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Campinas, maio de 2001 - ANO XV - N. 162.........
     
   
 
     
 
RECICLAGEM
 


Uma indústria alimentada pela fome
Exclusão social faz do Brasil o campeão em reciclagem de alumínio

pesquisadora Cleci Schalemberger Streb considera cruel o fato de a indústria da reciclagem no Brasil ser alimentada pela miséria, pelo trabalho dos catadores. Segundo ela, essas indústrias merecem o mérito por cuidar do meio ambiente, mas não devem se vangloriar pela reciclagem. “O país é campeão em reaproveitamento de alumínio, mas na verdade essa reciclagem existe por causa do problema social. Não que a indústria de alumínio não esteja preocupada, mas ela se gaba desse trabalho quando o mérito não é dela, em absoluto”, comenta.

No Brasil são coletadas, diariamente, em torno de 120 mil toneladas de resíduos sólidos, segundo dados da Feira Internacional de Tecnologias para o Meio Ambiente, realizada em outubro de 2000. Campinas recolhe, por meio da coleta domiciliar comum, 800 toneladas de resíduos sólidos domésticos por dia, uma média de 0,840 kg de lixo produzido por habitante diariamente.

A pesquisa de Cleci Streb estima, com base na composição dos resíduos recolhidos na coleta domiciliar comum, que 41% sejam passíveis de reciclagem. Entretanto, eles são encaminhados para o aterro sanitário Delta I. “Considerando a possibilidade de melhoria da separação dos resíduos na fonte e ampliação do potencial da coleta seletiva, poderiam ser recolhidas seletivamente 8.528 toneladas por mês, evitando-se o consumo 23.654 MWh de energia elétrica nesse período. Contudo, atualmente apenas 3% são coletados desta maneira”, aponta a pesquisadora.

Em Campinas, os técnicos do Departamento de Limpeza Urbana (DLU) da Prefeitura estimavam que até 2000 a adesão ao programa de coleta seletiva no município era de 50%. Do total de lixo produzido, apenas 21 toneladas são coletadas seletivamente por dia, totalizando uma média mensal de 420 toneladas de lixo passível de reciclagem (coleta oficial). Os resíduos provenientes da coleta seletiva oficial, após triados por empresas privadas, são encaminhados para a reciclagem em municípios da região de Campinas. “O reaproveitamento desses resíduos potencializa uma energia elétrica evitável de 815 MWh por mês”, comenta Cleci.

Produção per capita de lixo em função da população urbana
População (mil hab)
Prod. lixo (Kg/hab.dia)
Até 100
0,4
100 a 200
0,5
200 a 500
0,6
Maior que 500
0,7
.,Fonte: CETESB, 1999

Barão Geraldo - A quantidade de lixo coletada pelos catadores de Barão Geraldo está de acordo com o total recolhido pelos trabalhadores da Cooperativa Aliança de Coleta e Manuseio de Recicláveis São Judas Tadeu, do bairro Cambuí. Segundo os responsáveis por esta cooperativa, juntos, os 20 catadores associados coletam 55 toneladas de resíduos por mês. A média salarial desses coletores é de R$ 400.

Municípios receptores do material resultante da triagem
Material
Municípios
Papel
Valinhos, São Paulo e Monte Mor
Plástico
Hortolândia, Vinhedo, Indaiatuba e Monte Mor
Vidro
Hortolândia e São paulo
Alumínio
Hortolândia e São paulo
Fonte: Elaborado com base nos dados da pesquisa

Em Barão Geraldo são coletadas seletivamente 73,3 toneladas de resíduos mensalmente. Destas, a Prefeitura responde por 29,1 toneladas (40%) e os catadores do distrito recolhem 44,2 toneladas (60%). “Fazendo-se a relação entre coleta oficial e informal, pode-se dizer que o volume de resíduos coletados seletivamente é 52% superior ao considerado oficial”, afirma Cleci Streb. “A energia evitada chega a 2.428 MWh por mês. Somando o potencial representado pela coleta comum, de 23.654 MWh, a energia elétrica potencialmente evitável com a reciclagem de resíduos sólidos provenientes dos domicílios de Campinas passa a 26.082 MWh por mês”, indica a pesquisadora. (T.F.)

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Pesquisadora sente preconceito na pele

Apenas a origem humilde da pesquisadora, mestra e doutoranda Cleci Schalemberger Streb não foi suficiente para fazê-la imaginar o tamanho da distância entre simplicidade e pobreza, antes de iniciar seus estudos sobre coleta informal de lixo reciclável em Campinas, mais precisamente em Barão Geraldo. A contradição entre a riqueza do lixo e, muitas vezes, a miséria de quem o recolhe pelas ruas, choca. A vergonha dos catadores de lixo em desempenhar tal função, entristece. O preconceito da população contra os desempregados que recorreram a esta nova opção de trabalho, revolta.

Quando começou sua pesquisa, Cleci resolveu acompanhar a rotina dos catadores. “Pensei que ia ser fácil”, lembra. Como decidiu estudar em sua tese de mestrado a classe desempregada que se transformou em grupo de coletores, imaginou que fosse encontrar uma realidade menos miserável que a dos catadores que moram nas ruas. Realmente, o que viu foi um lado menos pobre. Mas não menos árduo.

Preconceito - A pesquisadora conta que em Barão Geraldo, a maioria das pessoas entende e conhece os catadores. Mas Cleci lembra-se bem de ter sentido na pele o significado do pré-julgamento. “Eu decidi vir à Unicamp pegar lixo e, um dia antes, ele (um catador) me avisou: ‘Te prepara’. E respondi: ‘Imagine, a Unicamp é a minha casa, trabalho lá, não vai haver problemas. Foi engraçado... A gente passando, eu na carroça, junto. Acho impossível alguém não ver você em cima de uma carroça. Passei ao lado de colegas (não amigos, mas colegas) e fui ignorada ao cumprimentá-los. É aquela coisa do preconceito. Não adianta dizer que não existe, porque existe”, relata. “Por isso, o mais importante do trabalho com os catadores, para mim, foi a experiência de vida. Porque a gente acha que está perto das coisas, e não está”.

Classificação do lixo

Lixo comercial
Inclui resíduos originários das atividades realizadas em escritórios, hotéis. lojas, cinemas, mercados, terminais, etc., composto basicamente de papéis, papelão e embalagens em geral

Lixo domiciliar
Composto basicamente de restos de alimentos, embalagens plásticas, de metal, de vidro, de papelão, jornais e revistas, originando-se das atividades de residências
Lixo industrial
Devido a sua diversidade e potencial risco à saúde pública, a coleta deste tipo de resíduos é responsabilidade da própria indústria, que deve fazer sua manipulação adequada por meio do tratamento correto ou reutilização dos resíduos
Fonte: CIdentificação do lixo urbano, segunda dados fornecidos à pesquisadora em 2000 pela Prefeitura de Campinas



 

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