Unicamp
Jornal da Unicamp
Baixar versão em PDF Campinas, 21 de setembro de 2015 a 27 de setembro de 2015 – ANO 2015 – Nº 638Por dentro de um espaço de inovação, da concepção aos obstáculos
Dissertação desenvolvida no IG detalha implantação do Parque Científico e Tecnológico da UnicampA partir de 2008, a Unicamp propôs-se a trabalhar mais ativamente no processo de implantação do seu Parque Científico e Tecnológico, cuja função é aglutinar instalações destinadas a abrigar laboratórios para a execução conjunta de projetos de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) entre seus grupos de pesquisa e empresas interessadas. Essa iniciativa visa, além da pesquisa acadêmica e da formação de recursos humanos, a criação de espaços cujo objetivo é o de estreitar as relações entre a Universidade e empresas através de cultura empreendedora, a exemplo de modelos existentes nos EUA e na Europa.
Com o objetivo de contribuir para o melhor entendimento do conjunto de ações desencadeadas pela Universidade para a viabilização desse empreendimento, o geógrafo Lucas Baldoni desenvolveu dissertação de mestrado em que analisa “A estratégia empreendedora da Unicamp para a consolidação do Parque Cientifico e Tecnológico”. O trabalho foi orientado pelo professor André Tosi Furtado, do Departamento de Política Científica e Tecnológica e do Programa de Pós-Graduação em Geografia do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp. Segundo o estudo, para que esse espaço de inovação possa estreitar e viabilizar as relações entre a Unicamp e seu entorno e alcançar resultados expressivos no longo prazo há necessidade da superação de obstáculos que atualmente impedem sua construção e concretização.
O estudo mostrou que, principalmente após a década de 1960, a cidade de Campinas recebeu uma quantidade considerável de empreendimentos que abrigaram atividades de ciência, tecnologia e inovação (CT&I), denominadas espaços de inovação, como parques tecnológicos, parques científicos e incubadoras de empresas. Entre outros fatores, a criação desses espaços inovadores pode ser creditada à posição estratégica da cidade e à sua infraestrutura que despertaram interesse de empresas de base tecnológica (EBTs), que buscam beneficiar-se da proximidade geográfica para desenvolver parcerias em atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D).
Neste contexto insere-se o início da implantação da Unicamp, em 1965, que teve como objetivo principal a ênfase na pesquisa tecnológica com forte vínculo com o setor produtivo local e regional. Para contextualização do estudo, o autor faz um histórico da evolução das atividades de CT&I em Campinas, da criação dos seus parques tecnológicos até a proposta do Parque da Unicamp.
HISTÓRICO
Já na década de 1970, por iniciativas da Prefeitura Municipal e do Governo Federal e apoio de membros da comunidade de pesquisa, particularmente da Unicamp, implanta-se o Parque de Alta Tecnologia de Campinas (PACT), idealização que pretendia tornar Campinas um Polo Tecnológico. Os polos tecnológicos podem ser entendidos como centros industriais de alta tecnologia que contêm estruturas e instituições voltadas para P&D. Caracterizam-se pela aglomeração de atividades de inovação e produção inseridas dentro de um território e que passam a ser reconhecidas por suas funções de polarização regional. Alguns de seus atores vislumbravam a possibilidade de replicar no município de Campinas as experiências americanas do Vale do Silício.
Depois de um período econômico adverso, em 1983, a Prefeitura Municipal em parceria com a Unicamp criou a Companhia de Desenvolvimento do Polo de Alta Tecnologia de Campinas (Ciatec) com o objetivo de prover as condições de infraestrutura que favorecessem a proximidade e a integração das atividades da indústria, comércio, educação e serviços com as de pesquisa da Universidade. Nos anos subsequentes duas áreas foram designadas para a implantação de EBTs, que deram origem aos Ciatec – Polo I e Ciatec – Polo II, ambos comumente chamados de Parques Tecnológicos da Ciatec.
A partir da década de 2000, a Unicamp passou a estabelecer elos mais estreitos com o setor produtivo. Daí decorre, em 2003, a criação de sua Agência de Inovação, denominada Agência de Inovação Inova Unicamp, com o objetivo de fortalecer parcerias entre a Universidade, empresas e órgãos do governo e incentivar a cultura e o ambiente inovador e empreendedor. Mais especificamente, a Inova Unicamp tem a missão de identificar oportunidades e promover atividades de estimulo à inovação e ao empreendedorismo, ampliando o impacto do ensino, da pesquisa e da extensão em favor do desenvolvimento socioeconômico. Coube à Inova-Unicamp implantar o Polo de Pesquisa e Inovação da Unicamp que, no final de 2012, passou a ser denominado Parque Científico e Tecnológico da Unicamp.
