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Baixar versão em PDF Campinas, 28 de setembro de 2015 a 04 de outubro de 2015 – ANO 2015 – Nº 639Extratos inibem oxidação de alimentos, demonstra estudo
Quatro compostos naturais retardam degradação de produtos cárneosOs extratos de uva, de chá verde, de mate e de alecrim mostraram um importante desempenho antioxidante em alimentos como hambúrguer bovino, suíno, de frango e naqueles produzidos com 100% de carne de frango mecanicamente separada. Até 60 dias, esses extratos conseguiram inibir mais de 80% da oxidação lipídica, reação que diminui o tempo de vida e o valor nutritivo dos produtos, podendo gerar compostos nocivos à saúde. Foi o que sinalizou estudo de mestrado de Camila de Souza Paglarini realizado na Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA).
A pesquisadora estudou esses quatro extratos comerciais por ser uma tendência atual a reformulação de produtos cárneos com a adição de compostos naturais, pela sua capacidade antioxidante – a qual retarda a degradação do alimento. Ela também avaliou esses extratos porque as indústrias de ingredientes e aditivos já têm disponíveis diversos deles, que podem ser adicionados aos produtos cárneos. Seu objetivo foi testar a eficiência dos extratos disponíveis no mercado.
Conforme Camila, as aplicações dos extratos podem ser muitas e, na indústria, há diferentes categorias de produtos cárneos. “No nosso caso, fizemos uma introdução inovadora porque ainda não há uma regulamentação quanto ao uso desses produtos. Entretanto, como são ingredientes naturais, a indústria pode pleiteá-los junto ao Ministério da Saúde para elaborar seus registros.”
A expectativa de Camila, que é engenheira de alimentos, é trazer para os órgãos legislativos brasileiros a possibilidade de elaborar produtos cárneos mais saudáveis e de estar regulamentando o uso dos extratos. “Serão necessários mais estudos sensoriais, mas estamos mostrando aqui que é possível adotá-los”, constata.
O projeto da mestranda iniciou com o emprego de extratos naturais como antioxidantes em diferentes produtos cárneos. A atividade foi realizada entre 2013 e 2014 no Laboratório de Carnes e Derivados da FEA. O motivo? É que as reações da oxidação lipídica, além de reduzir a qualidade desses produtos, torna-os ranços, com perda de sabor e alteração de cor, o que contribui para a redução da sua vida de prateleira.
O uso de aditivos sintéticos hoje não é mais desejado pelo consumidor e nem pela indústria, que almeja colocar em seus produtos apelos mais favoráveis, diminuindo a vilania que repousa sobre os produtos cárneos.
Os extratos avaliados nesse estudo mostraram que podem colaborar para reduzir o uso dos aditivos sintéticos, no caso os antioxidantes. “O hambúrguer foi o alimento escolhido para ser investigado, por ser um veículo capaz de empregar ingredientes naturais que possuem potencial antioxidante e por ser amplamente consumido e aceito pela população, principalmente nas cadeias de fast-food”, relata Marise Aparecida Rodrigues Pollonio, professora da FEA e orientadora do trabalho.
HAMBÚRGUER
Na fase de testes, os hambúrgueres foram processados, como ocorre comumente no setor industrial. “Trabalhamos também com um produto muito interessante que ainda não é tão disponível no mercado, porém que tende a crescer – o hambúrguer pré-cozido”, conta a docente.
Esse produto já vem pronto, embalado, congelado e pode conter em sua formulação até 30% de carne de frango mecanicamente separada, uma matéria-prima extremamente suscetível à oxidação lipídica. Ainda que ela aumente o valor agregado, produz muita instabilidade com relação à qualidade.
Marise comenta que essa oxidação envolve um conjunto de reações químicas catalisadas por oxigênio, luz, calor, presença de metais e componentes da própria formulação. E tem como veículo os ácidos graxos poli-insaturados, presentes na matéria-prima cárnea.
A carne para fazer esses produtos contém proteína, gordura e umidade como componentes mais destacados. Essa gordura, que a compõe naturalmente, colabora para aumentar a tendência à oxidação lipídica.
“Quando aquecemos um produto e o consumimos imediatamente, ele tem o sabor desejado. Se consumimos esse produto horas depois, o sabor fica alterado provavelmente por causa da oxidação. Esses produtos são congelados após o processamento, pré-cozidos ou aparecem na forma de produtos frescais”, descreve a professora.
Só que, durante o congelamento, as reações não param. Então é possível que o consumidor faça a compra do produto e vá elaborar seu hambúrguer quase próximo do prazo final de validade. Até lá, esse produto já poderá ter ficado rançoso, alterado e com menor suculência. “Isso é oxidação lipídica. Essa reação precisa ser inibida ou reduzida”, alerta Marise.
