Edição nº 638

Nesta Edição

1
2
3
4
5
6
8
9
10
11
12

Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 21 de setembro de 2015 a 27 de setembro de 2015 – ANO 2015 – Nº 638

Telescópio


Dunas 
em Plutão

Imagens recém-divulgadas da superfície de Plutão, enviadas pela sonda da Nasa New Horiozons, revelam o que parecem ser dunas na superfície do planeta-anão. Como dunas, em Marte ou na Terra, são aglomerações de material pulverizado criadas pelo vento, e a atmosfera de Plutão é quase inexistente, as fotos deixaram cientistas intrigados.

“Ver dunas em Plutão, se é que é isso que são, seria uma maluquice completa”, disse William B. McKinnon, um dos pesquisadores envolvidos na análise das imagens, em nota distribuída pela agência espacial. “Ou Plutão já teve uma atmosfera mais densa, ou algum processo que ainda não imaginamos está em andamento”. Também não se sabe se as “supostas dunas” são feitas de gelo ou areia. 

 A superfície de Plutão está se revelando “tão complexa quanto à de Marte”, de acordo com pesquisadores da agência espacial. Já foram avistados vales, montanhas e fluxos de nitrogênio congelado. 

As possíveis “dunas” de Plutão aparecem como marcas levemente acinzentadas na região mais clara da imagem, batizada de Planície Sputnik

Poluição
que mata

A poluição do ar em ambientes abertos, urbanos e rurais, abrevia a vida de 3,3 milhões de pessoas a cada ano, principalmente na Ásia, diz artigo publicado na revista Nature. Outro artigo, no periódico Nature Geoscience, do mesmo grupo editorial, diz que de 400 a 1,7 mil mortes prematuras vêm sendo evitadas, anualmente, em toda a América do Sul, graças à redução do desmatamento na Amazônia brasileira.

O trabalho publicado na Nature levou em consideração a poluição por ozônio de baixa altitude e por partículas sólidas microscópicas, dentro de um modelo global envolvendo química da atmosfera, dados populacionais e estatísticas de saúde pública.  “Embora em boa parte dos EUA e em alguns outros países as emissões de automóveis e da geração elétrica sejam importantes (...) na Europa, Rússia e Ásia Oriental as emissões agrícolas perfazem a maior contribuição relativa de matéria particulada”, escrevem os autores, vinculados a instituições europeias e da Arábia Saudita.

Já o estudo da Nature Geoscience estima a queda na presença de partículas de fuligem no ar, ocorrida com a redução, entre 2001 e 2012, dos incêndios usados para desmatar a floresta Amazônica. “Usamos um modelo global de aerossóis para demonstrar que reduções, nos incêndios associados ao desflorestamento, causaram um declínio de cerca de 30% nas concentrações médias de matéria particulada na superfície durante a estação seca da região”, diz o artigo, assinado por pesquisadores do Reino Unido, Estados Unidos e Brasil.

De acordo com os autores, essa redução pode estar evitando até 1,7 mil mortes prematuras de adultos no subcontinente, a cada ano.

 

Transgênicos 
naturais

A transgenia – transferência de genes entre diferentes espécies – não acontece apenas em laboratórios, mas também na natureza. Pesquisadores europeus das universidades de Valência e de Tours descrevem, no periódico PLOS Genetics, a descoberta de que várias espécies de borboleta sofreram a inclusão de genes de um tipo de vespa parasita em seu DNA. A transferência foi feita, na natureza, por um vírus associado à vespa, e os genes inseridos provavelmente concedem às borboletas alguma proteção contra outros tipos de vírus, diz nota divulgada pelo periódico.

A nota explica que, para se reproduzir, a vespa injeta seus ovos nas lagartas que virão a originar borboletas, juntamente com um vírus que subverte o sistema imunológico da lagarta. Esses vírus podem se integrar ao DNA das lagartas, permitindo que as larvas de vespa dominem o hospedeiro.

Os genes do vírus foram encontrados em várias espécies de borboleta e mariposa. Esses genes “forasteiros” não são meros vestígios: testes indicam que eles desempenham um papel ativo no genoma das borboletas.

 

Um novo manto 
de invisibilidade

Pesquisadores baseados nos Estados Unidos e na Arábia Saudita apresentam, na revista Science, a construção de uma “pele” ultrafina, com 80 nanômetros de espessura, capaz de revestir um objeto tridimensional e torná-lo invisível para uma frequência determinada de luz. Essa “pele” representa um avanço sobre os chamados “mantos de invisibilidade” já criados, dizem os autores, por sua pouca espessura e volume. Ela é flexível, capaz de acomodar pontas e arestas, e tem potencial para ser ampliada.

Assim como os demais mantos, a pele é um metamaterial, nome dado a materiais artificiais fabricados de modo altamente preciso, e que apresentam propriedades inexistentes na natureza. 

