O Hospital de Clínicas da Unicamp (HC) realizou em 2017 o maior número de transplantes anuais de sua história. Ao longo do ano passado, foram realizados 485 transplantes de diferentes órgãos. Em 2016 foram realizadas 351 operações do tipo, o que representa um aumento de 38% no ano seguinte. Desde 1984, quando foram realizados os primeiros três transplantes de rim, até dezembro de 2017, o Hospital de Clínicas realizou 6753 procedimentos de diferentes órgãos.
Quase todos os tipos de procedimentos cirúrgicos que envolvam doações de órgãos realizados no Hospital de Clínicas tiveram um aumento entre 2016 e 2017. Os transplantes de medula óssea passaram de 37 para 43, já os de rim aumentaram de 136 para 148. Foram realizadas 218 transplantações de córnea contra 123 no ano anterior, e os pacientes que receberam um novo fígado saltou de 47 para 70 de um ano para outro. Além desses casos, foram realizados mais seis transplantes de coração. O trabalho da Organização de Procura de Órgãos (OPO) do HC também superou o ano de 2016, com a realização de 371 notificações, chegando a 132 doadores efetivados.
Segundo a médica Ilka Boin, coordenadora dos transplantes hepáticos do HC, o aumento de 48% no número de transplantes de fígado é reflexo tanto do trabalho desenvolvido no hospital quanto da possibilidade de aumentar a captação de órgãos no Estado de São Paulo. “Com esse aumento pudemos aumentar o número de transplantes, podendo diminuir a mortalidade em lista de espera”.
A preocupação em aumentar o número de transplantes sem perder a qualidade também é ressaltada da professora Marilda Mazzali, responsável pela área de nefrologia do HC. Os transplantes de fígado ultrapassaram a meta estabelecida para o ano com oito cirurgias a mais, sendo 140 com doadores falecidos, e apenas oito originário de doador vivo. "Com esse aumento de transplantes de doadores falecidos, diminuímos mais de 30% a lista de espera. O tempo na fila de espera era de quatro anos, e agora a média de espera é de dois anos, sendo que em alguns tipos de casos a lista está zerada".
O aumento do número de cirurgias também colabora para diminuir a mortalidade em lista de espera do SUS, tanto com a rapidez quanto em poder oferecer uma melhor qualidade de vida no pós-operatório aos pacientes transplantados. Isso reflete da diminuição do tempo de internação e de casos de complicação.
Capacitação de profissionais
Além da assistência para a população, os transplantes de órgão no HC são espaços de capacitação para médicos, enfermeiros e outros profissionais a partir dos programas de residência e especialização. A maior parte dos profissionais capacitados pelo HC da Unicamp atua em outros serviços de saúde, colaborando para a formação e realização de procedimentos em unidades hospitalares de outras cidades e estados. “Os residentes saem aptos para iniciar a captação, fazendo com que tenham mais doadores e alcançando regiões mais distantes”, explica Ilka Boin.
O HC é um dos hospitais que mais realizam transplantes no Brasil, e o aumento está ligado diretamente ao aumento nas notificações e captações. A Organização de Procura de Órgãos se destaca como uma das melhores equipes multidisciplinares de avaliação e validação de doadores de órgãos em São Paulo.
As equipes de captação avaliam e acompanham doadores por via terrestre até 300 quilômetros de distancia por meio de veículos fornecidos pela Secretaria de Estado da Saúde. Acima dessa distância, o deslocamento é realizado por via aérea.
Quando um doador saudável é localizado mas por algum motivo não possa ser aproveitado por pacientes do HC, o órgão é enviado para outras entidades hospitalares ligadas ao sistema. Em 2017 foram disponibilizados com 22 corações e 18 pulmões para a realização de transplantes em outros hospitais.
Qualidade de vida
O aumento do numero de transplantes também é reflexo de uma maior conscientização de familiares sobre a importância das doações. Mesmo assim o número de recusas familiares de potenciais doadores ainda está por volta de 40%. "A doação é o ponto inicial desse processo, e isso começa na sociedade. Quem recebe de volta a gratificação da doação é a própria sociedade”, avalia o neurologista Luiz Antonio da Costa Sardinha, coordenador da OPO.
Para Luiz Antonio Sardinha, o sistema de transplante são modelo exemplar dentro do SUS de justiça social, com fila única e registro centralizado. "O receptor sabe onde está na fila, pois o sistema de transplante no Brasil é transparente e facilmente auditado. Quando você comemora um transplante, você comemora que a sociedade deu a ela mesma o direito de melhorar sua qualidade de vida”.
Um dos casos de transplantes recentes realizados no HC é do aposentado Carlos Roberto de Paiva, de 55 anos, que se recupera na enfermaria do hospital de seu segundo transplante recém realizado.. Em 1996 ele precisou receber um novo rim, doado pelo seu irmão vivo. Após a cirurgia realizada no próprio Hospital de Clínicas, Carlos Roberto passou quatorze anos tendo uma vida normal, até que o rim doado apresentou complicações.
Depois de quase oito anos realizando tratamentos para a cura de hepatite e outros problemas de saúde, Carlos Roberto voltou para a fila e após dois meses recebeu um novo rim, de doador falecido. “Tenho que agradecer aos familiares que autorizaram a doação, e que continuem fazendo isso. Muitas pessoas terão melhora de sua qualidade de vidas com os transplantes”.