Edição nº 566

Nesta Edição

1
2
3
4
5
6
8
9
10
11
12

Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 23 de junho de 2013 a 29 de junho de 2013 – ANO 2013 – Nº 566

Da nutrição à comunicação visual

A trajetória do funcionário Geraldo Camargo, da cozinha do Hospital de Clínicas à Casa do Lago


O espaço na cozinha da Nutrição do Hospital de Clínicas (HC) da Unicamp, apesar de sua importância, parecia pequeno para as aspirações do jovem Geraldo José Camargo, em 1986. O investimento em educação acompanhava a jornada de trabalho do auxiliar de cozinha e serviços gerais e, mais tarde, contribuiu para que não tivesse uma trajetória estática na Universidade. Como havia trabalhado em cozinha industrial, Geraldo não teve grandes dificuldades em ser aprovado no concurso para a função de auxiliar. Mas esta foi somente sua entrada na Unicamp. Hoje, com formação em técnico de meio ambiente e bacharel em comunicação visual, com foco em design gráfico, ele atua no Espaço Cultural Casa do Lago, principalmente na sala de cinema. “Ainda na cozinha, enquanto carregava uma caixa de alface, um colega se dirigiu a mim de forma grosseira para dizer que estava na área administrativa porque havia estudado. Minha luta e minha conquista são respostas para tal provocação, mas não tenho ressentimentos”, relembra.

Por adquirir Lesão por Esforços Repetitivos (LER), logo trocou a nutrição por um aparelho de eletrocárdio e, em seguida, pela farmácia ambulatorial. Anos depois, foi trabalhar como técnico de audiovisual no Gastrocentro, mas aprendeu por esforço próprio já que não dominava a área de informática. Diante das dificuldades, procurou formação complementar em cursos de hardware, power point, entre outros. Uma coincidência importante no curso foi o encontro com o professor Luís Dadalt, que acabou solicitando seus préstimos para o power point de sua tese. “Fiz sem jamais ter operado o programa.”

Mas a certeza de que havia deixado somente no coração o período ao lado dos amigos da nutrição veio ao ser transferido para a Faculdade de Educação (FE), onde deparou com um “arsenal tecnológico” para lidar com “eventos pequenos e grandes, pessoas calmas e bravas”, que o ajudaram a crescer profissionalmente. A convivência com o companheiro Humberto Prado, hoje funcionário da RTV Unicamp – onde Geraldo também atuou nas gravações de programas –, ampliou a bagagem na área de comunicação visual.

Por ser contra a detenção do conhecimento, Geraldo, ao tomar contato com textos de filosofia, decidiu criar, em 2009, um café filosófico para funcionários da Faculdade de Educação, sempre no horário de almoço, uma vez por mês. A iniciativa, na gestão do diretor Sérgio Leite e da diretora associada Marcia Strazzacappa, teve apoio dos professores Silvio Gamboa, Sônia Guibelei, César Nunes e todos os grupos de trabalho da unidade.

A iniciativa lhe rendeu título de professor convidado da FE. O mesmo projeto foi apresentado no Simtec. Durante os cafés, Geraldo também fazia a coleta de pilhas usadas para dar-lhes o destino certo. Hoje, este projeto é mantido pelos colegas Pitágoras, Romão e Lairce.

Contente por ter propagado a cultura do café filosófico na FE, o que o deixou completamente feliz foi a oportunidade de levar a iniciativa ao bairro onde morava, o Jardim Novo Campos Elíseos. “Montei a estrutura para que eles deem continuidade”, explica. Proposta a ser idealizada em associações e não só em espaço cultural. Lá, ele e sua equipe organizaram várias atividades culturais, como festas infantis e saraus. A ideia, segundo Geraldo, era convidar comerciantes que falassem sobre sua área, garis que quisessem falar sobre a melhor separação do lixo, por exemplo. “O objetivo era permitir que as pessoas da comunidade falassem”, reafirma.

Hoje, diante de softwares, imagens, vídeos, fotografias, Geraldo viu que, apesar de permanecer em espaço especial da memória, a imagem do jovem de 21 anos na nutrição do HC foi substituída pela imagem atual do técnico de audiovisual que, na FE colaborou para constituir a memória de bancas de teses, eventos e reuniões importantes.

