Edição nº 637

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 14 de setembro de 2015 a 20 de setembro de 2015 – ANO 2015 – Nº 637

Saúde na casca do araticum

Pesquisa analisa propriedades antioxidantes de subprodutos da fruta

O extrato da casca do araticum, uma fruta comum do cerrado, ajuda a diminuir os danos causados pelo estresse oxidativo das células, problema que ocorre quando há, no interior do organismo, excesso das chamadas “espécies reativas”. Os radicais livres são as espécies reativas mais populares, responsáveis pelo envelhecimento e também por doenças como o câncer, a catarata, doenças cardiovasculares e neurodegenerativas. A pesquisa que apontou o resultado promissor com o extrato da fruta foi realizada no Laboratório de Bioaromas da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp. A autora da tese de doutorado, publicada no formato de artigos científicos, Maysa do Vale, deu continuidade a estudos com subprodutos da fruta já realizados pelo Laboratório.

Maysa do Vale, autora da tese, e o araticum, também conhecido como marolo: refazendo a quantificação dos compostosAraticum é o nome popular da fruta também conhecida por marolo em algumas partes do país. Da família da pinha, a fruta é bastante usada para fazer bebidas e doces. Maysa já sabia, por meio dos estudos que antecederam seu trabalho, que a casca do araticum era rica em compostos antioxidantes. Ainda assim precisou refazer a quantificação dos compostos. Além da casca do araticum, ela processou as sementes e o subproduto de outra fruta do bioma cerrado que foi a casca do pequi. O melhor resultado, ou seja, a maior concentração de antioxidantes pôde ser encontrada no extrato da casca do araticum.

Para verificar o potencial de proteção do extrato a pesquisadora induziu o estresse oxidativo de células primeiro in vitro e posteriormente em modelos animais. Ela utilizou o quimioterápico doxorrubicina, utilizado no tratamento de tumores. O uso da droga é limitado devido à sua toxicidade, que vai além do efeito farmacológico esperado. “Estes antineoplásicos causam vários efeitos adversos, a doxorrubicina aumenta muito as espécies reativas, sobretudo no coração”, relata Maysa. 

Maysa administrou o extrato da casca do araticum por quinze dias em diferentes concentrações: 75, 150 e 300 miligramas. “Avaliei o estresse oxidativo por meio de três enzimas antioxidantes: superóxido dismutase, catalase e glutationa redutase”. A pesquisadora utilizou os métodos de determinação da atividade antioxidante Dpph, Teac e Orac, além da quantificação de fenólicos totais. O padrão químico de antioxidante utilizado foi o ácido gálico. “Observamos o equivalente de ácido gálico em cada um dos subprodutos dessas frutas, no meu caso o equivalente foi expresso por grama de subproduto, por grama de casca e por grama de semente”.

O melhor resultado obtido foi com a concentração intermediária de 150 miligramas de extrato. Foram avaliadas alterações metabólicas dos animais. “O extrato mostrou efeitos potencialmente interessantes quando da avaliação dos resultados do ensaio in vivo, embora o extrato não tenha sido efetivo para recuperar o peso corpóreo e o peso relativo do coração no período de 24 h após a administração da doxorrubicina. Do mesmo modo, os resultados de Orac do plasma e as atividades das enzimas antioxidantes endógenas, juntamente com as análises histológicas, mostraram resultados promissores”, acentua Maysa.

Nos grupos que tiveram a indução do estresse oxidativo, mas sem tratamento com extrato, as análises histológicas mostraram nitidamente que houve muitas lesões. Já naqueles tratados com o extrato, a quantidade de lesões foi menor. As análises também mostraram que a capacidade antioxidante no plasma dos animais mantém-se ativa 24 horas após a última administração. “O significado desse resultado é que, mesmo após um dia transcorrido, o antioxidante estava ativo para poder combater os danos das células”. Outro resultado positivo foi a proteção renal e hepática do antioxidante.

BIOMA SUBAPROVEITADO

De acordo com a autora da tese, há muitos trabalhos de pesquisa que analisam propriedades antioxidantes em polpas de frutas. Mas os subprodutos, ou seja, as partes que seriam jogadas no lixo, continuam um pouco esquecidas pelos cientistas. Paralelamente, o Brasil é um dos campeões em gerar subprodutos que podem causar um grande estrago ao meio ambiente, vide o bagaço da laranja. “Durante toda a cadeia produtiva são gerados subprodutos: cascas, sementes, bagaço”, lembra Maysa, justificando a escolha pela casca do araticum.

Outro motivo que levou Maysa a escolher o araticum e o pequi foi o fato dessas frutas serem oriundas do cerrado, o segundo maior bioma do Brasil (o primeiro é a Amazônia) e também ainda pouco estudado, segundo a autora. “A valorização do bioma cerrado e a utilização dos subprodutos são duas importantes contribuições do trabalho”.

Como a pesquisa mostrou que é possível reduzir estresse oxidativo causado pela doxorrubicina, resta saber se o quimioterápico continuará ativo, após o tratamento com o extrato, para reduzir o tumor. “Reduzir o estresse oxidativo nem sempre é bom. Precisamos ver se a droga continuará ali disponível para o tratamento”, assinala.

 

Publicação

Tese: “Subprodutos de araticum e pequi: estudo da atividade antioxidante dos compostos bioativos na proteção ao estresse oxidativo”

Autora: Maysa do Vale de Oliveira

Orientadora: Gláucia Maria Pastore

Unidade: Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA)