Música popular e política são foco de debate em seminário internacional do IA

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A primeira mesa-redonda  do dia
A primeira mesa-redonda  do dia

“Havia uma utopia muito forte nos anos 1960, e que não era só do Brasil, de fazer transformações profundas na sociedade. Tanto que o próprio golpe de 1964 se autointitulou revolução, pois esse termo tinha uma legitimidade enorme. A ideia era que essa revolução fosse brasileira, cultural e que ela desse o seu recado para o mundo”, informou o sociólogo Marcelo Ridente, professor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH), ao abrir as discussões da mesa-redonda “Paradigmas e sentido das culturas populares” no Seminário Internacional Música Popular e Política: Presente e Passado.

O evento foi realizado nessa sexta-feira (5) no auditório do Instituto de Artes (IA), promovido pelo grupo de pesquisa Música Popular: História, Produção e Linguagem. Teve início no último dia 3 (quarta-feira) e encerra nesse sábado (6).

A fala de Ridente foi sobre a cultura política dos anos 1960 e as canções que ajudaram a entender o período. “Para pensar os anos 1960, eu escolhi as palavras chaves ‘revolução brasileira’, ‘ditadura militar’, ‘modernização’ e ‘indústria cultural’”, revelou ele, pelo fato delas fornecerem pistas a respeito do que aconteceu na música e na política nessa década. “É preciso lembrar que os anos 1960 eram um período de Guerra Fria e que estávamos à sombra da Revolução Cubana, que marcou muito todas as sociedades, particularmente as da América Latina e do Brasil."

Na música, criou-se um certo paradigma da canção engajada, que buscava ao mesmo tempo reafirmar uma cultura nacional popular autêntica e propor transformações sociais de fundo, fossem elas nacional-democrática ou socialista. De modo paradoxal, esse modelo acompanhou a indústria cultural no Brasil, colocando-se como uma das bases da produção fonográfica. Ela teve apoio da televisão, propaganda, música, entre outros elementos, mesmo que muitos dos envolvidos no trabalho cultural e intelectual se considerassem de oposição. Elegeu-se a música popular brasileira como um padrão de bom-gosto e distinção.

Algumas canções expressaram os alcances e os limites do paradigma da MPB de autores como Gilberto Gil e os irmãos Valle (Marcos e Paulo Sérgio). “Havia, no período, uma valorização política nas letras e, em grande parte, as músicas provinham de uma classe média que queria se aproximar do povo", ressaltou.

Público durante o seminário
Público durante o seminário

Ridenti analisou algumas músicas e constatou que a ditadura militar teve respaldo de várias canções para confirmar a sua ideologia. “Muitos artistas estavam envolvidos em contradições políticas, mesmo sem saber. Não raro, muitos deles chegaram a ser financiados por alguma agência do Estado", explicou. Ele disse ainda que muitas pessoas na década de 1960 podiam ter acesso à cultura no país, porém cultura de massa (através da indústria cultural). Só que essa relação com a cultura de massa era muito intrincada”, sublinhou.

Seminário
Segundo o professor do IA José Roberto Zan, coordenador do grupo de pesquisa  Música Popular: História, Produção e Linguagem, em parceria com o professor Antonio Rafael dos Santos, as pesquisas em música popular em geral tocam em questões políticas, sobretudo porque elas estão muito ligadas à vida cotidiana. “Nesse evento, trazemos uma relação mais direta entre movimentos populares, coletivos, de caráter político, e tentamos compreender por que a música está sempre presente nessas mobilizações, de qualquer tendência política.”

Até que ponto a música contribui para mobilizar sentimentos de comunidade, de grupo, e passa a ser elemento aglutinador? "Embora muitas vezes a música não precise ter em sua letra um teor político, pode haver uma ressignificação do conteúdo em determinados contextos, cumprindo esse papel de fortalecer, de criar sentimentos coletivos, comunitários, e contribuir para a mobilização e para as ações coletivas", acredita.

O professor Zan comentou que pesquisas recentes, como a apresentada pelo professor Oscar Hernandes na quinta-feira (4), tentam compreender, através de trabalho empírico, como determinados aspectos sonoros produzem efeitos psíquicos nas pessoas, colaborando para criar um sentimento de integração coletiva ou para produzir emoções diversas, como tristeza, alegria, euforia, otimismo, pessimismo ou medo. “A intenção de pesquisas desse tipo é procurar entender que efeito o material sonoro pode exercer no plano psíquico para produzir sentimentos tão diversos."
 

O sociólogo Marcelo Ridenti, professor do IFCH
O sociólogo Marcelo Ridenti, professor do IFCH

 

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Marcelo Ridenti durante seminário internacional

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Escritor e articulista, o sociólogo foi presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais no biênio 2003-2004