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Jornal da Unicamp
Baixar versão em PDF Campinas, 25 de agosto de 2014 a 31 de agosto de 2014 – ANO 2014 – Nº 603Telescópio
Enxame de robôs
Várias criações da natureza têm a capacidade de se organizar em grandes grupos, a partir de interações locais, manifestando uma espécie de inteligência coletiva descentralizada – exemplos vão de enxames de insetos às células que compõem o corpo de uma planta ou animal. Na revista Science, em meados de agosto, pesquisadores da Universidade Harvard anunciam a criação de um enxame de mil robôs, cada um do tamanho aproximado de uma moeda, capaz de produzir formas geométricas sobre o tampo de uma mesa, numa espécie de marcha em ”ordem unida”. Escrevem os autores: “Os robôs não têm informação direta sobre sua posição global, apenas a distância até os vizinhos imediatos. No entanto, podem usar essa informação de distância para construir um sistema coletivo de coordenadas. Inicialmente, os robôs-semente estacionários incorporam a origem do sistema de coordenadas. À medida que novos robôs chegam à semente, eles podem (...) determinar suas próprias posições no sistema; assim que isso ocorre, podem se converter em pontos de referência para mais robôs”.
Esses pequenos dispositivos, batizados de “kilobots”, têm três pernas, um par de minúsculos motores, uma bateria e um circuito de controle. Eles se comunicam disparando luz infravermelha sobre o tampo da mesa, onde o sinal é refletido e chega aos vizinhos.
Causa humana da perda de geleiras
Simulações da retração das geleiras localizadas fora da Antártida entre 1851 e 2010 mostram que a ação humana se tornou o principal fator na perda das massas de gelo nos últimos 20 anos, diz artigo publicado na revista Science.
Os autores, de universidades da Áustria e do Canadá, reconstituíram a redução das geleiras usando dois modelos, um levando em conta apenas efeitos naturais e outro, completo, agregando os fenômenos de origem humana, como poluição e emissões de CO2.
A comparação mostrou que o modelo natural previa uma estabilização das geleiras ao longo do século 20, à medida que a cobertura glacial passava a se restringir às grandes altitudes. A partir de 1965 o modelo antropogênico passa a contradizer o natural, prevendo não a estabilização, mas a continuidade do encolhimento das geleiras.
O modelo natural erra na previsão do comportamento das geleiras, especialmente, no período de 1991 a 2010. “Isso significa que o sinal antropogênico é detectável no balanço de massa (...) com alta confiança”, escrevem os autores. De acordo com o artigo, a componente humana na perda de gelo em todo o período observado, de 1851 a 2010, é de 25%, mas chega a 69% quando se isolam as décadas entre 1991 a 2010.
Ciência da vigilância
A edição de 14 de agosto da Science trouxe um artigo de opinião assinado por Herbet Lin, cientista-chefe da área de Ciência da Computação e Telecomunicações do Conselho Nacional de Pesquisa dos Estados Unidos, tratando dos desafios legais e tecnológicos provocados pelas revelações de Edward Snowden sobre as ações de espionagem e vigilância praticadas pela Agência de Segurança Nacional (NSA) dos EUA.
Lin lembra que as regras em vigor nos Estados Unidos sobre privacidade das telecomunicações datam de 1979, uma época anterior à disseminação dos telefones celulares e da internet. Ele cita que, quando a Suprema Corte americana decidiu que a chamada “metadata” – números discados e duração das ligações – merecia menos proteção legal que o conteúdo dos telefonemas, o uso do telefone, ainda fixo, era menos pessoal do que hoje, na era da telefonia móvel. “Números de telefones celulares são muito mais intimamente associados a indivíduos específicos do que números fixos”, escreve. “Também, a infraestrutura de telefonia celular permite gerar informação de rastreamento geográfico do telefone”.
O autor cita, ainda, que quando a Constituição dos EUA codificou as regras para “busca e apreensão”, “busca” era um procedimento realizado, fisicamente, por um policial. “Hoje, os computadores podem buscar informação com maior eficiência (...) Será que ‘busca’ se refere ao momento em que os dados são coletados? O momento que o computador vasculha os dados? O momento em que um ser humano examina os resultados da varredura?” E, mais adiante: “É uma ‘apreensão’ quando o governo copia um fluxo de dados ou um arquivo, sem que ninguém os leia?” Lin diz que é “tentador” imaginar que questões assim poderão ser resolvidas por meio tecnológico, mas adverte que a implementação de qualquer solução técnica depende, antes de mais nada, de uma decisão política.
Maconha exagerada
O oncologista David Gorski, um dos responsáveis pelo respeitado, influente – e polêmico – blog médico Science Based Medicine publicou recentemente um par de postagens em que critica o que considera um excesso de entusiasmo em torno das supostas propriedades medicinais da maconha. Gorski defende a posição de que a maconha deve ser “pelo menos descriminalizada ou, preferencialmente, legalizada, taxada e regulamentada, como tabaco ou o álcool”, mas escreve que a campanha pela liberalização vem afrontando a ciência, ao reivindicar para a erva propriedades medicinais quase milagrosas.
Ele acusa a campanha pela descriminalização de “atribuir poderes quase místicos à fumaça ou a extratos de maconha, em vez de isolar e identificar constituintes da planta que possam ter valor medicinal (...) De fato, a promoção de leis legalizando a maconha medicinal é um truque tão óbvio para abrir a porta para a legalização plena que alguns proponentes nem se dão mais ao trabalho de disfarçar essa intenção”.
“Dado que tendo a apoiar a legalização, como médico esse tipo de fraude me irrita. E também tem consequências, particularmente quando alegações exageradas são feitas sobre do que a cannabis é capaz”, acusa.
Parem de culpar as mães
Em comentário publicado na revista Nature, um grupo de sete pesquisadores americanos, entre historiadores, filósofos e médicos, pede que os cientistas que realizam pesquisas sobre como fatores ambientais e bioquímicos podem afetar o desenvolvimento do feto tomem cuidado especial ao divulgar suas descobertas, a fim de evitar a estigmatização das gestantes.
“As manchetes da imprensa revelam como essas descobertas frequentemente são simplificadas de modo a focalizar no impacto materno”, escrevem os autores, citando, entre outros, dois exemplos da mídia britânica: “Dieta da mãe durante a gravidez altera DNA do bebê” e “Sobreviventes grávidas do 11/9 transmitem trauma para os filhos”.
O estudo dos efeitos do desenvolvimento intrauterino sobre a saúde da criança deveria informar políticas públicas de apoio aos pais, diz o artigo, mas “exageros e simplificações grosseiras estão transformando as mães em bodes expiatórios, e podem levar a vigilância e regulamentação crescentes das mulheres grávidas”.
Forças nos asteroides
Alguns asteroides do tipo “pilhas de escombros”, formados por amontoados de pedras e areia que viajam juntos pelo espaço, giram depressa demais para que a mera atração gravitacional entre suas partes explique o fato de se manterem coesos, diz artigo publicado na revista Nature. De acordo com os autores, esses asteroides requerem, para preservar a integridade, também a ação das chamadas forças de van der Waals, interações elétricas de pequena intensidade que surgem entre moléculas ou, no caso desses astros, entre pequenos grãos de areia e fragmentos de rocha.
“O asteroide (29075) 1950DA é uma pilha de escombros que gira mais rapidamente do que seria permitido por gravidade e fricção”, escrevem os autores, da Universidade do Tennessee. “Determinamos que forças coesivas são necessárias para evitar que a massa superficial se desprenda e que a estrutura se desmanche”. O asteroide estudado tem 1 km de diâmetro.
Os autores escrevem que sua descoberta demonstra que nem todos os pequenos asteroides que giram mais depressa que o limite de velocidade esperado são rochas monolíticas, um dado que tem importância, afirmam, na defesa da Terra contra impactos vindos do espaço. O trabalho “apoia a ideia de que alguns asteroides que explodem em grandes altitudes, como 2008 TC3, são pequenas pilhas de escombros mantidas por forças coesivas”. Esse asteroide fez manchetes ao explodir sobre o Sudão em 7 de outubro de 2008, tendo sido detectado na véspera. Foi o primeiro asteroide a ter sua colisão com a atmosfera terrestre prevista por cientistas.
Medindo a Wikipedia
Uma dupla de pesquisadores chineses, Jingyu Han e Kejia Chen, da Universidade de Telecomunicações e Correios de Nanjing, criou um modelo estatístico que, implementado sob a forma de um programa de computador, permite classificar a qualidade dos artigos da Wikipedia. O programa leva em conta o número de revisões que o artigo sofreu e o status dos revisores, entre outros dados.
De acordo com nota do International Journal of Information Quality, onde o trabalho dos chineses foi publicado, o programa, testado sobre centenas de verbetes, superou um avaliador humano na hora de designar corretamente o nível de qualidade dos artigos.