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Jornal da Unicamp
Baixar versão em PDF Campinas, 13 de junho de 2016 a 19 de junho de 2016 – ANO 2016 – Nº 659Na batida da evolução
A partir de uma investigação sobre os grupos de percussão da Unicamp e da Universidade do Vale do Itajaí (Univali), o pesquisador Rodrigo Gudin Paiva, do Instituto de Artes (IA), concluiu que as atividades neste tipo de ambiente incrementam o desenvolvimento musical dos percussionistas.
Para o autor de tese de doutoramento sobre o tema, as análises sobre os dois grupos de percussão apontam que as práticas neste contexto contribuíram para o aprendizado, a criação musical e a performance dos participantes. O trabalho foi conduzido junto ao programa de pós-graduação do IA, na área de práticas interpretativas. O professor Fernando Augusto de Almeida Hashimoto, do Departamento de Música e atual diretor da Unidade, orientou o estudo.
“O grupo de percussão potencializa a aprendizagem dos percussionistas, ampliando o desenvolvimento relacionado tanto com a performance como com a criação musical. A prática em grupo de percussão favorece a motivação e o desenvolvimento da autonomia do músico em relação à tomada de decisões e à autorregulação dos processos de estudo individual”, confirma o autor do trabalho, que é musico profissional desde 1989.
Rodrigo Gudin Paiva atua como instrumentista e integra, atualmente, a orquestra Camerata Florianópolis e o grupo instrumental catarinense Luiz Zago Trio. É também docente do curso de música da Univali. Durante a pesquisa atuou como instrumentista e aluno de pós-graduação no Grupo de Percussão da Unicamp (Grupu); e como instrumentista, coordenador e professor no Grupo de Percussão de Itajaí (GPI), função que exerce até o momento.
Pela relação direta com os grupos de percussão pesquisados, Rodrigo Paiva informa que optou pela metodologia da observação participante e do estudo multicaso. “Os dados foram obtidos por meio de diários de campo, registros de ensaios e apresentações musicais em áudio e vídeo, além de questionários realizados com os integrantes dos dois grupos. Por meio da observação participante, os dados puderam ser coletados de maneira tão extensa quanto intensa. As análises foram realizadas separadamente e, em seguida, de maneira transversal, buscando apontar singularidades e similaridades entre os grupos investigados”, justifica.
O instrumentista e pesquisador reconhece que os grupos de percussão fazem parte do cotidiano de muitos professores e alunos de música. Ele acrescenta que a importância destes agrupamentos é reconhecida por quem trabalha com percussão. “Os professores e alunos sabem da importância, a maioria dos cursos das universidades têm práticas com os grupos. A minha pesquisa teve o objetivo de não só confirmar esta hipótese, mas de compreender de que forma emerge este potencial e esta aprendizagem acontece. Há, além disso, escassez de literatura sobre o tema no Brasil”, fundamenta.
Características
O estudo buscou identificar e descrever, portanto, conforme Rodrigo Paiva, os aspectos das práticas em grupo que contribuem para o desenvolvimento musical dos percussionistas. Neste sentido, o autor do trabalho encontrou seis características nos dois grupos pesquisados: uso de repertório específico; emprego de instrumentação variada; inclusão de elementos cênicos na performance; a prática de estudos individuais e ensaios semanais em grupo; diferentes possibilidades de criação; e diversidade de aprendizagens.
Em relação ao uso de repertório específico, o pesquisador destaca que em ambos os grupos este aspecto representou um elemento fundamental para o desenvolvimento musical dos alunos. “No Grupu o foco está na performance de música contemporânea dos séculos 20 e 21. Já o GPI se baseia num repertório mais autoral, desenvolvido por meio de um processo de criação coletiva. Tanto a ênfase na criação quanto na performance contribui para o desenvolvimento musical em diferentes aspectos, à medida que o equilíbrio entre as habilidades e os desafios vão sendo ajustados em um fluxo contínuo”, aponta.
A oportunidade de estudar e aprimorar as habilidades em variados instrumentos constitui-se em outro elemento relevante para o desenvolvimento técnico dos percussionistas. “Trata-se de uma instrumentação muito variada. Num grupo de percussão, o aluno tem oportunidade de tocar muitos instrumentos. Portanto, isso exige estudo e dedicação para as técnicas específicas de cada um deles. As técnicas para tocar um atabaque e uma marimba, por exemplo, são muito diferentes”, exemplifica.
