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Jornal da Unicamp
Baixar versão em PDF Campinas, 07 de outubro de 2013 a 13 de outubro de 2013 – ANO 2013 – Nº 578Telescópio
Literatura ajuda a entender os outros
Cientistas chamam de “teoria da mente” a capacidade que a maioria das pessoas tem de interpretar corretamente as emoções e intenções dos outros. Pesquisadores reconhecem duas modalidades da “teoria” – a afetiva, que permite reconhecer e entender estados emocionais, e a cognitiva, que permite deduzir crenças e intenções. De acordo com estudo publicado no Science Express, o serviço de divulgação online da revista Science, em 3 de outubro, a leitura de textos de ficção temporariamente aumenta a eficácia dessas perícias em adultos, um efeito que trabalhos de não ficção parecem não ter.
Ainda de acordo com o estudo, nem todos os textos ficcionais funcionam da mesma forma: um conto do clássico russo Anton Tchekhov é muito mais eficaz, por exemplo, que um trabalho da autora de best-sellers Danielle Steel.
Os autores da pesquisa, David Comer Kidd e Emanuele Castan, da New School for Social Research de Nova York, especulam, citando pensadores como Roland Barthes e Mikhail Bakhtin, que as melhores obras da ficção mais “literária” – definida em oposição à produção dita “popular” – exigem uma participação maior do leitor na construção do significado e requerem um esforço de percepção do texto sob diferentes pontos de vista, o que simula o uso da teoria da mente. Já a ficção popular “tende a retratar o mundo e os personagens como consistentes e previsíveis. Portanto, pode reafirmar as expectativas do leitor e, assim, não promove a teoria da mente”, diz o artigo.
O trabalho reconhece a dificuldade de traçar uma linha clara entre o “literário” e o “popular”, problema que os autores tentaram contornar apelando para os resultados de importantes prêmios literários, para selecionar textos “de literatura”, e as listas de mais vendidos do site Amazon.com, para escolher obras “populares”.
Mais uma nave privada aporta na Estação Espacial
A cápsula de carga Cygnus, produzida pela empresa americana Orbital Sciences Corporation, completou uma manobra bem-sucedida de ligação com a Estação Espacial Internacional (ISS) em 29 de setembro. A primeira tentativa de atracagem, no dia 22, teve de ser interrompida.
Com a chegada da Cygnus à ISS, agora são duas as empresas privadas com capacidade demonstrada de realizar o transporte de carga à Estação: a Orbital Sciences e a SpaceX, cuja cápsula Dragon foi o primeiro veículo particular a conduzir uma missão no posto orbital.
O uso de naves privadas se insere na estratégia do presidente dos EUA, Barack Obama, de terceirizar o acesso à órbita terrestre, liberando recursos da Nasa para programas científicos e de exploração mais ambiciosos.
Identificada misteriosa erupção vulcânica da Idade Média
Vestígios preservados no gelo do Ártico vinham indicando, há décadas, a ocorrência de uma gigantesca erupção vulcânica em algum momento entre 1257 e 1258. A origem dessa erupção, que injetou mais enxofre na atmosfera terrestre que eventos vulcânicos famosos, como a explosão de Krakatoa, em 1883, era desconhecida, embora seus efeitos estejam registrados: a crônica histórica europeia descreve, no período, um verão extremamente frio – a época às vezes é chamada de “o ano sem verão” –, com chuvas incessantes, colheitas ruins e inundações.
Agora, um grupo internacional de pesquisadores, incluindo franceses, suíços e indonésios, acredita ter encontrado o vulcão responsável: o Samalas, localizado na Ilha de Lombok, Indonésia. Uma das evidências reunidas pela equipe é o registro histórico, redigido em javanês antigo sobre folhas de palmeira, descrevendo a erupção e suas conseqüências catastróficas, incluindo a morte de milhares de pessoas. De acordo com o texto antigo, o evento ocorreu numa época da cronologia indonésia que corresponde, no calendário europeu, a um período anterior ao fim do século 13.
Os autores do novo estudo, publicado no periódico PNAS, usam o texto indonésio, dados levantados por pesquisas geológicas e datação de carbono 14 para ligar a erupção de Samalas ao “ano sem verão” europeu e ao pico de enxofre nos registros do gelo ártico.
PLoS Biology comemora 10 anos
Agora em outubro o periódico de livre acesso PLoS Biology completa uma década de publicação. Quando surgiu, em 2003, a revista online buscava firmar um modelo de divulgação aberta de artigos científicos com revisão pelos pares, no qual o pesquisador – e não o leitor – arca com os custos. Na nota em que celebra seus dez anos, a publicação reconhece que, na época, havia a preocupação de que o projeto “seria marcado pelo estigma de uma ‘editora de vaidade’, e que o modelo viria a se mostrar incompatível com integridade científica, rigor editorial e excelência”, temores que, os editores acreditam, mostraram-se infundados.
