Edição nº 569

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 04 de agosto de 2013 a 10 de agosto de 2013 – ANO 2013 – Nº 569

De aluna-artista a curadora

Sandra Caro Flório é responsável pelo acervo das obras do pai,
Bernardo Caro, que também foi seu professor

A obra do artista plástico Bernardo Caro ainda circula pelo Brasil, e a responsável por isso é Sandra Caro Flório, uma de suas filhas. Desde a morte do artista, em 2007, ela recebe convites para expor as obras de seu mestre. Sim, mestre, porque de tanto dar cor ao tecido branco das telas que encontrava pela casa, Sandra tornou-se aluna do pai, no final da década de 1970, no curso de graduação em artes plásticas da PUC-Campinas. O melhor dos mestres, porém, continha-se em dar nota 10 em suas avaliações, conforme brinca Sandra. Pai, pai, aluna, aluna. Era assim que funcionava com Bernardo no espaço de aula.

Em casa, Sandra fazia questão de acompanhar seus passos de perto, daí ter se tornado, naturalmente, a curadora de suas exposições. Emociona-se a cada convite, pois assumiu o compromisso de nunca deixar morrer a memória de Bernardo Caro, que, em Campinas, participou da criação de dois cursos de artes, o da PUC e o da Unicamp. Além de ser um dos representantes do movimento dos anos 60 Vanguarda, vale lembrar. “É uma honra ser curadora e um orgulho ver a procura pelas obras de meu pai.”

O primeiro convite foi feito em 2008, quando a Galeria B do Centro de Convivência Cultural foi reinaugurada com o nome de Galeria Bernardo Caro. Os cuidados de Sandra nos preparativos para a mostra, além da emoção ao comentar algumas das telas durante a montagem, ficaram gravados na memória de quem esteve com ela algumas horas antes do evento. Além do mais, não se esquece da dedicação de seu filho, Adriano Caro Florio, na época com 11 anos, participando da produção dos convites e também da montagem. Desde então, Sandra experimenta na pele e na alma a missão “árdua” e ao mesmo tempo prazerosa de um curador. “Foi nesse momento que começou a aflorar em mim a vontade de voltar para a arte.” Logo em seguida, surgiu convite para outra retrospectiva do trabalho do pai no Colégio Sagrado Coração de Jesus. E hoje a agenda já virou de 2013 para 2014.

Sandra lida com uma quantidade enorme de telas, grandes e pequenas, devidamente acondicionadas em dois ateliês, um deles nas dependências da casa de Terezinha Dora Gagliardi Caro, viúva do mestre e mãe da aluna. A proposta da artista é reunir todas as obras em um mesmo ambiente. Cada mostra exige um conjunto diferente de obras, como, por exemplo, a destinada à Comunidade Espanhola de São Paulo, que busca telas que retratem a união entre a tradição da pintura espanhola e a temática brasileira. Filho de imigrantes andaluzes, da cidade Villanueva del Trabuco, Caro retratou bem esta temática.

A cada exposição, Sandra também cumpre o desejo de catalogar todas as obras de Caro. “Agora posso dizer que estou conseguindo catalogar o acervo de meu pai. Para ter ideia, ele tinha quadro isolado na DGA (Diretoria Geral de Administração da Unicamp). Até que comentei com uma pessoa de lá que o quadro era dele e ela decidiu me devolver.”

Espaço de arte

Na Unicamp também delicia-se desse reencontro com a arte, proporcionado pelo pró-reitor de Extensão e Assuntos Comunitários da Unicamp, João Frederico da Costa Azevedo Meyer, quando este assumiu a direção da Coordenadoria de Desenvolvimento Cultural (CDC) da Unicamp. “Ele disse que precisava de um funcionário em artes plásticas para assumir a curadoria do Espaço das Artes, mas eu relutava. Até que decidi aceitar e hoje me realizo porque o encontro com os artistas é indescritível para quem cresceu nesse meio”, declara.

Sandra cursou ensino fundamental e médio no Colégio Ave Maria. Iniciou sua carreira profissional como professora de artes na escola de educação infantil Jardim Encantado das Artes, mantida pela PUC-Campinas. Período no qual se realizou profissionalmente até se tornar especialista da Acrilex e começar a dar aulas de pintura no Palácio das Lonas, loja do pai e de seu tio. Lá, atuou por cinco anos.

Apesar das saudades declaradas da época de sala de aula, um dos momentos mais importantes de sua vida profissional corresponde ao período de 1988 a 2013. Em 1988, o maestro Benito Juarez, na época regente da Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas e professor do curso de música da Unicamp, convidou-a para o Nidic da Unicamp, hoje Ciddic, onde assumiu a produção de material de divulgação das atividades artístico-culturais da Universidade por meio da criação de panfletos e cartazes. Mais uma vez, viria atuar perto de seu maior ídolo, Bernardo Caro. Mas assim como na PUC, pelo fato de o Nidic estar, na época, instalado no mesmo prédio do Instituto de Artes, o acordo se repetiu: pai, pai, funcionária, funcionária.