A inclusão de elementos cênicos na performance musical apareceu de forma bastante evidente na pesquisa como contribuição à potencialidade dos percussionistas. Rodrigo Paiva explica que a utilização de elementos cênicos acontece de maneira distinta nos grupos. No Grupu esses elementos aparecem em algumas obras, de modo pontual, enquanto que, no GPI, os elementos cênicos passaram a ser incorporados à performance do grupo como um todo e de forma mais evidente.
“Apesar das diferenças, em ambos os casos, os elementos cênicos elevaram o nível dos desafios e das habilidades, possibilitando um entendimento aos alunos de que não é ‘só tocar’. Desse modo, a performance passou a ganhar novos significados, o que também representou excelentes oportunidades para a criação coletiva.”
As práticas de estudo individual e os ensaios semanais em grupo impulsionam a motivação, a aprendizagem e o comprometimento nos dois grupos. Rodrigo Paiva relata ainda que os grupos de percussão constituem como um ambiente propício para o desenvolvimento da criatividade, aspecto relacionado às possibilidades de composição, arranjo ou adaptação; sugestão de ideias e estudos; montagem de espetáculos; inserção de elementos cênicos; e interpretação e improvisação.
“Em relação ao aspecto da diversidade de aprendizagem, a prática do grupo de percussão contribui para a formação musical do percussionista de forma bastante ampla. Esta diversidade está relacionada a habilidades musicais, conhecimento do repertório e do contexto histórico, valorização da percussão e da profissão, aquisição de hábitos e postura profissional, aspectos emocionais, experiência e vivência musical em grupo, relacionamento e comunicação interpessoal.”
Grupos pesquisados
O Grupo de Percussão da Unicamp (Grupu) existe desde 1998, tendo como fundador o professor Fernando Hashimoto. A proposta do grupo é executar um repertório específico para percussão, além de incentivar e integrar alunos de composição e regência do Departamento de Música do IA. Em 2007, o grupo lançou o seu primeiro CD intitulado Configurações para percussão contemporânea, com obras de Jônatas Manzolli, Raul do Valle e do próprio Hashimoto.
Em 2014, o Grupu realizou uma temporada de concertos, apresentando obras de compositores brasileiros, como Liduíno Pitombeira (Zumbi dos Palmares) e Ricardo Tacuchian (Cárceres). O programa incluiu, ainda, a obra Trio Per Uno, do compositor sérvio Nebojsa Zivkovic; Ensaio n.4, de Barry Ford; e Musique de Tables, do compositor e coreógrafo Thiery De Mey.
O Grupo de Percussão de Itajaí foi criado em 2007 pelo professor Chico Santana, como parte do programa do curso de percussão do Conservatório de Música Popular de Itajaí. No mesmo ano, passou a ser coordenado pelo autor da pesquisa. A partir de 2010, com a criação do curso de bacharelado em Música da Univali, o grupo ampliou suas atividades, passando a ser sediado na universidade.
O repertório consistia, na época, basicamente de obras escritas para percussão, de compositores brasileiros, como Paticumpá, de Oscar Bolão; Cadência para Berimbau, de Ney Rosauro; Tambaleando, de Chico Santana; Música para Caçarolas, de Hermeto Pascoal; e Triunvirato, de Pascoal Meireles. A partir de 2009, o GPI passou a desenvolver repertório inédito para percussão, interpretando peças de autoria dos membros do grupo.
Em 2011, o grupo desenvolveu um espetáculo chamado Ritmos do Mundo e, em 2013, foi contemplado pela Lei Municipal de Incentivo à Cultura da cidade de Itajaí, com projeto para gravação de seu primeiro DVD contendo dez peças musicais inéditas gravadas ao vivo e em estúdio.
Publicação
Tese: “Grupo de percussão e aprendizagem musical: um estudo multicaso no contexto de dois grupos brasileiros”
Autor: Rodrigo Gudin Paiva
Orientador: Fernando Augusto de Almeida Hashimoto
Unidade: Instituto de Artes (IA)