Face ao nome do parque criado, o autor considera importante distinguir os modelos de parques tecnológicos de parques científicos, embora ambos tenham a mesma finalidade, ou seja, facilitar o fluxo de conhecimento, possibilitar a geração de empregos, a cultura empreendedora e favorecer formação de clusters de inovação e a competitividade. O parque tecnológico é um complexo produtivo industrial e de serviços, concentrado e cooperativo que agrega empresas cuja produção se baseia em P&D. Trata-se de um empreendimento urbanístico promotor da cultura da inovação, da competitividade, do aumento da capacitação industrial, fundamentado na transferência de conhecimento e tecnologia. Constituem exemplos em Campinas os Parques Tecnológicos da Ciatec (Polos I e II), geridos pelo município, o Polis de Tecnologia, gerido pelo CPqD, o Techno Park Campinas, gerido pela Associtech e o CTI-Tec, gerido pelo Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer.
Já o modelo de parque científico se caracteriza pelo compartilhamento das infraestruturas entre universidades e empresas para a elaboração e execução de projetos por tempo determinado. Seu foco está na formação de recursos humanos através de parceria com empresas. O Parque da Unicamp constitui exemplo deste modelo.
PARCERIAS
Nesse contexto o pesquisador entende que o Parque Científico e Tecnológico da Unicamp se aproxima do conceito de parque científico, pois seu foco está na formação de recursos humanos através da possibilidade de grupos de pesquisa da Unicamp realizarem projetos em parceria com empresas.
As instalações das infraestruturas desse Parque encontram-se atualmente em curso em área específica do campus, bem como, também, através de edital público, a prospecção de empresas que possam vir a constituí-lo. Segundo edital, a sua ocupação pode se dar segundo as modalidades A e B. As empresas que optam pela A se instalam em local fixo construído pela Universidade e as pertencentes à B constroem seu próprio prédio na área do empreendimento. Em ambos os casos o objetivo é o de desenvolver atividades de P&D, por período determinado, em parceria com os grupos de pesquisas da Unicamp.
No primeiro capítulo da dissertação o autor caracteriza o significado da Geografia da Inovação e dos modelos de parques científicos e tecnológicos. Mostra que a Geografia da Inovação contempla o estudo do espaço geográfico e sua relação com o desenvolvimento tecnológico. Vem a propósito a citação de Milton Santos no frontispício do trabalho: “A compreensão da organização espacial, bem como sua evolução, só se torna possível mediante a acurada interpretação do processo dialético entre formas, estruturas e funções através do tempo”.
Dentro desses paradigmas, o segundo capítulo pretende contribuir para o entendimento dos parques científicos e tecnológicos, destacando o papel da universidade como ator principal na consolidação desses espaços de inovação. Na sequência refere-se à geografia desses parques no Brasil, mostra as iniciativas do Sistema Paulista de Parques Tecnológicos (SPTec), uma política estadual que visa o credenciamento dos parques no Estado com a finalidade de angariar recursos e dar visibilidade e credibilidade para esses espaços de inovação. Por fim, o geógrafo descreve o processo histórico de Campinas, sobretudo, da Unicamp e sua função como protagonista na consolidação de um polo tecnológico. São descritas então as condições que propiciaram a criação de cinco parques na cidade: 1) Ciatec (Polos I e II); 2) Techno Park Campinas; 3) Polis de Tecnologia; 4) CTI-Tec; e 5) Parque Científico e Tecnológico da Unicamp.
CAMPINAS COMO POLO
Com efeito, em 1970 surgia a concepção de “Parque de Alta Tecnologia de Campinas” (PACT), enquanto política pública local, proposta inovadora que sinalizava com a possibilidade de Campinas tornar-se um polo tecnológico devido à existência de infraestruturas de CT&I de excelente qualidade como a Unicamp, a PUC-Campinas e o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da Telebrás, atualmente CPqD, criado em 1976 como empresa estatal que detinha o monopólio dos serviços públicos de telecomunicações no território nacional, posteriormente privatizado. Esta iniciativa impulsionaria a criação da Companhia de Desenvolvimento do Polo de Alta Tecnologia de Campinas (Ciatec), em 1983, posteriormente consolidado em dois polos. O estudo apontou que na atualidade, a Ciatec encontra obstáculos para consolidar seu parque, sobretudo, o credenciamento no SPTec.
