Fotografias órfãs inauguram projeto do Museu de Artes Visuais

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Lembranças desprendidas do antigo álbum, muitas vezes as fotografias de família estão à venda em feiras de colecionadores ou, em meio aos papelões recolhidos por catadores, são comercializadas por peso. Mas há quem proporcione pós-vida por meio da arte. É o caso de cinco artistas que expõem até 15 de dezembro na Galeria de Arte do Instituto de Artes (GAIA) a convite do Museu de Artes Visuais (MAV), ligado à Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários da Unicamp. A mostra inaugura o programa “Visibilidade das Pesquisas de Pós-Doutoramento – área de Artes & Humanidades”.

A fotógrafa Ana Lúcia Mariz adota fotos “sem família” e questiona o abandono dos álbuns. Na porta do prédio onde reside, a artista Estefânia Galvina recebe contribuição de catadores para recriar seu próprio álbum, com histórias fictícias. Já Iara Rolim, expõe a sequência “Para não esquecer”, inspirada na história do pai, com Alzheimer. A artista reúne fotografias da família até então esquecidas num armário da casa.

A convite de Fabiana Bruno, pós-doutoranda em antropologia do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp e integrante do Lagrima, elas compõem um grande painel com as artistas Estefânia Gavina, Ana Almeida e Elaine Pessoa. “Pensamos num grande painel sem ordem cronológica, hierárquica, temática justamente para sair deste universo particular (já que cada uma tem um tema) e gerar um grande álbum de família”, explica Fabiana.

“Quando fui outro”, de Ana Almeida, promove o questionamento sobre o lugar do outro.   Sua origem está ligada à série “Outros sonhos que comigo trago” e a um trabalho anterior chamado “Trepantes, sentantes e afins”.

“Paysages - Pequena Coleção de Paisagens-Sonho”, da artista visual Elaine Pessoa são imagens “nascidas de fundos de fotografias anônimas e do desejo de perturbar a figura do primeiro plano migram pela criação da artista, de um segundo plano carregado de tédio, de triviais registros de viagem, recordações ordinárias ou anotações científicas”, segundo Fabiana.

O novo programa do MAV tem como proposta dar visibilidade às atividades de pós-doutoramento de artes e humanidades, segundo a diretora Silvia Furegatti, pensando que uma das funções importantes de um museu universitário é promover pesquisa. “Como nossa expertise está muito vinculada à ideia do processo expositivo de documentos, objetos, trabalhos de arte, a proposta é que pesquisas de doutoramento se transformem em exposições que possam ser discutidas a partir desta composição. Por isso iniciamos este projeto com Fabiana Bruno, que é uma estudiosa ímpar da fotografia”, explica Silvia. 

Para Silvia, a GAIA é o melhor lugar expositivo da Universidade, mas o MAV ainda é um museu sem paredes, sem edifício, o que, segundo a professora, não inibe as iniciativas da nova direção de realizar exposições. “Pelo contrário, a composição que fazemos nesta diretoria só estimula a pensar outros espaços e lugares para fazer projetos que possam aquecer as ideias das artes visuais, da visualidade como um todo no âmbito universitário.” Segundo Silvia, por enquanto, as atividades acontecem por meio de convite, mas há expectativas de que em breve sejam a partir de convocatórias.

“Pensamos no museu como espaço laboratorial e, nesta medida, convidamos quem está fazendo doutorado, mesmo que não tenha imaginado que seu objeto tenha uma dimensão expositiva. Exposição é sempre uma forma de intervenção pública, um modo de reelaboração do próprio projeto. Se olharmos para o material que Fabiana traz, com autoras diferentes, como dão reúso para as imagens e este reúso das imagens as tira de uma condição privada, de certo tipo de afeto e as recoloca na causa pública e, ao fazer isso, elas ganham estatuto artístico”, acrescenta a professora Iara Lis, diretora associada do MAV.

Para a coordenadora da GAIA, professora Ivanir Cozeniosque, a parceria com a nova direção do MAV é bem-recebida, já que a galeria sempre apoiou as realizações do museu. “Tudo o que é novo é bem-vindo. Quanto mais dinâmica do conhecimento tiver, melhor.”

Paisagem precária
O lugar da arte também ganha reflexão na exposição na sala e da GAIA, com a exposição ‘Pedestres’, de Bortolozzo. Fotos produzidas na Alemanha na semana do Dia do Trabalhador, de 30 de abril a 3 de maio, mostram as estratégias para proteger fachadas de prédios. “A proposta é fazer um paralelo entre o efêmero e o precário no espaço urbano”, explica o artista. 

A apropriação do espaço urbano por comerciantes alemães, que armazenam alimentos em trailers, também foram registradas pelo artista para enriquecer a discussão sobre a precariedade. “O precário é aquilo que eu, artista, vou desfazer quando quiser, já o efêmero, desaparece num processo natural”. Sobre o bloqueio das fachadas, ele critica o fato de os proprietários intervirem no direito do trabalhador ao espaço urbano. “O direito é negado ao próprio trabalhador, que sustenta o sistema.”

Uma produção em aquarela permite refletir sobre a construção e ao mesmo tempo o caos imposto por uma obra pública. “Há lugares que as obras públicas são cobertas. No Brasil, isso é raro. A ideia é mostrar os diferentes comportamentos diante do precário”, explica Bortolozzo.

Thiago Bortolozzo
carro de alimentação, Alemanha
Fabiana Bruno
Exposição Pretéritas
Exposição Pretéritas
Exposição Pretéritas

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Escritor e articulista, o sociólogo foi presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais no biênio 2003-2004