Edição nº 539

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 24 de setembro de 2012 a 30 de setembro de 2012 – ANO 2012 – Nº 539

Pesquisador desenvolve
bebida probiótica
com soro de queijo

Autor do estudo desenvolvido na FEA
usou métodos sensoriais para avaliar o produto

 

Uma bebida láctea fermentada com a maior concentração de soro de queijo possível, suplementada com Lactobacillus acidophilus – um microrganismo probiótico que traz benefícios à saúde de quem o ingere. Esse produto foi desenvolvido pelo pesquisador Wellington de Freitas Castro em sua tese de doutorado, defendida na Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA). Mas, além da bebida, o autor do estudo testou um aspecto inovador: usou ineditamente métodos sensoriais (Análise Descritiva Quantitativa - ADQ e o Perfil Livre) para avaliar a bebida que ele obteve misturando leite e soro de queijo.

O produto, que conseguiu atingir uma vida de prateleira de 35 dias, tempo semelhante à do iogurte, não empregou aditivos sintéticos, apenas um preparado de fruta que confere cor, aroma e sabor de morango. A iniciativa mostrou ser uma alternativa à indústria de laticínios pois, de acordo com Wellington, existem poucas bebidas lácteas probióticas hoje no mercado nacional.

O preparado de fruta foi cedido pela Industrial Duas Rodas, de Jaraguá do Sul, em Santa Catarina, e pela Döhler, da região de Campinas. Já as culturas de microrganismos foram cedidas pela Danisco-DuPont.
Na verdade, o probiótico já é empregado pelo setor industrial para a elaboração de vários alimentos. Entretanto, nesse trabalho o que o engenheiro de alimentos fez foi introduzir o uso desse microrganismo em presença de soro de queijo, que também atua como um agente prebiótico, contribuindo para ativar o metabolismo de bactérias proativas do trato intestinal. Assim, alguns peptídeos isolados da fração proteica do soro de leite beneficiam o metabolismo e o crescimento de microrganismos.

Os modelos matemáticos praticados nos experimentos demonstraram ser eficientes na seleção da concentração ideal de soro de queijo, sendo 49% pela Análise de Sobrevida (distribuição de Weibull) e 65% de soro pelo modelo de Aceitação Global Média, como resposta de uma boa aceitação sensorial.

O pesquisador utilizou o método de Análise de Sobrevida (Survival Analysis), com grande aplicação nas áreas médicas e de sociologia, pela possibilidade de interagir com dados intervalares e de estimar a concentração ideal, julgada pelo consumidor. “Deste modo, os dados de análise sensorial são tratados com vistas a chegar às formulações com melhor aceitação”, conta. Já os métodos afetivos, escolhidos pelo autor, consistiram da aceitação por consumidores e do Mapa Projetivo, esse também pioneiro para avaliação de bebidas lácteas.

Produto

O soro, acentua o pesquisador, é um subproduto da indústria de queijo, cuja produção pode variar de 6 a 9 litros para cada quilograma de queijo produzido. Tal subproduto, explica ele, não pode ser destinado ao descarte direto em leitos d’água, por ter uma alta demanda bioquímica de oxigênio. Do contrário, os microrganismos presentes na água usariam os componentes do soro e diminuiriam o teor de oxigênio dissolvido nos rios.

A consequência seria drástica: levaria à morte da fauna aquática, em razão do elevado impacto ambiental de despejar o soro de leite sem o devido tratamento de efluente. Logo, para um produto que seria deletério, Wellington trouxe mais uma alternativa à utilização do soro – o desenvolvimento da bebida. “O nosso trabalho resultou na disponibilização de dados sensoriais que podem contribuir para o aprimoramento de produtos disponíveis no mercado”, garante.

Para o desenvolvimento da bebida, o doutorando contou com a orientação dos docentes José de Assis Fonseca Faria, da FEA, e Adriano Gomes da Cruz, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ).

Uma das primeiras medidas do autor foi comparar o método de Perfil Livre à metodologia de ADQ. Conforme o engenheiro de alimentos, a ADQ parte do treinamento de assessores sensoriais, ou provadores, etapa que demanda um tempo considerável para ser executada e que busca um consenso entre assessores em termos de linguagem (por exemplo, se a descrição é cor vermelha de morango ou aroma fermentado, todos precisam estar inteirados das mesmas expressões).

