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Jornal da Unicamp
Baixar versão em PDF Campinas, 19 de maio de 2014 a 25 de maio de 2014 – ANO 2014 – Nº 597Telescópio
Artigos apontam degelo irreversível na Antártida
Dois artigos científicos divulgados na semana passada alertam para o colapso do lençol de gelo da Antártida Ocidental, o que poderia causar uma elevação drástica do nível dos oceanos. Um dos trabalhos, que será publicado no periódico Geophysical Research Letters, afirma que seis grandes glaciares do lençol já “passaram do ponto sem volta”, e que seu colapso é irreversível. “Essas geleiras já contribuem de modo significativo para a elevação do nível do mar (...) Elas contêm gelo suficiente para elevar o nível global dos oceanos em 1,2 metro”, diz nota divulgada pela Universidade da Califórnia em Irvine, onde atua um dos autores do estudo. O trabalho se baseia em observações realizadas ao longo dos últimos 40 anos. O colapso total pode ocorrer ao longo de vários séculos.
Já o artigo publicado na revista Science mostra que o Glaciar Thwaites, também localizado no lençol de gelo ocidental, está se desintegrando. Esse colapso pode levar mais de 200 anos, e acrescentar cerca de 60 centímetros ao nível do mar. A perda do Glaciar Thwaites deve abrir caminho para um derretimento mais rápido e generalizado de outras partes do lençol.
Política social no longo prazo
Um estudo avaliou um programa de transferência de renda para famílias pobres mantido pelo governo dos Estados Unidos entre 1911 e 1935, e constatou que os filhos homens das mães aceitas no programa tiveram, em média, um ano a mais de vida, 30% mais anos de estudo, correram menos risco de desnutrição e maior renda, na vida adulta, que filhos de mulheres rejeitadas. O programa, chamado “Pensão das Mães”, buscava beneficiar “crianças que se tornaram dependentes pela perda ou invalidez do arrimo da família”.
“Um dos principais desafios de avaliar se transferências de renda (...) melhoram os resultados é identificar um contrafactual plausível: como seriam as vidas das crianças na ausência das transferências?”, escrevem os autores, ligados ao National Bureau of Economic Research (NBER), um instituto privado de pesquisas econômicas dos EUA. “Nossa estratégia principal foi usar, como grupo de comparação, filhos de mães que requisitaram as transferências mas foram rejeitadas”. Uma das vantagens do uso de uma base de dados antiga, afirmam os pesquisadores, é a possibilidade de comparar dados de longevidade: o estudo mostrou que o ganho médio de um ano de vida foi ainda maior nas famílias mais pobres.
Você às vezes fala sem pensar
O senso comum sugere que as pessoas geralmente elaboram o que querem dizem em suas mentes antes de abrir a boca, mas um estudo publicado por pesquisadores suecos no periódico Psychological Science sugere que, ao menos em algumas circunstâncias, o falante só toma consciência do que está dizendo da mesma forma que seus ouvintes: ao escutar a própria voz.
No experimento conduzido pelos cientistas europeus, voluntários pronunciavam palavras mas, por meio de uma manipulação realizada no laboratório, ouviam-se dizendo outra coisa. Nessa condição, mais de 60% das manipulações passaram despercebidas e, dessas, 85% foram aceitas pelos voluntários como produzidas por eles mesmos.
Pessoas que perdem a audição ao longo da vida não perdem a capacidade de articular a fala, o que sugere que esse “feedback auditivo” não é o único mecanismo de atribuição de significado ao que se diz, mas o principal autor do trabalho, Andreas Lind, disse ao site Nature News, da revista Nature, que “as pessoas provavelmente se valem mais dele do que de outros tipos de feedback, na hora de determinar o significado das próprias palavras”.
Sarampo cresce nos Estados Unidos
Depois de ser considerado erradicado no país em 2000, o sarampo está voltando aos Estados Unidos, e em 2014 o número de casos cresce à maior taxa já vista em quase 20 anos, com o número de pacientes registrado pelos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) chegando a 161 em 3 de maio.
O ressurgimento da doença está sendo rastreado a americanos não vacinados que foram expostos à doença no exterior e depois retornaram ao país. Em resposta aos surtos recentes de doenças evitáveis por vacinas, como caxumba e coqueluche, alguns Estados dos EUA aumentaram as restrições ao uso da objeção de consciência como justificativa para que os pais deixem de vacinar os filhos, e alguns pediatras já vêm se recusado a tratar – “demitindo”, na palavra usada em reportagem de 2012 do Wall Street Journal – crianças não vacinadas.