No caso, a pele nanométrica é recoberta de minúsculas antenas que fazem com que a intensidade da luz defletida pela superfície seja idêntica à da luz recebida. Desse modo, mesmo recobrindo um objeto tridimensional, a superfície interage com a luz como se fosse um espelho plano, tornando o objeto coberto efetivamente invisível. O teste descrito na Science foi realizado com um objeto 3D de 36 micrômetros de lado, e um feixe de luz com comprimento de onda de 730 nanômetros. 

 

Poluição sonora 
nos mares

A vida marinha precisa ser protegida contra a poluição sonora causada por atividades humanas como o deslocamento de navios e a prospecção de petróleo, adverte um grupo internacional de cientistas em artigo publicado no periódico Frontiers in Ecology and the Environment, publicado pela Sociedade de Ecologia dos Estados Unidos. Os autores chamam atenção especial para o uso de sinais sonoros intensos na busca por petróleo abaixo do leito marítimo, o chamado levantamento sísmico. 

“A expansão dos levantamentos sísmicos requer mais diálogo regional e internacional (...) dados indicam diversas causas de preocupação quanto aos impactos negativos do ruído antropogênico em diversas espécies marinhas”, diz o artigo. Entre os danos causados estão a interferência na comunicação dos animais, perturbação de comportamentos importantes e dano auditivo.

 

Morcegos 
valiosos

Os morcegos insetívoros prestam “serviços ambientais” no valor de mais de US$ 1 bilhão, anualmente, na proteção das lavouras de milho de todo o mundo, afirma artigo publicado no periódico PNAS. “Demonstramos que morcegos exercem uma pressão suficiente sobre as pragas para suprimir as densidades larvais e o dano nessa lavoura (...) demonstramos que morcegos eliminam o crescimento de fungos associado às pragas e a presença de toxinas de fungos no milho”, escrevem os autores, vinculados à Universidade do Sul de Illinois (EUA).

Para chegar a essas conclusões, os pesquisadores realizaram um experimento de campo, isolando alguns campos de milho à noite, a fim de impedir o acesso de morcegos, enquanto campos vizinhos permaneciam abertos. No fim, a abundância de larvas de uma praga do milho ficou 60% maior nos campos fechados. Também houve um aumento de 50% no dano sofrido pelo milho, por conta dos parasitas, nas áreas fechadas, e elevação na taxa de contaminação do milho por fungos e toxinas de fungos.

 

Novo membro da 
família humana?

Uma equipe internacional de pesquisadores anunciou, no início de setembro, a descoberta, numa caverna da África do Sul, de vestígios de pelo menos 15 indivíduos de uma espécie até então desconhecida do gênero Homo, batizada Homo naledi. “A morfologia cranial do H. naledi é única, mas similar a espécies primitivas de Homo, incluindo Homo erectus, Homo habilis e Homo rudolfensis”, diz um dos dois artigos que anunciam o achado, ambos publicados no periódico eLife.

Os ossos foram descobertos numa câmara virtualmente inacessível da caverna – o investigador principal do estudo, Lee Berger, usou redes sociais para recrutar espeleologistas pequenos e magros o suficiente para penetrar a abertura – o que leva à especulação de que o H. naledi tinha o hábito de buscar locais seguros para sepultar os mortos, um comportamento sofisticado e, até agora, desconhecido nessa etapa da evolução.

A descoberta foi apresentada ao mundo por meio de uma ampla operação de mídia – com a divulgação de material abundante para a imprensa quase ao mesmo tempo em que os artigos técnicos eram publicados – mas foi recebida com certa cautela por parte da comunidade científica. Alguns cientistas criticaram a ausência de uma datação dos fósseis, e outros questionaram a inclusão imediata da espécie no gênero Homo.

 

Apelo à 
interdisciplinaridade

A revista Nature da última semana traz uma seção especial sobre a necessidade de mais pesquisas interdisciplinares, unindo as ciências naturais e humanas. “Para resolver os grandes desafios que a sociedade enfrenta”, diz o texto de apresentação, “cientistas e cientistas sociais precisam trabalhar juntos”. A apresentação reconhece, porém, que “pesquisas que atravessam fronteiras acadêmicas são mais difíceis de financiar, executar, avaliar e publicar”. 

Um dos artigos da seção, assinado por Rick Rylance – presidente dos Conselhos de Pesquisa do Reino Unido – diz que os órgãos internacionais de fomento precisam de mais informações sobre o impacto da pesquisa interdisciplinar, e faz uma lista das dificuldades técnicas envolvidas na formatação desse tipo de estudo.

“Os protocolos gerais de um artigo científico e de uma peça de pesquisa em humanidades são muito diferentes”, escreve Rylance. “Trata-se tanto de como se expressar quanto da forma em que a proposta é formulada. Descobri que é fácil ser ‘artístico’ demais para o cientista e ‘científico’ demais para o pesquisador de artes”.