Os benefícios da amamentação exclusiva não se limitam somente aos nutrientes encontrados no leite materno. Eles se estendem a diversos benefícios protetores para a saúde do bebê e para a criação de um vínculo afetivo que se estabelece entre mãe e filho. A amamentação prolongada poderia prevenir mundialmente 823.000 mortes a cada ano em crianças menores de cinco anos e 20 mil mortes por câncer de mama. O incentivo ao aleitamento materno faz parte das ações do Hospital da Mulher - Caism desde que foi criado, em 1986. O Hospital é referência para a população da macrorregião de Campinas, onde vivem mais de três milhões de pessoas, distribuídas em 20 municípios.
O Caism dispõe de uma maternidade para atendimento aos casos de maior risco e tem procurado apoiar as campanhas que encorajam a amamentação, por reconhecer o seu valor para a saúde e a qualidade de vida do neonato. A Semana Mundial de Aleitamento Materno e, mais recentemente, a Campanha Agosto Dourado, que visa à divulgação dos diferentes aspectos da amamentação para toda comunidade e usuários, são iniciativas que ganharão ainda mais destaque na Unicamp no mês de agosto, quando serão desenvolvidas várias atividades. Veja a programação. A neonatologista do hospital, Mônica Pessoto, que há anos estimula a discussão deste tema, fala a seguir sobre o aleitamento materno em entrevista concedida ao Portal da Unicamp.
Portal da Unicamp - Qual é a ênfase da Semana da Amamentação e do Agosto Dourado?
Mônica Pessoto - Desde 1992, a primeira semana de agosto é dedicada à promoção do aleitamento materno em 120 países do mundo. A cada ano, a Waba (Aliança Mundial para Ação em Aleitamento Materno) define o tema a ser abordado e lança materiais em vários idiomas, que podem ser adaptados de acordo com as características de cada país. No Brasil, o Ministério da Saúde coordena a Semana Mundial de Aleitamento Materno (SMAM) desde 1999. A semana tem o apoio de organismos internacionais, Secretarias de Saúde Estaduais e Municipais, Rede Brasileira de Bancos de Leite Humano, Hospitais Amigos da Criança, Sociedades de Classe e Organizações Não Governamentais (ONGs). Desde o ano passado, a campanha foi ampliada com a Lei Federal nº 13.435, que instituiu agosto (Agosto Dourado) como o mês do aleitamento materno, com o objetivo de intensificar ações intersetoriais de conscientização e esclarecimento sobre a importância do aleitamento materno, com a realização de palestras e eventos, divulgação na mídia, reuniões com a comunidade, ações de divulgação em espaços públicos, e iluminação ou decoração de espaços com a cor dourada. Com esse acréscimo, ficou ainda mais fortalecida outra importante estratégia de mobilização social em prol da amamentação no país. O Caism também ampliou as iniciativas a favor da amamentação, dando-lhes uma maior visibilidade durante todo o mês de agosto.
Portal da Unicamp - O que o hospital programou para o Agosto Dourado?
Mônica Pessoto - Além da tradicional decoração especial da área da recepção antiga do hospital, teremos a mesa redonda “Aleitamento materno: a base da vida, uma visão multiprofissional” com as participações de obstetra, neonatologista, nutricionista, enfermeiro e fonoaudiólogo. Cada um discutirá aspectos de sua especialidade na amamentação. Outra atividade, nas salas de grupo dos ambulatórios, envolverá rodas de conversa com gestantes e equipe multiprofissional. Serão abordados assuntos como as vantagens do aleitamento materno, pega, posicionamento na amamentação, mitos e verdades, e esclarecimento de dúvidas das gestantes.
Portal da Unicamp - Quais os benefícios do aleitamento exclusivo para a mãe? E para a criança?
Mônica Pessoto - A literatura tem inúmeras pesquisas comprovando, com forte evidência científica, os benefícios do aleitamento materno tanto para a criança como para a mãe, isso em países de baixa, média e alta renda. Investigações recentes apontam que o leite materno protege contra doenças infeciosas, em especial diarreia, infecções respiratórias e otite; diminui internações por infecções; traz melhor nutrição com menor risco de sobrepeso e obesidade; protege contra diabetes e má-oclusão dentária e sugere melhor inteligência da criança que recebe o leite materno. Para as mulheres que amamentam, há proteção contra o câncer de mama, aumento do intervalo entre os partos, diminuição do risco de câncer de ovário e diabetes tipo 2.
Portal da Unicamp - Até quando o aleitamento deve ser encorajado?
Mônica Pessoto - A recomendação da OMS, Unicef e Ministério da Saúde para a amamentação é de que ela seja exclusiva nos primeiros seis meses e complementada com alimentos saudáveis até os dois anos ou mais de idade.
Portal da Unicamp - Como o Caism aborda a amamentação?