Muitas pessoas da Unicamp participaram de sua formação na educação básica. Uma delas é o diretor do Grupo Gestor de Benefícios Sociais (GGBS) da Unicamp, Edison Lins, professor de língua portuguesa na Escola Estadual Vitor Meirelles. Uma das lembranças boas de Geraldo é o empenho da atual pró-reitora de Pesquisa da Unicamp, Gláucia Pastore, em amenizar seus débitos com as mensalidades do Colégio Atheneu, onde ela era tesoureira quando ele frequentou o ensino médio. Com o amigo e doutor em química Celso Ribeiro de Almeida, hoje funcionário da Secretaria de Extensão da Pró-Reitoria de Extensão, ele pode realizar estágio na área de ambiente.

Terceiro de uma família de oito irmãos, o ex-aluno da Escola Sofia Velter Salgado, na Vila Teixeira, orgulha-se por ter crescido num lar em que os estudos eram cobrados pelos pais, Sofia Helena de Paula e Geraldo Apparecido Camargo. Isso fez com que retomasse os estudos em algumas escolas particulares de Campinas e, mais tarde, na instituição Universidades Paulistas (Unip).

Enquanto muitos pais se desdobram para realizar o desejo dos filhos e adquirirem tecnologias caríssimas, como celulares de última geração, Geraldo, na adolescência, adquiriu sua primeira bicicleta sem preocupar seus progenitores. A aquisição foi feita com parte do dinheiro que recebia em uma oficina de conserto de rádio e tevê e numa banca de jornal onde trabalhava para participar do orçamento familiar.

Sem se preocupar, Geraldo sempre se preparou para as voltas da vida. Tem consciência de que se ontem o pai e a mãe, falecida em 1986, lhe ofereciam ferramentas para construir sua história e a oficina lhe oferecia recursos para a primeira bicicleta, hoje sua dedicação aos estudos e ao trabalho na Unicamp são instrumentos para muitas realizações. Mas espera mais. Ainda há muitos sonhos a realizar. Um deles está no Caminho de Santiago da Compostela.


Caminho do sol

Mas não são apenas os cafés filosóficos que atraem Geraldo fora da Unicamp. O técnico marcou presença em várias corridas e maratonas. Em 2010, sem saber o que faria sozinho em suas férias, foi incentivado pela esposa a traçar o Caminho do Sol, um trajeto pelo interior de São Paulo inspirado no Caminho de Santiago da Compostela, na Espanha. Na verdade, o trajeto paulista é uma preparação para o europeu, que Geraldo ainda planeja cumprir. “Sempre tive vontade de fazer um percurso longo e este caminho chamava minha atenção, mas não tinha informações sobre segurança, mas quando decidi, fui informado sobre a contratação de seguro de vida. Foi uma realização para mim.”

No caminho para Santana do Parnaíba, onde os 241 quilômetros começam a ser percorridos, encontrou 12 pessoas, entre elas o funcionário da Unicamp Rodolfo Bonamino. Ao chegar à pousada onde todos os peregrinos se encontram, observou os cajados nomeados encostados em uma parede da casa de arquitetura rústica. “Eles não nos entregaram. O dono da pousada nos disse que o cajado escolhia o dono, sendo assim, fui escolhido por um cajado chamado ‘Ver’. Até hoje o guardo em casa.”

No primeiro dia, depois de algumas horas de sono num casarão chamado de armário, no qual se escondiam ouro e mulheres quando havia ataques de forasteiros e bandidos saqueadores da época, os peregrinos saíam para os primeiros 25 quilômetros diários. Na bolsa, muito carboidrato e água até chegar a um lugar que servisse almoço. “Alguns bons, outros ruins”, brinca Geraldo. “Tivemos ajuda do amigo Fabio Martins. Suas dicas e orientações foram fundamentais até mesmo no que diz respeito a alimentação, calçados, vestimentas, postura corporal, preparo físico para ontem. Quando olho tudo que passei, pode ter certeza que me lembro de todas as dicas do Fabio que Bonamigo e eu pudemos apreciar, não esquecendo todos os cuidados de minha esposa Dilva de Carvalho, de minha família, da família de Bonamigo, que me acolheu em sua casa.”

