Edição nº 673

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 24 de outubro de 2016 a 06 de novembro de 2016 – ANO 2016 – Nº 673

Baixa proteção pode comprometer
Reserva de Morro Grande

Floresta é um dos maiores e últimos remanescentes da Região Metropolitana de São Paulo

Uma investigação recente desenvolvida na Unicamp pela geógrafa Sueli Aparecida Thomaziello apontou baixos graus de proteção no entorno da Reserva Florestal de Morro Grande, um dos maiores e últimos remanescentes florestais da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP). Conforme a pesquisadora, isso pode comprometer, ao longo do tempo, a área, que incorpora mananciais responsáveis pelo abastecimento de cerca de 400 mil habitantes da RMSP.

O trabalho desenvolvido por Sueli Thomaziello investigou a qualidade ambiental das chamadas zonas de amortecimento da reserva. As principais conclusões do estudo apontam, em geral, que estas áreas não cumprem suas funções de filtrar os impactos negativos das atividades que ocorrem nos limites da reserva. O estudo analisou as zonas de amortecimento de seis municípios paulistas que se relacionam com a Reserva: Cotia, Embu das Artes, Itapecerica da Serra, São Lourenço da Serra, Vargem Grande Paulista e Ibiúna.



Conforme a estudiosa da Unicamp, o pior resultado foi para Vargem Grande Paulista, seguido de Cotia. Ela informa que apenas 5% do município de Vargem Grande dá importância a funções das zonas de amortecimento correspondentes à preservação da biodiversidade, como polinização e hábitat. Além disso, o estudo apontou que a zona de amortecimento de Cotia não totaliza 8%, embora 93,9% da reserva esteja dentro da área do município.

Sueli Thomaziello explica que a efetividade da zona de amortecimento em Cotia é tão baixa que em apenas um quilômetro há uma ruptura da paisagem provocando a perda da proteção e do efeito do chamado tamponamento. “A partir de um quilometro, como é o caso de Cotia, a zona de amortecimento já não tem mais efetividade. Isso é muito pouco, não promove conectividade dos fragmentos florestais e hábitat. Se continuar assim, em pouco tempo, essa reserva estará bastante comprometida”, alerta a geógrafa.

Criada em 1979, a Reserva Florestal de Morro Grande possui uma área de 10.870 hectares (ha). Está situada na região do planalto atlântico, no alto da Serra de Paranapiacaba, distante a 34 quilômetros a leste da cidade de São Paulo. É administrada pela Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) por conta dos mananciais que abastecem o Sistema Produtor Alto Cotia, as represas Pedro Beicht e Cachoeira da Graça.

“As rodovias Regis Bittencourt (BR-116) e Raposo Tavares (SP-270) são os principais vetores de pressão urbana e industrial e do crescimento metropolitano em direção à Reserva. E a Reserva não conta com um plano de manejo capaz de orientar sobre a gestão dessa importante floresta urbana”, revela Sueli Thomaziello.

Os resultados da pesquisa desenvolvida por ela integraram tese de doutorado defendida em julho último junto a Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC). A pesquisa foi orientada pela professora Rozely Ferreira dos Santos, que atua no Departamento de Recursos Hídricos da Unidade.

Houve financiamento, na forma de bolsa concedida à pesquisadora, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Atualmente, Sueli Thomaziello é especialista em meio ambiente da Prefeitura Municipal de Campinas. No mestrado, também desenvolvido na FEC, a pesquisadora estudou o planejamento ambiental e a conservação de florestas urbanas, tomando como caso o fragmento Mata Ribeirão Cachoeira, localizada na APA (Área de Proteção Ambiental) Campinas (SP), outra categoria de manejo de Unidade de Conservação.

“A zona de amortecimento, por ser uma área externa às unidades de conservação, acaba sendo muito pouco estudada, quando são elaborados planos de manejo. Observamos, após a elaboração de vários processos de planejamento de áreas protegidas, que este estudo é fundamental na gestão destas áreas, principalmente nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, onde as áreas florestais estão desaparecendo”, fundamenta a geógrafa.