A conduta de Bernardo teve efeito positivo na trajetória de Sandra na Unicamp, pois hoje se orgulha de ter conquistado muitos amigos do meio artístico e de outras áreas por ser simplesmente a Sandra, companheira de trabalho, amiga para momentos bons e ruins. Até hoje, algumas pessoas, segundo ela, se espantam ao saber que é filha de Bernardo. “Hoje, quando essas pessoas me reencontram e me abraçam, sei que fui eu mesma”.

Por muito tempo, Sandra foi a divulgadora do Núcleo de Integração e Difusão Cultural (Nidic), atual Ciddic, mas em momento de crise no quadro de funcionários, Juarez pediu socorro na área administrativa. Chamado ao qual Sandra não hesitou em atender. Acabou descobrindo que, além de artista, era uma competente administradora. Mas a amizade com os músicos da orquestra sempre foi mantida, tanto na gestão de Benito quanto na de Paulo Justi, falecido em 2010.

Embora no quadro de servidores administrativos, Sandra sempre TENHA trabalhado com artistas. Após dez anos no Nidic, foi atuar na Coordenadoria de Desenvolvimento Cultural (CDC) com o professor do Departamento de Artes Plásticas Carlos Fernandes. A missão se ampliou na gestão da professora Maria Irma Hadler Coudry (Maza), em que foi convidada a ajudar na coordenação como assistente técnica de direção.

A curadoria é uma forma de Sandra aconchegar-se à arte, mas sempre tem vontade de pintar nem que seja para si, então se realiza colorindo telas brancas, como nos velhos tempos. Hoje em dia, assume o sobrenome Caro e muitos perguntam por que não revelava isso. Talvez pela cobrança aplicada às pessoas que seguem a mesma carreira do pai ou da mãe. “Quem sabia achava que eu tinha de pintar igual, e a cobrança me deixava desesperada. Talvez por isso eu tenha migrado para a área administrativa. Mas sempre vem vontade de pintar. Aí me realizo”, declara.

Uma resposta prazerosa recebida com a curadoria do Espaço de Arte da CDC é a receptividade positiva da comunidade universitária e externa à arte. Prova disso é a demanda de unidades para receberem exposições itinerantes. Ela acentua que no início, a CDC sondou algumas unidades, que aceitaram prontamente, mas muitas delas procuram a coordenadoria para também recebê-las. “É uma realização ver as artes plásticas tomando seu lugar na Universidade.” Com essa iniciativa, espaço de eventos como o da Agência de Formação Profissional da Unicamp (AFPU), localizado na Diretoria Geral de Administração (DGA), está sempre decorado. Assim como o Centro de Saúde da Comunidade (Cecom), a Faculdade de Ciências Aplicadas e a Escola de Extensão (Extecamp). As crianças também passam a fazer parte desse movimento, pois há a proposta de alguns artistas desenvolverem atividades no espaço de educação infantil da Unicamp. Além disso, elas também visitarão o espaço de arte. A ideia, segundo Sandra, é ampliar para outras escolas.

O projeto itinerante, segundo Sandra, pode ultrapassar os alambrados, pois há propostas de órgãos oficiais de Campinas. “Temos de ter uma seleção, pois o espaço da CDC é limitado”. O sonho é envolver mais pessoas, como artistas escondidos, funcionários artistas e fotógrafos.

Sandra faz questão de ressaltar a participação importante da equipe do CDC, principalmente o colega no Espaço de Arte Fábio Cerqueira. Também destaca a iniciativa da coordenadora da CDC, Margareth do Carmo Vieira Junqueira, que torna possível todas essas realizações. Também menciona a colaboração de Davi William Amâncio no Projeto Moldura Musical, com apoio do Grupo Gestor de Benefícios Sociais (GGBS), em que músicos da Universidade fizeram apresentações durante as exposições na CDC.

O coração de pai e de artista orientou Bernardo a deixar pronto o material necessário para fazer dele e de sua obra algo memorável. Um roteiro esboçado por ele e deixado na cabeceira da cama deve nortear a elaboração e produção de um livro sobre as obras que foram doadas por ele. No papel, o nome da obra e o nome do presenteado.

O compromisso com tantos projetos precisa da compreensão de toda a família. “Eles colaboram, pois sabem que assim estou realizada. Não quero deixar esquecido o nome de alguém que tanto contribuiu para a cultura brasileira.”

 

Comentários

Comentário: 

Sandra, parabéns a você e família pela importante continuidade.

cleonice@reitoria.unicamp.br

Comentário: 

Parabéns, Sandra!
Pessoa querida e profissional respeitável, que muito me ensinou e que continua me inspirando.