Peste Negra e a seleção natural
As gerações de europeus que viveram imediatamente após o fim da Peste Negra do século 14 foram compostas por indivíduos mais fortes e saudáveis que as gerações imediatamente anteriores, afirma estudo publicado no periódico PLoS ONE. A autora do trabalho, a antropóloga Sharon N. De Witte, da Universidade da Carolina do Sul (EUA), tirou essa conclusão extrapolando a partir de amostras retiradas de cemitérios londrinos usados antes e depois da praga, que eliminou pelo menos 30% da população do continente.
A autora nota que estudos anteriores já haviam determinado que a peste não matava de modo indiscriminado, mas “selecionava” suas vítimas entre as pessoas que já eram mais fracas e de saúde frágil. “Dado que a mortalidade associada à Peste Negra foi extraordinariamente alta e seletiva, a epidemia medieval pode ter moldado os padrões de saúde e a demografia da população sobrevivente”, escreve De Witte.
Depois de comparar dados demográficos e as amostras dos cemitérios, onde esqueletos foram analisados para definição de longevidade e saúde, a autora conclui: “Os resultados deste estudo indicam que a mortalidade e a taxa de sobrevivência melhoraram nas gerações seguintes à Peste Negra (...). Estes resultados põem em evidência o poder das doenças infecciosas em moldar padrões de saúde e demografia de populações inteiras, tanto no curto quanto no longo prazo”.
Aulas chatas ensinam menos, diz estudo
Pode parecer óbvio, mas agora há confirmação científica: aulas em que o professor se limita a expor a matéria, como se estivesse dando uma palestra, são menos eficazes do que aulas que buscam envolver os estudantes por meio de discussões e atividades em classe. Uma metanálise de 225 pesquisas sobre educação superior realizadas entre 1942 e 2010 concluiu que os alunos que assistem a cursos que promovem o envolvimento ativo do estudante têm, em média, notas 6% maiores, e que os estudantes que assistem a cursos baseados em palestras têm 55% mais chance de fracassar na disciplina.
A metanálise, conduzida por professores de Biologia das universidades de Washington e do Maine, debruçou-se sobre as chamadas disciplinas STEM – ciência, tecnologia, engenharia, matemática – consideradas cruciais para o desenvolvimento tecnológico e econômico. Os autores do estudo afirmam que a evidência a favor da educação mais participativa é tão robusta que não faz mais sentido considerar o modelo de palestras como o normal, ou padrão, para a educação superior, ao menos nas áreas STEM. O levantamento foi publicado no periódico PNAS.
Alemanha pede regras para pesquisa perigosa
Pesquisas biológicas como o experimento que, em 2012, aumentou artificialmente a capacidade de um vírus de gripe aviária de contaminar humanos deveriam ser reguladas pelo governo, diz relatório produzido pelo Conselho de Ética da Alemanha, um órgão consultivo do governo.
A condução dessas pesquisas, conhecidas como de “duplo uso” – já que podem tanto fazer avançar a medicina quanto produzir conhecimentos e tecnologias úteis para criminosos e terroristas – é alvo de controvérsia em todo o mundo.
Em seu parecer, o Conselho reconhece que há “aspectos incalculáveis” na análise dos riscos da pesquisa biológica, mas acrescenta que “o uso ilícito não pode ser excluído categoricamente”, não importa o grau de segurança dos laboratórios. O texto pede que uma definição de “pesquisa de duplo uso” seja estabelecida em lei, e que uma comissão governamental específica seja criada para autorizar ou vetar o financiamento público desse tipo de pesquisa.
A ciência e outra desigualdade sexual
O sexo feminino, na ciência, não sofre apenas com uma subrepresentação na comunidade dos cientistas: ele também é discriminado como objeto de estudo. Um levantamento publicado no periódico PLoS Biology mostra que as pesquisas sobre a evolução dos órgãos sexuais privilegia fortemente a genitália masculina: no período 2010-2013, apenas cerca de 10% dos estudos da área trataram exclusivamente da genitália feminina, enquanto que mais de 50% trataram exclusivamente da masculina, com uma quantidade intermediária dando conta da evolução de ambas.
Os autores do levantamento argumentam que a preferência dos cientistas pelo estudo dos genitais masculinos “reflete preconceitos duradouros sobre o papel dominante do macho no sexo”, e que “a compreensão da evolução genital é prejudicada por esse viés”. Segundo os autores do estudo, fatores como a facilidade de acesso promovida pelas diferenças anatômicas não explicam o viés masculino da maior parte da pesquisa.