Sem guia – apenas com roteiro e credencial –, os peregrinos tinham de carimbar os lugares por onde passavam. “Somente uma pessoa conseguiu carimbar todas as cidades. O que chamou a atenção de Geraldo foi a presença de um livro sobre Santiago da Compostela em cada solo pisado pelos caminhantes. A obra, em sua opinião, é “instigante”, e os adeptos acabam fazendo reflexões sobre a viagem.


O cansaço era amenizado pelo contato com a natureza, a não ser em trechos em que o peregrino especializado em meio ambiente foi obrigado a fazer algumas observações críticas. “É muito bonito, mas a degradação é evidente. Em Pirapora, por exemplo, é possível ver espumas escuras de uma hidrelétrica.

“A curva do rio cheia de garrafas pet também causa má impressão”, pontua. Geraldo também aponta as queimadas, que acabam matando muitos animais. Segundo o técnico, os grandes proprietários começaram a perceber que o plantio de cana-de-açúcar era uma atividade rentável, mas deixam a cidade depois da produção. Os trabalhadores acabam tendo de ir à procura de emprego nas cidades, mas as respostas quase sempre negativas levam muitas pessoas às ruas em busca de sustento. “A situação do empregado não é levada em conta. Os filhos vão pedir dinheiro e muitos pais não oferecem educação formal aos filhos por morarem em bairros afastados. Ficamos impotentes. Vemos, comentamos, mas não podemos fazer nada. E isso bem perto de nós, na região de Campinas”, pontua.

 

Comentários

Comentário: 

Bom dia Geraldo! Tudo bem?
Parabéns pela reportagem!!!
Não há nada mais gratificante do que ver aquela sementinha que você plantou lá trás, virar uma grande àrvore e dar frutos!!!!!
Sinto-me privilegiado de ter feito parte desta sua caminhada, seu esforço e dedicação. Foram muitos os obstáculos, mas todos foram vencidos com garra e dedicação!!!!
Mais uma vez Parabéns!!! Muito Sucesso à você!!!!
Jair

Comentário: 

Parabéns amigo querido , nossas lutas não foram em vão
temos muito que agradecer por esta oportunidades que a UNICAMP nós deu e que soubemos aproveitar com grande sabedoria , está ai as nossas conquistas pois veio através
de muito trabalho E PERSEVERANÇA .
Jessi Analista Contratos/HC.

Comentário: 

Parabéns!! Geraldo
Você merece, pelo esforço e pela pessoa que você é
Teresa

Comentário: 

Caro Geraldo: Fico feliz em ter sido lembrado por ti nesta matéria, o que muito me lisonjeia. Tive a oportunidade em lhe ensinar algumas técnicas que hoje vejo você as colocando em prática; quando esteve comigo na Seção de Multimeios da Faculdade de Educação e na Produção e Pós-Produção da Web Rádio Unicamp entre os anos 2006 e 2012. A última continua transmitindo a programação científico-cultural desta universidade que deu a nós tantos subsídios para ser o que somos... Parabéns amigo... e avante!!!! HUMBERTO PRADO - Radialista

webradio@rtv.unicamp.br

Comentário: 

Parabéns Geraldo, você merece!
Que Deus continue sempre te iluminando!
Daniel - CAC/Preac

Comentário: 

Agradeço de coração todo carinho dos amigos não só os que eu trabalhei junto, mas os que eu convivo em minha vida nesta universidade e fora dela foram tantas pessoas, que só mente Deus pra me ajudar lembrar, me perdoe se não citei seu nome, mas uma coisa vocês pode ter certeza lembro-me de cada rosto quando inicio um novo projeto de vida.
Quantos amigos me deram aulas, quantos me escutarão e corrigirão, quantos ajudei e fui ajudado.
Um enorme abraço a todos (as)
Em especial minha esposa querida Dilva de Carvalho.

Geraldo Camargo

geraldoj@unicamp.br