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Jornal da Unicamp
Baixar versão em PDF Campinas, 24 de outubro de 2016 a 06 de novembro de 2016 – ANO 2016 – Nº 673Testes mostram que consumidor aprova
salsicha com baixo teor de sal
Estudo desenvolvido na FEA avaliou formulação com redução de 50% de cloreto de sódio
Apenas uma única salsicha comercializada no Brasil pode ter, dependendo da formulação, entre 20% e 30% dos valores máximos diários de sal (cloreto de sódio) recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para uma dieta saudável. Conforme o órgão, a indicação diária para adultos não deve ultrapassar cinco gramas (g). Apesar de existirem poucos produtos embutidos como a salsicha com teores reduzidos de sódio, uma pesquisa da Unicamp demonstrou que potenciais consumidores aceitariam bem uma diminuição de sal nestes produtos.
O estudo conduzido junto à Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp avaliou a percepção de 120 consumidores com relação a dois tipos de salsichas: uma elaborada com carnes bovinas e suínas nobres e outra menos nobre, formulada com elevados níveis de carnes mecanicamente separadas.
Os dois produtos, especialmente desenvolvidos para o estudo, continham 50% de redução de cloreto de sódio, o equivalente a 1.25 gramas para uma porção de 100 gramas do alimento. Em média, uma salsicha tem entre 40 e 50 gramas. Os consumidores avaliaram sensorialmente os dois tipos de salsichas com redução de sal, comparando-os com o produto controle, formulado com teores de sódio similares aos praticados, atualmente, pela indústria para esse tipo de alimento (2.5 g/100g).
“Os resultados com os consumidores demonstraram que eles aceitam bem os produtos com teores reduzidos de sódio, sem diferenças significativas com relação ao produto controle. Ou seja, eles gostam da mesma forma das salsichas. Isso prova que a reformulação de produtos cárneos, como as salsichas, através da redução dos teores de sódio, é sim viável sob a ótica do consumidor”, revela a engenheira de alimentos Maria Teresa Esteves Lopes Galvão, autora do estudo que integrou sua tese de doutorado.
A autora da pesquisa esclarece que as formulações avaliadas são similares às encontradas comercialmente, com a diferença da redução de sal. Além da avaliação dos consumidores, a pesquisa contou com uma equipe sensorialmente treinada que estabeleceu uma caracterização dos produtos submetidos aos testes. “Os consumidores consideraram, inclusive, que os produtos com os níveis atuais de sódio são considerados sensorialmente salgados”, pontua.
O trabalho, conduzido junto ao programa de pós-graduação em Tecnologia de Alimentos da FEA, foi orientado pela professora Marise Aparecida Rodrigues Pollonio, que coordena linha de pesquisa sobre redução de sódio em produtos cárneos. Houve coorientação da pesquisadora Rosires Deliza, que atua na Embrapa Agroindústria de Alimentos, localizada na cidade do Rio de Janeiro. A estudiosa da Unicamp recebeu bolsa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) para a realização da pesquisa.
Maria Teresa Galvão informa que no Brasil os embutidos emulsionados como salsichas e mortadelas representam mais de 50% de toda a categoria de produtos cárneos industrializados. “São produtos consumidos por toda a população, independentemente da idade e da classe socioeconômica”, dimensiona.
Ela explica que os altos valores de cloreto de sódio observados nessa categoria de alimentos, associado ao elevado consumo, estão relacionados a uma série de doenças e agravos a saúde. As doenças e agravos mais comuns são hipertensão e distúrbios cardiovasculares, insuficiência renal, envelhecimento precoce, retenção de líquidos, osteoporose, alteração na taxa de colesterol, entre outras.
“Esse cenário despertou o nosso interesse para o desenvolvimento de projetos de redução de sal nestes tipos de alimentos. O objetivo do estudo foi compreender como o consumidor de produtos cárneos industrializados reage ao apelo de redução de sal. Avaliamos, sob essa ótica, diferentes rotas tecnológicas de redução de cloreto de sódio.”
A engenheira de alimentos observa que a redução dos altos teores de sal nestes produtos é bastante desafiadora para a indústria pelas funções tecnológicas e sensoriais desempenhadas pelo cloreto de sódio. Principal fonte de sódio, o cloreto de sódio apresenta, dependendo da característica do produto, importantes funções tecnológicas, como impacto na textura e na vida útil do alimento.
Maria Teresa Galvão acrescenta que, além de conferir o gosto salgado característico, o cloreto de sódio contribui para realçar o sabor global dos alimentos e suprimir a percepção do gosto amargo. Outras funções são a de promover saciedade e contribuição para o processo de salivação.
Sabor e maciez
A autora do estudo ressalta que são duas as características sensoriais que devem ser levadas em conta para a viabilidade e boa aceitação dos produtos com redução de 50% de sal: o sabor do tempero e a textura, expressa pela maciez e suculência do alimento. “Reduções de até 50% nos teores de cloreto de sódio nas matrizes cárneas estudadas não afetaram significativamente a qualidade global dos produtos”, ressalva.
Conforme Maria Teresa Galvão, os consumidores expressam as características intrínsecas esperadas para esse tipo de produto em basicamente quatro grupos: aparência (cor vermelha), aroma (tempero e defumado), sabor (apimentado, salgado e temperado) e textura (resistência à mordida, facilidade de mastigação e deglutição, maciez, suculência e arenosidade).
“Nós vimos que a data de validade, relacionada com o frescor do produto, e a maciez foram considerados itens atrativos ao consumidor. A textura lisa, sem a presença de partículas durante a mastigação, a maciez e o produto bem temperado foram consideradas características com maior poder para gerar satisfação.”
A pesquisadora da FEA também avaliou o uso de substitutos de sal associado à incorporação de ingredientes realçadores de sabor em uma matriz popular de salsicha, elaborada com elevado nível de carne. “Neste aspecto observou-se pouca contribuição dos ingredientes realçadores de sabor para a compensação da perda do gosto salgado e sabor característico, medido tanto por equipe treinada como por consumidores.”
Informações nutricionais
O estudo da FEA também revelou que os consumidores, embora saibam, de modo geral, dos efeitos nocivos do excesso de sal no organismo, desconhecem os níveis máximos recomendados de ingestão diária. Outro dado levantado pela pesquisa é que, no momento da compra, o público avaliado presta pouca atenção às informações sobre o conteúdo de sódio presente nos produtos cárneos industrializados.
“O processo de escolha na compra da salsicha é fortemente influenciado pela experimentação. Itens como declaração de ingredientes e conteúdo nutricional não são características normalmente observadas no momento da escolha do produto, com exceção do prazo de validade”, informa.
Por outro lado, segundo a autora do estudo, os consumidores avaliaram positivamente um eventual destaque para informações sobre sódio nas embalagens. “Portanto, é importante fazer um trabalho de divulgação dessas informações, no sentido de conscientizar os consumidores. Nossos resultados mostraram que é viável a redução de 50% do cloreto de sódio. Isso é possível tanto do ponto de vista da satisfação do consumidor quanto tecnológico, mas é importante atrelar tudo isso à comunicação e orientação."
Publicação
Dissertação: “Estratégias tecnológicas para redução de sódio em produtos cárneos emulsionados orientadas pela percepção do consumidor”
Autora:Maria Teresa Esteves Lopes Galvão
Orientadora:Marise Aparecida Rodrigues Pollonio
Coorientadora:Rosires Deliza
Unidade:Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA)
Financiamento: CNPq