O modelo adotado pela PLoS se tornou um dos padrões no debate sobre a democratização do acesso à ciência e nas críticas aos altos preços de assinatura cobrados, de indivíduos e bibliotecas, por algumas das principais editoras especializadas em produzir periódicos científicos. Para celebrar sua década de existência, o periódico publicará uma edição especial com uma seleção dos melhores artigos do período, além de uma história do projeto Public Library of Science (de onde vem a sigla “PLoS”).
O segredo dos repelentes de insetos
Desenvolvido no fim da segunda guerra mundial, o DEET ainda é o principal repelente de insetos em uso no mundo. Em artigo publicado na edição de 4 de outubro da revista Nature, pesquisadores da Universidade da Califórnia em Riverside afirmam ter descoberto exatamente como a molécula age no inseto, o que abre caminho para a busca por outras substâncias menos agressivas para o ser humano, e mais baratas, que o DEET, mas tão eficazes quanto ele para afastar mosquitos e carrapatos.
Os cientistas usaram moscas Drosophila melanogaster geneticamente modificadas para que as células afetadas pelo repelente brilhassem na cor verde quando atingidas pela substância. Expostas ao DEET, essas moscas revelaram atividade em neurônios localizados no interior de uma estrutura da antena dos insetos.
Usando uma simulação de computador, o grupo testou cerca de meio milhão de outras moléculas para descobrir algumas que ativassem os mesmos neurônios das moscas, chegando finalmente a quatro possíveis substitutos do DEET – sendo que três deles são considerados comestíveis por seres humanos.
Estudo francês rejeita ligação entre depressão e câncer
A ideia de que estados de espírito podem influenciar a saúde de modo decisivo é antiga, e algumas associações, principalmente entre estados emocionais negativos e o adoecimento do corpo, muitas vezes são aceitas como fatos pelo senso-comum. No entanto, um levantamento realizado por Cédric Lemogne, da Universidade de Versailles Saint-Quentin, não encontrou nenhuma ligação significativa entre depressão e a incidência de câncer.
Lemogne acompanhou a evolução da saúde de mais de 14 mil pessoas entre 1994 e 2009, das quais 1.119 desenvolveram câncer. Resultados de avaliações psicológicas, bem como atestados médicos de depressão, foram levantados, sem que nenhuma associação entre o câncer e o problema emocional aparecesse. O trabalho foi publicado em The American Journal of Epidemiology. “Desde os primórdios da medicina, a presença de ‘bile negra’, que deu origem ao termo melancolia, fez as pessoas associarem a condição ao desenvolvimento de tumores malignos”, disse Lemogne, citado em nota distribuída pelo Inserm, o Instituto Nacional de Pesquisas Médicas da França. “Mas nenhuma metanálise jamais obteve sucesso em confirmar ou rejeitar a hipótese”. Metanálises são procedimentos estatísticos que agregam os dados de diversos estudos sobre um mesmo tema, na busca de uma conclusão geral.
No entanto, embora o estudo francês não tenha encontrado sinais de que a depressão causa câncer, o Inserm alerta, na mesma nota, que a depressão, uma vez instalada num paciente com câncer, pode aumentar o risco de vida, já que a pessoa deprimida pode se sentir tentada a negligenciar o tratamento.
Plástico na atmosfera de Titã
Instrumentos a bordo da sonda Cassini, que vem pesquisando o sistema formado por Saturno e seus satélites desde 2004, detectaram a presença de propileno na atmosfera de Titã, a maior das luas do planeta. Na Terra, o propileno, usado como matéria-prima na indústria petroquímica, é a base do plástico polipropileno.
Titã é a única lua do Sistema Solar a contar com uma atmosfera densa, formada principalmente de metano e nitrogênio. As moléculas desses gases são constantemente desfeitas pela radiação que vem do Sol e pelos efeitos do campo magnético de Saturno, e se recombinam em diversos tipos de compostos orgânicos, que ou se mantêm em suspensão na atmosfera ou “chovem” sobre a superfície, criando mares e lagos de hidrocarbonetos.
De acordo com o artigo que descreve a descoberta do propileno, publicado no periódico The Astrophysical Journal Letters, a despeito da abundância de hidrocarbonetos na lua, esta é a primeira vez que essa molécula específica é detectada ali.
Telescópio sai de férias
A coluna entra em férias, e retorna na edição de 18 de novembro do Jornal da Unicamp.