No Perfil Livre, cada assessor põe em prática a sua própria linguagem para descrever o produto, fazendo apontamentos em uma ficha de análise sensorial e levantando atributos para caracterizar a amostra, o que torna mais simples o processo, diferencia Wellington.

Segundo ele, os resultados do pareamento das duas metodologias foram muito próximos. Mas o Perfil Livre trouxe a vantagem de reduzir o tempo de análise pois a ADQ demanda muito tempo para o treinamento dos assessores até chegar a um consenso da equipe sensorial, constata.

O produto, relata o engenheiro de alimentos, segue a legislação, a qual enfatiza que a bebida láctea deve ser produzida a partir da mistura do leite com soro e é necessário ter 51% de base láctea (massa-massa), o que equivale a dizer que, para chamar de bebida láctea, pode-se ter uma mistura de soro e leite ou leite e água (não necessariamente soro e leite). “A nossa legislação para bebida láctea não é específica nesse ponto”, realça.

A bebida láctea fermentada é um produto genuinamente brasileiro, porém apresenta variações em outros países, sob a forma de bebida carbonatada ou adicionada de suco de frutas. “No nosso país ele é tido como um produto semelhante ao iogurte, entretanto com um custo mais reduzido, por não utilizar o leite em sua totalidade”, expõe Wellington.

Potência

Para a produção da bebida, a mistura de leite e soro passou pelo processo de pasteurização. Foram adicionados os probióticos e também as culturas do iogurte (o Streptococcus thermophilus e Lactobacillus bulgaricus). Em seguida, houve fermentação por cerca de quatro horas e estocagem refrigerada. O produto apresentou-se com textura próxima à do iogurte batido.

O seu benefício é que, além da pessoa ingerir uma proteína de qualidade, já que as proteínas do soro de leite aparecem na fabricação de ricota e suplementos alimentares para atletas, sob a forma de concentrados e isolados proteicos, como o Whey Protein (rapidamente absorvido pelo organismo), por exemplo, vão estar ali presentes, ainda que em menor quantidade.

Os microrganismos adotados por Wellington auxiliam na ativação do sistema imunológico, exclusão competitiva de bactérias patogênicas e melhoria do trânsito intestinal. Contudo, o pesquisador faz uma ressalva: é preciso ter uma contagem mínima de 106 microrganismos por mL, para uma ingestão diária de 100 ml do produto.

“As nossas contagens superaram as preconizadas pela legislação e se mostraram satisfatórias em todas as formulações”, revela o autor. Ele ainda salienta que essa bebida láctea demanda tecnologia simples, da qual é possível se servir para alcançar produtos de alto valor agregado com baixo investimento em equipamentos, tornando-se acessível às indústrias de laticínios de pequeno porte.

 Apurou-se ainda na pesquisa que sensorialmente, a partir de experimentos com bebidas lácteas comerciais (fermentadas, não probióticas), elas não apresentaram uma padronização. “Os assessores notaram não somente variações nos tipos de embalagens, mas ainda de formulações e atributos sensoriais como cor, aroma, sabor e textura”, lembra Wellington, docente do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo, campus Barretos.

 

Publicações

Wellington de F. Castro, Adriano G. Cruz, Mariana S. Bisinotto, Lizielle M. R. Guerreiro, José de Assis F. Faria, Helena M. A. Bolini, Rosiane L. Cunha e Rosires Deliza. Development of probiotic dairy beverages: Rheological properties and application of mathematical models in sensory evaluation. Aceito para publicação no Journal of Dairy Science.

Wellington de F. Castro, Adriano G. Cruz, Daniele Rodrigues, Gislaine Ghiselli, Carlos Augusto F. Oliveira, José de Assis F. Faria e Helena T. Godoy. Effects of different whey concentrations on physico-chemical characteristics and viable counts of starter bacteria in dairy beverage supplemented with probiotics. Aceito para publicação no Journal of Dairy Science.

Tese: “Efeito da concentração de soro de queijo na produção e qualidade sensorial de bebidas lácteas probióticas”
Autor: Wellington de Freitas Castro
Orientador: José de Assis Fonseca Faria
Unidade: Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA)
Financiamento: Capes e Faepex-Unicamp