Premiado pela Fundação Rockefeller, o professor da Unicamp Jonatas Manzolli embarca neste domingo (18) para o Bellagio Center, na Itália. Selecionado entre artistas, pensadores, pesquisadores e ativistas de todo mundo, Manzolli participará de um programa de residência de um mês, durante o qual deverá iniciar o desenvolvimento de sua nova ópera Pássaros de papel e colocá-la em debate com os demais participantes. “É um espaço de conversa entre pessoas cujos projetos olham para questões da atualidade e buscam produzir mudanças no pensamento político e social a partir da arte, da política e dos estudos humanos”, contou o professor.
Entre os selecionados estão Dikgang Moseneke, juiz sul-africano que trabalhou junto a Nelson Mandela na luta contra o colonialismo e o apartheid; Jody Heymann, decana da Escola de Saúde Pública e diretora fundadora do Centro de Análises Políticas da Universidade da Califórnia; e Jan Schaffer, jornalista ganhadora do prêmio Pulitezer pelo Philadelphia Inquirer. O chamado da Fundação Rockefeller financia projetos artísticos e acadêmicos que “promovam o bem-estar da humanidade”. A proposta do Bellagio Center é ser um local para o desbloqueio de ideias, avanço do conhecimento e ativação de soluções. (Leia mais)
Pássaros de Papel
O embrião da ópera, cujo libreto deverá ser escrito Jonatas Manzolli durante sua estância no Bellagio Center, surgiu em 2015, com a perturbadora imagem da criança refugiada encontrada em uma praia na Turquia. “Aquele menino parecia estar derretendo, como se fosse de papel. Fiquei muito chocado. A situação dos refugiados é uma tragédia humana e eu precisava escrever sobre isso”, lembrou.
Matemático e compositor, Manzolli trabalha na interface entre a matemática computacional e a música. Neste projeto, pretende refletir sobre os fluxos migratórios e a sensação de pertencimento e identidade de imigrantes e refugiados. “Pássaros de papel vai falar sobre o processo migratório usando os pássaros como visão poética das migrações e a imagem do Tsuru (pássaro de origami) como símbolo de uma busca pela paz universal”, explicou.
Segundo o autor, a ópera terá como base o livro Macunaíma, de Mário de Andrade. Sem se prender a seus aspectos narrativos, contará a história a partir do fluxo de consciência do leitor contemporâneo. “Macunaíma é um migrante. Ele saiu da Floresta e foi para São Paulo. Mas como seria um leitor de Macunaíma hoje tendo como realidade a crise dos refugiados?”, questiona. Manzolli pretende investigar para escrita da ópera as sensações e reflexões contemporâneas que o livro provoca. “Macunaíma, que era preto retinto, se banha numa poça d'água e fica branco. Depois seu irmão vermelho. Cada um fica de uma cor diferente. O que significa essa mudança da cor da pele para o leitor atual? A música vai tentar trazer em som esse processo de identificação e mudança”, contou.
Além da investigação temática, narrativa e musical, Manzolli trabalhará com sensores de movimento, pesquisa que desenvolve do Núcleo Interdisciplinar de Comunicação Sonora (Nics), desde 1996. “Eu vou tentar capturar os sinais fisiológicos dos cantores e fazer com que eles modifiquem as imagens produzidas computacionalmente. As imagens seriam como um mapeamento, uma descrição do fluxo de consciência de cantores cantando sobre essa questão”, explicou.