Embora as reações de oxidação sejam muito comuns em vários sistemas metabólicos, elas também podem interferir prejudicando a saúde humana. Alguns desses intermediários da oxidação lipídica são compostos tóxicos que podem criar ligações cruzadas com as proteínas.
Esse fenômeno é menos grave do que a perda sensorial desse produto. “Mas, ao reduzir ou inibir a oxidação lipídica nos produtos cárneos, também temos como efeito a melhora do produto em relação à saúde”, observa a orientadora.
EXTRATOS
De acordo com Camila, em geral as pessoas procuram adquirir produtos cárneos para um consumo mais rápido, na era do fast-food. A sua matéria-prima é a carne, mas tais produtos contêm ingredientes como os aditivos, que podem melhorar a sua vida de prateleira e a sua qualidade sensorial bem como nutricional.
“Dentre os produtos cárneos, vários já vêm prontos e são de rápido consumo, como a salsicha e a mortadela, amplamente consumidas pela população mundial. Elas tanto têm uma conservação quanto uma vida de prateleira longa e maior, não precisando ser conservadas congeladas”, garante Camila. Isso se deve à formulação e a vários aditivos utilizados.
No caso do hambúrguer, na rotulagem, a indústria aponta quatro meses de conservação em freezer (-12ºC). Contudo, a conservação doméstica em congelador vai até dois meses de vida de prateleira, por ter uma temperatura menor: no máximo -10ºC.
A mortadela, por exemplo, pode ter um tempo um pouco maior porque contém antioxidantes e conservantes como o nitrito e o ascorbato, que estendem um pouco mais a sua vida útil. Já, em se tratando do hambúrguer congelado, não é permitido adicionar esses compostos. É o caso também dos empanados e dos nuggets. Eles também não devem ser conservados por prazo superior a 60 dias. Poderiam até ter uma vida de prateleira maior, não fosse a alteração do sabor.
Não existe um histórico anterior do desempenho dos compostos comerciais. “Essa talvez seja a maior contribuição do trabalho de Camila – o uso dos extratos naturais comerciais. Outros estudos mais comumente realizados baseiam-se na obtenção das matérias-primas naturais e extração em laboratório”, expõe a professora.
“Ocorre que, do ponto de vista industrial, isso é muito complicado. Muitas empresas oferecem seus extratos com o apelo de ser antioxidantes, mas será que são mesmo? Qual seria o desempenho desses extratos comerciais?”, indaga Camila. “Por isso testamos diferentes extratos”, responde.
Numa primeira etapa, foram testados mais de dez extratos. A mestranda optou pelos que apresentaram maior potencial antioxidante. “Encontramos resultados muito positivos contra a oxidação lipídica, estendendo a vida de prateleira, com menos ‘problemas’ em relação à qualidade”, diz a pesquisadora.
Esses extratos substituem os aditivos sintéticos, que possuem diversas limitações. A tendência ao uso dos antioxidantes de ingredientes naturais é muito forte mundialmente e é ditada pela Europa, país onde fazem isso de uma maneira competente em uma série de produtos.
Uma dona de casa vai servir para os seus filhos um lanche. O hambúrguer é uma matriz. As mesmas aplicações encontradas para ele podem ser recomendadas para os empanados, para os reestruturados e para as almôndegas. “Esses produtos, pelo pré-cozimento, aumentam muito a estabilidade à oxidação lipídica. Agregando-se um extrato natural, eles elevam a vida de prateleira desse produto, melhorando sua imagem diante dos consumidores”, revela Marise.
Nas pesquisas, carne processada e in natura O Laboratório de Carnes e Derivados da FEA tem duas linhas de pesquisa principais. A linha pela qual Marise Pollonio é responsável trata do processamento de produtos cárneos de modo geral e, de modo específico, a reformulação de produtos cárneos. Conforme a docente, atualmente os produtos cárneos sofrem uma grande pressão de diferentes órgãos, seja da saúde, dos próprios consumidores, da mídia, por serem ricos em gordura e apresentarem alto teor de sal. Desta forma, a carne vem sendo associada, via de re-gra, à ocorrência de algumas doenças crônicas. Reformular os produtos cárneos para torná-los mais saudáveis, entendendo os fenômenos e conseguindo explicar isso para o consumidor, faz parte da estratégia dessa linha de pesquisa, que consiste em melhorar a estrutura desses produtos cárneos sem que eles percam a sua identidade e qualidade. Outra linha desse laboratório envolve a qualidade da carne. Ela trabalha com diferentes espécies de carnes in natura, principalmente a bovina. Essa linha discute por exemplo maciez, textura, cor e sabor de alimentos, e a influência das condições de abate. |
Publicação
Dissertação: “Utilização de extratos comerciais derivados de plantas em produtos cárneos: avaliação da atividade antioxidante”
Autora: Camila de Souza Paglarini
Orientadora: Marise Aparecida Rodrigues Pollonio
Unidade: Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA)