peritos Ricardo Cosso, Denison Maia, Adriano Maldener
e José Jorge Zacca, todos da Polícia Federal (PF).
A técnica identifica, por
meio de análise química, as características dos compostos
presentes nas cédulas, obtendo a resposta em dez segundos.
“A cédula verdadeira tem como presença constante quatro íons,
chamados de íons diagnósticos”, afirmou Sanvido. Se esses
íons não estiverem presentes, a cédula é falsa.
Como se trata de análise de
superfície, a EASI permite também que um documento falsificado
seja reconhecido. Sanvido cita como exemplo um testamento,
cuja última linha sempre contém uma assinatura. Se alguém
adicionar uma linha a mais no documento depois de assinado,
a EASI reconhece, por meio de análise da tinta, a diferença
entre a caneta utilizada no documento original e a que foi
usada posteriormente.
“Existem vários fatores que
podem atacar a tinta original, entre os quais o oxigênio e
a luz. Mesmo que a pessoa utilize uma caneta da mesma marca,
isso não garante que ficará igual. A composição do corante
também é diferente e, dessa maneira, fica provado que o documento
foi alterado posteriormente à assinatura”, explica o pesquisador.
Existe, ainda, a possibilidade
de que as linhas se cruzem no documento e, mesmo assim, é
possível detectar a fraude. É feito um mapeamento de cada
linha separadamente e, também, de um ponto de intersecção.
Com isso, é possível determinar qual linha está por cima,
ou seja, aquela que foi escrita depois.
O
trabalho, que foi realizado com a colaboração da Polícia Federal,
abriu uma nova frente de trabalho para o Laboratório, que
é a área forense. “Estávamos trabalhando com a questão da
fraude do leite – amplamente divulgada na mídia nacional –
e ao mesmo tempo pesquisando essa nova técnica, quando a Polícia
Federal viu e se ofereceu para colaborar fornecendo notas
falsas apreendidas para análises”, contou Sanvido.
Até então, revela o pesquisador,
os testes estavam sendo realizados de forma amadora, já que
as notas eram “produzidas” pelos próprios pesquisadores. As
cédulas verdadeiras eram escaneadas e, além de submetidas
à técnica EASI, passavam por uma análise estatística que conseguia
diferenciar o tipo de impressão – laser colorida, jato de
cera, jato de tinta e offset.
A técnica, de fato, comprovou
sua eficiência a partir do momento que passaram a ser analisadas
falsificações que tinham um grau de sofisticação mais elevado.
Segundo informações da Polícia Federal, notas de R$ 1 (um
real) verdadeiras são lavadas e o papel moeda é reutilizado
para uma nova impressão. O pesquisador explicou que, mesmo
sendo papel moeda, a análise aponta a existência de falsificação,
uma vez que a análise química é feita na superfície. “Independentemente
do papel em que foi feita a impressão, o resultado mostra
que a tinta utilizada é diferente daquela utilizada pela Casa
da Moeda”, disse Sanvido.
A mesma análise foi feita
com notas de dólar e euro, comprovando que a técnica pode
ser implementada com qualquer cédula. “Por uma questão de
sigilo, a Casa da Moeda não revela que tipo de tinta utiliza
na impressão das cédulas. No entanto, por meio das análises
de notas verdadeiras, criamos um padrão”, revelou. Segundo
Sanvido, o equipamento utilizado para as análises foi adquirido
no mercado. Entretanto, o sensor principal foi totalmente
desenvolvido pelos profissionais do IQ, sob a orientação do
Laboratório Thomson.
A pesquisa resultou na produção
de artigo científico que foi aceito para publicação no Journal
Forensic Science. Segundo Sanvido, a opção pela publicação
neste veículo deu-se em razão do público alvo. “Os interessados
vão ler o artigo, abrindo uma ampla possibilidade de sermos
mais citados”, argumentou. O pesquisador ressaltou ainda que,
levando-se em conta o tipo de técnica utilizada, trata-se
de um trabalho inédito, uma vez que não existe nada publicado
na área até o momento.
Aplicação
Sanvido acredita que possa levar alguns anos para que essa
técnica chegue ao usuário ou ao comerciante no Brasil, já
que os equipamentos não são simples nem baratos. Segundo ele,
nos Estados Unidos, equipamentos portáteis com capacidade
de análise rápida e com preço reduzido estão em desenvolvimento.
No entanto, o pesquisador pondera que esse é um assunto que
deve ser resolvido pelo mercado. Segundo o pesquisador, o
Laboratório Thomson tem como filosofia atuar em parcerias.
“Procuramos trabalhar com o maior número de pessoas que tenham
formações diferentes”, alegou. O Laboratório conta hoje com
farmacêuticos, veterinários, biólogos e químicos em um contexto
interdisciplinar que facilita enxergar globalmente os assuntos,
não focando apenas na estrutura química.
Entre as várias colaborações
que o Laboratório Thomson desenvolve, está a Universidade
de Purdue (EUA), local onde Eberlin realizou seu pós-doutoramento
com o professor Graham Cooks. Sanvido contou que o professor
Cooks é responsável por desenvolver uma técnica de mapear
superfície, chamada Desi. “O objetivo é o mesmo que o nosso,
porém, o mecanismo é diferente”, disse.
Ademais, o grupo de Cooks
desenvolveu outra técnica batizada de invisible ink, que pode
ser utilizada para marcar documentos criptografados. “A pessoa
recebe um documento que contém um desenho transparente, cuja
composição combina três íons distintos. Como ela já sabe que
cada íon tem uma cor previamente combinada, usa o computador
para preencher as cores determinadas e aparece aí uma marca
d´água, validando o documento original”, detalhou.
Essa técnica, de acordo com
o pesquisador, foi sugerida à Polícia Federal. “A colocação
de uma marca d´água como essa nas cédulas seguramente dificultaria
sobremaneira a falsificação. Também acarretaria numa diminuição
de notas falsas no mercado”, concluiu Sanvido.
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