Na
interface entre a saúde e a doença
A
Imunologia encontra identidade na prática homeopática
PAULO
M. F. ARAÚJO
expansão
do conhecimento da Imunologia neste século contribuiu
sobremaneira para a sua consolidação como
uma Ciência Biológica-Médica. O seu
instrumental de ciência experimental deriva dos
estudos monitorados pela Bioquímica, Biologia Molecular,
Genética, Histologia, Fisiologia, entre outras
disciplinas. A sua estratégia de ciência
aplicada à Medicina, buscando uma precisão
clínica, ultrapassou em muito as perspectivas que
fundamentaram o pensamento médico por mais de um
século, no qual o Sistema Imune (SI) se prestava
primordialmente para a defesa do organismo em conexão
direta ao combate das moléstias infecto-contagiosas.
Essa
premissa empírica serviu aos argumentos de ilustres
pesquisadores como Pasteur, Koch, Behring e tantos outros
do final do século XIX para o inicio do século
XX. A Imunologia foi inicialmente justificada como um
objeto central para resolver os problemas médicos
das grandes epidemias que assolavam a humanidade. Este
conceito transformado em generalidade, estabeleceu que
para cada doença haveria um agente microbiano associado,
contra o qual poderia se produzir uma vacina. E assim
foram consolidadas as práticas preventivas ou profiláticas
da vacinoterapia e da soroterapia.
A
amplitude do conhecimento atual da ação
do sistema imune vem desencadeando entre muitos imunologistas
um posicionamento de vanguarda que busca uma mudança
do paradigma imunológico. O argumento que destacamos
diz respeito às evidências de que o SI não
existe apenas para nos defender contra as diferentes agressões
ao corpo (microrganismos, substâncias alergênicas,
esquemas de vacinação). Este representa
hoje muito mais que uma simples operação
de resposta em defesa contra um agente patogênico.
Células
especiais Essa resposta ao distúrbio
gerado pela infecção, corresponde apenas
ao resultado das suas manifestações. Ele
opera com células especiais os linfócitos
T e B, que circulam constantemente e são as responsáveis
pela resposta imune; e células auxiliares (macrófagos,
dentrícas, etc.) com função de processarem
e apresentarem os antígenos aos linfócitos,
para indução da resposta imune. As moléculas
livres (citocinas, anticorpos, etc.) ou associadas à
superfície das células (adesinas, receptores
de antigenos dos linfócitos B, BCR, ou dos linfócitos
T, TCR, diferentes marcadores genéticos como os
de histocompatibilidade antígenos do MHC
classes I e II, etc.) representam um outro referencial
importante para a sua operação.
Existe
um potencial de repertórios linfocitários
(T e B) com receptores que ultrapassam todas as previsões
teóricas naturais ou imaginárias, sugerindo
uma completitude para respostas imunes específicas.
Assim, os indivíduos elaboram um arsenal de linfócitos
com esses receptores complementares a qualquer estrutura
molecular. Essa diversidade é determinada por um
controle genético que é o único descrito
nos seres vivos: para a síntese de um receptor
de antígeno da célula B (BCR) ou da molécula
similar secretada de anticorpo; ou do receptor de antígeno
de célula T (TCR), além da participação
de vários genes para a codificação
de uma única cadeia polipeptídica, a biosíntese
de uma pequena região variável nas cadeias
dessas moléculas resulta do rearranjo ao acaso
de genes encontrados em famílias multigênicas.
O resultado dessa proeza amplia essa diversidade para
um potencial da ordem de 10¹² linfócitos.
E tudo isso acontece dentro do corpo independente de qualquer
estimulação específica anterior.
Experimentos em fetos e recém-nascidos provaram
que o SI já está operando independentemente
de qualquer estímulo.
Ponto
discutível Assim, o que vem a ser a
resposta imune específica resultante de uma infecção
ou de uma vacinação, senão o resultado
de um distúrbio de proporção global
provocado no organismo? E as suas conseqüências
serão sempre benéficas? Este é um
ponto discutível, considerando-se que nem sempre
podemos visualizar além do resultado imediato,
sem o conhecimento de seqüelas futuras. Ademais,
tomando-se como exemplo o estudo das vacinas, não
tivemos um sucesso expressivo que garantisse uma regra
de operação do SI, isto é, o organismo
responde de diferentes maneiras para diferentes antígenos.
Por isso, não é curioso que apenas cerca
de 15 vacinas sejam reconhecidas como eficazes pela OMS?
Esse
conhecimento acumulado reforça a idéia de
que o SI opera em equilíbrio dentro do nosso corpo.
Entretanto, pouco temos explorado sobre os mecanismos
de regulação dessa atividade fisiológica
como um todo: do significado funcional da rede de interações
idiotípicas de complementação entre
moléculas de anticorpos livres ou presas nos linfócitos
B e sua conexão com as moléculas nas células
T; da amplitude da rede de citocinas com suas inúmeras
conexões passíveis de sinalização
regulatória; dos mecanismos associados à
tolerância imunológica, em especial a realizada
junto às diferentes mucosas através da alimentação
e da respiração; da definição
de especificidades nas respostas imunes decorrentes de
ativações policlonais, etc.
Também
demonstra que ele interage numa incorrência dinâmica
de mão dupla com os sistemas nervoso e endócrino,
e em conseqüência com o psicológico.
Coração
do bem-estar Por ser o detentor de uma parte
importante dos componentes efetores para realização
desse equilíbrio poderíamos nomear o SI
como o coração do nosso bem-estar. A biodinâmica
resultante dessa ação integrada sugere e
corrobora a necessidade de uma intervenção
médica também integrada.
Nesse particular encontramos que a biodinâmica de
ação integrada do SI se identifica com a
premissa da Ciência Médica Homeopática
consagrada por Hahnenmann e hoje reconhecidamente empregada
por muitos adeptos.
Na
abordagem da ciência convencional reducionista,
onde a grande importância se volta para o estudo
das partes, a Medicina Alopática aqui inserida
prioriza o destaque clínico e terapêutico
da doença. Ao contrário dessa prática
científica, onde a importância se volta para
o estudo global, a Medicina Homeopática aqui inserida,
ao invés de uma visão pontual da doença,
analisa o indivíduo como um todo, e o entendimento
da cura de sua doença tem a abrangência da
alteração geral do indivíduo.
É
gratificante podermos assistir hoje à discussão
sobre o entendimento da interação entre
os sistemas imune nervoso e endócrino e
a prática da Medicina Homeopática. Também
já se faz otimista a expansão e derivação
de estudos imunofisiológicos básicos e clínicos
em vista de melhores esclarecimentos para os demais princípios
que regem a Homeopatia: Similitude, e eficácia
das Diluições e Potencialização
dos remédios, além da cura global.
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Paulo
M. F. Araújo é professor livre
docente do Departamento de
Microbiologia e Imunologia do Instituto de Biologia (IB)
da Unicamp
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Inquietando
espíritos
MATHEUS
MARIM
GRACIELA MARTÍNEZ
A
qualidade do congresso A Homeopatia no Século
XXI, realizado há alguns meses na Unicamp,
despertou curiosidades e inquietou os espíritos.
As centenas de visitas ao site, o mais de milhar
de mensagens eletrônicas, a solicitação
de informações sobre o que foi dito,
os pedidos de anais e cópias das fitas demonstram
que o repasse feito pelos que estiveram presentes
reforçou o desejo a respeito da necessidade
desse tipo de discussão. Os saberes excluídos
daquilo que se espera como sendo o locus que deveria
estudar o universal: a Universidade. Protegida atrás
de e defensora de um método apelidado de
científico, que ao excluir variáveis
cuidadosamente chega apenas aos resultados desejados,
funciona como regente de exclusões, procurando
silenciar até mesmo os acordes diferentes
que nascem das incursões do seu próprio
saber.
As
palavras precisas de Checchinatto, a avaliação
espistêmica perfeita de Chibeni, a crítica
bem humorada de Chagas, a unidade imunológica
demonstrada por Araújo e as soluções
imagens desenvolvidas por Faigle e seus colaboradores
demonstram que a Universidade alberga cérebros
que a podem ajudar nessa abertura para o universal.
Ausência
marcante foi a da FCM. Apenas os convidados a participar
da abertura e da mesa compareceram. Apesar da apresentada
reforma curricular, a fala explícita é
de que a FCM continuará com orientação
para formar especialistas e pesquisadores, bem ao
gosto das indústrias farmacêuticas
e empresas de saúde. Embora esse esquema
seja reconhecido pela ONU como anacrônico
desde 1962 por não atender às necessidades
dos países subdesenvolvidos (naquela época)
e tecnologicamente excluídos nos dias de
hoje (75% do Brasil está nessa categoria),
ele ainda persiste, pois está na dependência
dos seus financiadores.
Não
cabe neste artigo discutir o que é a homeopatia,
seu histórico, estatuto, pressupostos, prática,
eficiência, efetividade. Isso tudo deve ser
discutido dentro da Universidade, intra muros, não
extra muros, ou então que caiam os muros
pois nada há a temer, apenas crescer.
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Matheus
Marim e Graciela Martínez são
da Comissão de Pesquisa da
Associação Médica Homeopática
Brasileira (AMHB)
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