Mônica Pessoto - Ele atua com a promoção, proteção e apoio à amamentação desde o pré-natal, tanto com informações individuais como em grupo, sobre as vantagens da amamentação para a mãe, criança ou família, produção do leite materno, manutenção da lactação e amamentação; na sala de parto, a equipe auxilia a colocar o recém-nascido junto à mãe, proporcionando o primeiro contato olho a olho, pele a pele, estimulando a sucção do peito durante a primeira hora de vida; no alojamento conjunto, a mãe é apoiada e informada durante a sua internação sobre aspectos do aleitamento materno, pega, posicionamento, sinais de fome, livre demanda, extração do leite da mama.
Portal da Unicamp - Como fica a amamentação de uma mãe que não deseja o filho?
Mônica Pessoto - Nos casos de adoção da criança, a mãe biológica recebe medicação para inibir a lactação e é oferecida à mãe adotiva a opção da lactação adotiva. Caso seja a escolha da nova mãe, são colhidos os exames para verificar a possibilidade de amamentar, é dado todo apoio e feito acompanhamento da amamentação.
Portal da Unicamp - Existem impedimentos à amamentação?
Mônica Pessoto - Em poucas situações, a amamentação é formalmente contraindicada. É o caso de doença materna grave, como infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV), vírus T-linfotrópico humano (HTLV), câncer com necessidade de quimio ou radioterapia e crianças com erro inato do metabolismo (grupo heterogêneo de defeitos genéticos). O uso de drogas ilícitas também contraindica a amamentação, seja pela passagem das drogas pelo leite, seja pelo risco de perda de controle sensorial da mãe, que pode colocar em risco a segurança da criança.
Portal da Unicamp - O Caism recebe doações de leite?
Mônica Pessoto - Sim. Temos um banco de leite humano desde 2004, com atividades de auxílio às mães com dificuldades de amamentar, às mães que têm bebês internados na unidade neonatal e no processamento do leite humano, garantindo a oferta de leite seguro em termos microbiológicos e adequado em termos nutricionais para os recém-nascidos internados na Neonatologia.
Portal da Unicamp - Como é feita a doação de leite?
Mônica Pessoto - O banco de leite do Caism não tem estrutura para buscar o leite doado nas residências, mas as mulheres que têm disponibilidade, e condições clínicas para fazerem a doação, são bem-aceitas. Para doar o leite, a mãe deve estar amamentando seu filho e doar o leite excedente de maneira voluntária e gratuita.
Portal da Unicamp - Qual deve ser o perfil da doadora?
Mônica Pessoto - Ela deve ser saudável, não estar usando medicações que coloquem em risco a saúde da criança, não usar drogas ilícitas e álcool, não fumar mais do que dez cigarros por dia e ter sorologias negativas (nos últimos seis meses) para HIV, sífilis, hepatite B, hepatite C, Chagas e HTLV. Se as mulheres têm essas condições, elas recebem orientações de como fazer a coleta, armazenamento e transporte do leite. Também recebem todo o material necessário para a doação. Caso necessária a realização de alguma sorologia, a coleta de sangue é efetuada no próprio banco de leite.
Portal da Unicamp - Se a mãe não pode amamentar e tem que oferecer o leite em pó, o que essa criança perde em termos nutricionais?
Mônica Pessoto - O leite materno é um fluido biológico complexo que, ao contrário da fórmula infantil, que é padronizada dentro de uma faixa muito estreita de composição, tem como característica uma composição dinâmica que varia dentro de uma mesma mamada, ao longo do dia, fase da lactação e entre mães e populações. O leite humano é adequado para o lactente humano, tanto em sua composição nutricional quanto nos fatores bioativos não nutritivos que promovem a sobrevivência e o desenvolvimento saudável. Dentre estes fatores bioativos, incluem-se células, agentes anti-infecciosos e anti-inflamatórios, fatores de crescimento e prebióticos, os quais não são encontrados nas fórmulas infantis.
Portal da Unicamp - Mães com próteses de silicone podem ter alterações na quantidade ou na qualidade do leite?
Mônica Pessoto - A qualidade do leite da mãe que tem prótese de silicone não é alterada, porém pode haver, em algumas situações, comprometimento na quantidade de leite produzida por essas mulheres, muito devido às técnicas de mamoplastia empregadas pelo cirurgião. Umas são consideradas mais fisiológicas que outras.
Portal da Unicamp - Aleitamento e amamentação podem ser usados como sinônimos?
Mônica Pessoto - Apesar de soarem como sinônimos, amamentação e aleitamento materno têm algumas diferenças do ponto de vista científico. Amamentação é o ato da nutriz (pessoa que amamenta) dar o peito e o lactente (bebê) mamá-lo diretamente, ao passo que aleitamento materno é toda maneira do lactente receber leite humano ou materno e o movimento social para a promoção, proteção e apoio a esta cultura.
Assista a um vídeo do Ministério da Saúde sobre amamentação e doação de leite.