De acordo com ela, interferências diretas sobre a fauna e a flora de uma reserva são diretamente provocadas pelas atividades que ocorrem em sua zona de amortecimento. “Portanto, o conhecimento sobre isso é fundamental na proposição para adequada gestão destes territórios”, pontua.

Serviços ecossistêmicos

A pesquisadora da Unicamp explica que o estudo fez uso da chamada “abordagem de Serviços Ecossistêmicos”.  Este tipo de abordagem caracteriza-se por identificar os benefícios que a preservação e conservação da reserva trazem para o homem, por exemplo. Estes benefícios se traduzem, assim, em “serviços ecossistêmicos”.

“A concepção do serviço ecossistêmico é analisar funções e processos que ocorrem no meio, como a biodiversidade e a regulação do ar e da água, por exemplo. Neste caso, compreende-se que essas funções e processos trazem benefícios para o homem, ou seja, a água limpa, a floresta que pode ser polinizada pelos insetos, etc. Quando compreendemos que o homem usa dessas funções e processos, chamamos de serviços ecossistêmicos. E isso facilita na mobilização dos gestores públicos para a preservação”, explica.

Sueli Thomaziello informa que o seu estudo avaliou como os planos diretores dos seis municípios que evolvem a reserva incorporam os serviços ecossistêmicos no sistema municipal de gestão. A pesquisadora também analisou a paisagem por meio do mapeamento de fotografia aérea, obtendo resultados para o uso da terra e cobertura florestal.

Outros resultados

Para a maioria dos municípios pesquisados, os resultados obtidos sobre a contribuição de serviços ecossistêmicos em uma zona de amortecimento foram bastante preocupantes, segundo a autora do estudo. Sueli Thomaziello pondera que, entre os municípios avaliados, São Lourenço da Serra e Ibiúna foram os que apresentaram os melhores resultados.

“A principal conectividade com a Reserva Florestal do Morro Grande pode ser obtida com as áreas dos parques estaduais localizados ao sul e sudeste, mas para isso, os municípios de São Lourenço e Ibiúna deverão estabelecer estratégias mais eficientes de gestão - incentivar políticas de agroecologia, e investir na agricultura familiar e na redução de insumos e fertilizantes na zona de amortecimento. Para esses municípios, que possuem zoneamento em áreas rurais, políticas de gestão de valorização dos recursos hídricos em conservação da vegetação ciliar são essenciais e imprescindíveis”, ressalva.

A pesquisadora pondera ainda que estes municípios detêm uma pequena proporção de área da reserva florestal, o que acaba limitando, por exemplo, a possibilidade de conectividade e de formação de corredores ecológicos, importantes para a recuperação e movimento da biota.

São Lourenço da Serra possui apenas 3,8% da reserva em sua área e Ibiúna, menos de 1%. Itapecerica da Serra tem 1,2% e Vargem Grande Paulista, 0,6%. Embu das Artes não possui área sobreposta ou confrontante à reserva, mas está a apenas 500 metros, e com viários facilitando o acesso direto à área da reserva.

Para a autora do estudo, o seu trabalho demonstra a necessidade dos municípios ao redor da reserva de legislar especificamente sobre o assunto, visando, sobretudo, fortalecer a manutenção dos processos ecológicos essenciais e criar espaços adequados para a sobrevivência da flora e da fauna.

“Importante destacar que a Reserva de Morro Grande não possui até hoje um plano de manejo. Há uma série de ações e estratégias específicas que cada um desses municípios deveria fazer. Mas o fundamental envolve a questão da vontade política, ou seja, dos gestores priorizarem a preservação e manutenção da reserva.”

Publicação.

Tese: “Sustentabilidade Ambiental e Serviços Ecossistêmicos: uma estratégia para avaliar Zonas Amortecimento de Paisagens Protegidas – O Caso da Reserva Florestal do Morro Grande/SP”

Autora: Sueli Aparecida Thomaziello

Orientadora: Rozely Ferreira dos Santos

Unidade:Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC)

Financiamento: Capes