Em seguida, na década de 1990, por iniciativa da empresa Unimovel, ligada ao Grupo DPaschoal, surgiu o “Techno Park Campinas”, apontado como um dos pioneiros a concretizar o modelo de condomínios empresariais no Brasil. Atualmente, após o credenciamento definitivo no SPTec, o Techno Park apresenta-se como um parque tecnológico possuidor de avançada infraestrutura e capaz de motivar atividades de CT&I dentro e fora do território de Campinas.
No ano de 1992 era inaugurado outro importante espaço de inovação em Campinas, o Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (CTI), unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), que atua em P&D na área de tecnologia da informação, cujos principais focos de atuação são microeletrônica, componentes eletrônicos, sistemas, mostradores de informação, software, aplicações de tecnologia da informação, robótica, visão computacional, tecnologias de impressão 3D para indústria e medicina, software de suporte à decisão. No ano 2010, o CTI iniciou a implantação do seu parque tecnológico, denominado CTITec, que logo obteve o credenciamento no SPTec.
Na sequência, inspirado na realidade de parques tecnológicos, o CPqD criou, em 1999, o Centro Empresarial Tecnológico de Campinas, denominado “Polis de Tecnologia”, como nova alternativa para empresas que desejam se instalar na região. Este parque obteve o credenciamento no SPTec. Por último, o estudo demonstra e analisa a iniciativa da Unicamp, por intermédio de sua Agência de Inovação, para consolidar dentro do seu campus universitário e, consequentemente no território de Campinas, o seu parque científico.
PONTO DE INFLEXÃO
Para o autor, o Parque Científico e Tecnológico da Unicamp, estabelecido em 2008, coloca a Universidade na condição de importante ator na consolidação do Polo Tecnológico de Campinas e a decisão de construí-lo dentro do campus constitui um ponto de inflexão nesse processo. A gestão da Inova Unicamp configura a preocupação no estabelecimento de parcerias em P&D com empresas que venham a se instalar nesse espaço de inovação.
Para ele, a decisão de construir o parque dentro do campus resulta também da constatação dos incipientes resultados conseguidos por outros parques anteriormente instalados em Campinas, o que ele credita à pouca interação entre os gestores dos espaços de inovação da cidade, atribuindo a ausência de resultados expressivos à falta de diálogo entre os atores envolvidos no processo, a fatores econômicos, legais, institucionais, políticos, entre outros.
Na sequência da publicação, o pesquisador analisa a formação do Parque Científico da Unicamp e as ações implementadas para sua implantação no interior do campus. Ao estabelecer a trajetória que precede a vinda desse espaço de inovação para dentro da Universidade, ele procura entender o seu aspecto visível no espaço geográfico e analisa seu modelo de ocupação.
Frise-se que a implantação da Unicamp na cidade de Campinas teve como objetivo principal abrigar uma nova estrutura organizacional com ênfase especial na pesquisa tecnológica que mantivesse forte vínculo com o setor produtivo. Em decorrência, desde o início, seus acadêmicos participaram ativamente do processo de elaboração de políticas públicas para assentar o potencial de CT&I a serviço de produção industrial da cidade, estabelecendo estratégias para aproximação com o governo e empresas locais.
O pesquisador apresenta então, os principais eventos que, a partir de 2000, motivaram a Universidade a criar, em 2003, a Inova Unicamp. Mostra que, a partir daí, e nos anos subsequentes, um conjunto de ações de significativa importância protagonizadas pela agência culminaram, em 2008, na criação do Parque Científico da Unicamp. O autor considera que a partir desse ponto de inflexão tornou-se possível avaliar o grau de sucesso desse espaço de inovação e, sobretudo, analisar a estratégia empreendedora da Universidade para sua consolidação.
Trata-se, diz ele, “de um empreendimento em processo de construção, diferenciado em relação a outros espaços de inovação de Campinas, o que demanda o entendimento do modelo de ocupação na área que lhe é destinada dentro do campus”. São analisados então os modos de ocupação do Parque, a caracterização do seu modelo, seu aspecto visível, assim entendida a estrutura técnica responsável pela execução de suas funções.
ESTRATÉGIAS
DE CONSOLIDAÇÃO
A dissertação é concluída com um quadro de ações que posicionam a estratégia adotada pela Unicamp para a consolidação de seu parque e mostra os resultados gerados nos primeiros anos de atuação da Inova no que tange à sua construção e termina com uma análise acerca do grau de sucesso desse parque científico no período 2008/2015.
Entre as principais ações empreendedoras da Universidade para alavancar o potencial do seu parque científico o pesquisador destaca: criação da Inova; elaboração de estudos; participação em eventos; regulamentação de iniciativas, estabelecimento de parcerias e elaboração de trabalhos conjuntos; promoção de sua institucionalização; consolidação de editais; materialização física do empreendimento através de recursos inicialmente disponibilizados pela Universidade e de sua captação externa.
Ao analisar o grau de sucesso do empreendimento no período estudado, Lucas destaca que os resultados mais importantes correspondem à vinda de empresas âncoras, à disponibilidade de prédios e aos projetos concretizados via acordos de cooperação. Ele considera que a estruturação desse espaço de inovação, através da consolidação da infraestrutura urbanística e da construção de prédios, constitui os pontos mais críticos para a materialização do empreendimento, evidenciados pelo congelamento de alguns projetos anunciados.
Estes obstáculos vão sendo progressivamente superados com o estabelecimento de parcerias com empresas privadas, estimuladas por agências de financiamento, que possibilitam inclusive a construção de prédios. Mas estas construções são ainda escassas devido à incipiente disponibilidade de capital, o que bloqueia a vinda de projetos colaborativos.
Em face dessas dificuldades, o Parque Científico da Unicamp chegou ao ano de 2015 com duas empresas âncoras: a Lenovo, interessada em investir em um centro de P&D de software de última geração, e a Innova – Energias Renováveis. A primeira optou por ocupar o Parque conforme a modalidade A, enquanto a segunda o fará com base na modalidade B, propostas no Edital, que determina o modelo de ocupação do Parque.
O autor entende que, para a construção do Parque Científico e Tecnológico da Unicamp, é necessária a busca de investimentos e que embora haja uma integração entre as escalas de análise geográfica no seu processo de construção, mostrando sua materialização no local, as forças necessárias para sua consolidação devem provir de instituições de fomento de âmbito regional e nacional. Ressalta, entretanto, que a estruturação do Parque se encontra em curso e que motivos financeiros determinaram retardos na sua agenda de implantação.
CONCLUSÕES DO ESTUDO
O pesquisador divide em três grupos as conclusões a que chegou no estudo sobre o Parque Científico da Unicamp: as relacionadas ao seu processo de construção; as relativas à sua imersão no Polo Tecnológico de Campinas; e as estabelecidas à luz dos conceitos de Geografia da Inovação.
Quanto ao processo de construção do Parque ele reforça a natureza do seu caráter científico; de que sua construção encontra-se na fase inicial e não evoluiu como o esperado; que uma das razões desse atraso deve-se à falta de recursos financeiros, impondo-se a necessidade de maiores esforços para a expansão da modalidade A, já que as empresas têm mais interesse em usar as instalações do próprio empreendimento do que arcar com construções que passam a ser propriedade da Universidade, porque construídas em seu campus.
Quanto à inserção no Polo Tecnológico de Campinas, o autor destaca os esforços da Universidade, desde a década de 1960, amplificados depois de 2008, principalmente na busca de maiores investimentos em P&D e formação de recursos humanos; considera que os poucos projetos de P&D entre os gestores do Polo Tecnológico decorrem das características da cultura empreendedora local, que cria obstáculos para ações conjuntas; enfatiza que face à complexidade do projeto os resultados alcançados ainda não são suficientes para alavancar o Parque Científico da Unicamp e, consequentemente, a efetiva consolidação de um polo tecnológico internacionalmente competitivo em Campinas, embora as expectativas dos principais gestores dos parques da cidade vejam a iniciativa como catalizadora de parcerias.
Por outro lado, a Geografia da Inovação mostra que o avanço tecnológico de Campinas permite a construção de espaços de inovação com potencial em CT&I; que o Parque da Unicamp pode usufruir da proximidade dos espaços de inovação na cidade para o estabelecimento de parcerias, criando um ambiente propício para atividades inovodoras, retendo na região uma mão de obra altamente qualificada e possibilitando ainda o aumento de oportunidades para atuações acadêmicas.
Publicação
Dissertação: “A estratégia empreendedora da Unicamp para a consolidação do Parque Científico e Tecnológico”
Autor: Lucas Baldoni
Orientador: André Tosi Furtado
Unidade: Instituto de Geociências (IG)