Da
teoria à práxis
Conhecimento
acadêmico ajuda a melhorar a vida
dos excluídos na maior cidade do Brasil
CARLOS
TIDEI
s
conhecimentos econômicos e sociais adquiridos na
Unicamp estão sendo utilizados para melhorar as
condições de vida da população
do maior, mais rico e mais produtivo município
brasileiro, e que enfrenta um dos enormes problemas sociais
do País: o desemprego e a falta de estrutura econômica
que garanta a ocupação profissional e a
redistribuição de renda.
Marcio
Pochmann, professor do Instituto de Economia (IE) da Unicamp
e coordenador dos Projetos Sociais da Prefeitura de São
Paulo, tem sentido na pele a diferença entre desenvolver
teses e pesquisas acadêmicas sobre os problemas
brasileiros e de aplicar os conhecimentos em busca de
soluções na prática, diante da realidade
política, econômica e social do País.
Segundo
ele, o padrão de regime de dedicação
exclusiva da universidade pública possibilita o
desenvolvimento da ciência e pesquisa, e os conhecimentos
acadêmicos facilitam a aplicação prática
das teorias. Sem o conhecimento da realidade é
impossível a execução de ações
sociais eficientes. Para exercer atividades que buscam
melhoria das condições de vida de uma população,
é necessário estudar experiências
políticas não só do Brasil, mas também
de outros países onde foram formuladas ações
que funcionam na prática. A contribuição
do conhecimento empírico e o investimento em pesquisas,
aliados ao conhecimento abstrato de teorias e experiências
do nosso e de outros países, completam a capacidade
de atuação na área. Isso só
foi possível pela atuação na Unicamp,
avalia Pochmann.
Embora
o trabalho de aplicação deste conhecimento
ainda esteja em gestação, a implantação
das ações encontra respaldo político
e a necessidade social pressiona para que sejam efetivadas.
A maior dificuldade, que provoca distanciamento
entre teoria e prática, é o desgaste do
setor público, com funcionários mal remunerados
e desmotivados na prefeitura, a ausência de capacitação
profissional e a enorme quantidade de decretos e leis
que dificultam a operacionalização dos programas,
detalha.
Desemprego
disfarçado A grande responsável
pelo desemprego na cidade de São Paulo, segundo
o professor, é a política econômica
neo-liberalista do Governo Federal a partir dos anos 90,
que decidiu abrir a economia às importações
em detrimento da produção nacional. O
trabalho informal não é novidade no Brasil
e está historicamente constituído na economia.
Em São Paulo ocorre em menor parcela que em outras
cidades. Até o final dos anos 70, à medida
que crescia o trabalho formal, reduzia-se o informal.
O caminho inverso, ou seja, a expansão do trabalho
informal , ocorreu nos anos 90, justamente pela redução
dos postos de trabalho formais. Grande parte deste contingente
disfarça o desemprego e busca alternativas estratégicas
de sobrevivência diante da exclusão do processo
produtivo regular, conclui Pochmann.
Se
o município não tem capacidade de gerar
empregos o que depende da política econômica
federal procura então implantar programas
alternativos que reduzam os impactos negativos da exclusão
social.
Trata-se nada menos da terceira maior cidade do mundo,
com uma população de 10,4 milhões
de habitantes, 850 mil desempregados e 10% da população
vivendo abaixo da linha de pobreza.
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Programa
garante renda mínima para 60 mil famílias
Na
área de ações sociais, a Prefeitura
de São Paulo atua em dois eixos básicos
para os pobres desempregados na cidade: o primeiro prevê
um amplo processo de redistribuição de renda
através do Programa de Renda Mínima, com
a complementação de renda para famílias
que ganham menos de três salários mínimos
e tenham dependentes menores que 15 anos, visando evitar
que crianças fiquem fora da escola; o Programa
de Bolsa-Trabalho, que atende jovens de 16 a 20 anos de
idade, desempregados, incentivando que voltem à
escola e tenham melhor capacitação para
desenvolver atividades como as de agentes comunitários,
no atendimento de deficientes e idosos, com remuneração
de 45% do salário mínimo mais vale transporte
e seguro de vida; e o programa Começar de
Novo, voltado a desempregados com 40 anos ou mais,
garantindo uma complementação de renda,
mais capacitação profissional para sua reintegração
no mercado.
O
segundo eixo prevê ações na base da
economia, com um processo de desenvolvimento sócio-econômico
que viabilize a reestruturação do parque
industrial paulistano, principal centro produtivo da América
Latina; a criação de melhores condições
de organização para os pobres, através
do programa Economia Solidária, com
ênfase na difusão da cultura do cooperativismo
e atividades de pequenas e médias empresas; e,
finalmente, a democratização do crédito
popular, com a criação do Banco do Povo.
O
objetivo é romper com o ciclo estrutural da pobreza.
Ações que somente distribuem renda e alimentos
funcionam apenas enquanto dura o programa. Depois que
o programa termina, a situação continua
a mesma e até piora, sem romper o cruel ciclo da
pobreza. As linhas de crédito que existem não
atingem os pobres. Queremos que os menos favorecidos possam
caminhar com as próprias pernas, esclarece
Pochmann.
Para
implantação dos projetos foram alocados
recursos da ordem de R$ 68 milhões, o que possibilita
atender 60 mil famílias com o Programa de Renda
Mínima. É o maior programa de distribuição
de renda da América Latina, mas ainda insuficiente
diante de 309 mil famílias carentes de São
Paulo, acrescenta o economista. O volume de recursos
poderia ser maior se não houvesse a redução
da receita em função do grande número
de pobres que não pagam impostos na cidade.
Outras
tentativas de recuperar o nível de emprego, como
a adoção do Simples para micro
e pequenas empresas, e a desregulamentação
das leis trabalhistas para redução dos custos
de contratação, com jornada de trabalho
flexível e regularização do trabalho
temporário, mostraram-se infrutíferas diante
da realidade do mercado. O problema estrutural sobrepõe-se
a estas políticas, afirma Pochmann.
Portas
fechadas Os trabalhadores de São Paulo
perderam 540 mil postos de trabalho nos anos 90 e quatro
mil empresas fecharam as portas. Reverter este processo
exige grande esforço político. A abertura
comercial dos anos 90 mudou radicalmente a cadeia produtiva.
Muitos componentes de automóveis, só para
citar um exemplo de um setor específico, passaram
a ser importados, o que reduziu drasticamente os postos
de trabalho na indústria de auto-peças.
Em outros setores, como das indústrias têxtil
e gráfica, ocorreram problemas semelhantes. É
importante recuperar a competitividade nacional na cadeia
produtiva, afirma.
Outra
frente de atuação segue a proposta de ampliar
complexos produtivos de setores específicos, como
o do turismo e lazer, em franca expansão e com
grande poten-cial. São Paulo recebe o maior
número de visitantes em todo o País e esta
atividade ainda é concentrada basicamente em turismo
de negócios. Mas existe boa estrutura e capacidade
de crescimento do setor, capaz de gerar um volume apreciável
de empregos, conclui.
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