Após alguns meses de trabalho junto à Divisão de Geologia Planetária do Centro de Ciências do NASA Jet Propulsion Laboratory (JPL), tive a oportunidade de conhecer mais de perto as demais instalações. Isso se deu graças ao convite de Max Florian Schwandner, geocientista alemão que atua no JPL há vários anos e que nos convidou para uma visita guiada pelo campus.
Inicialmente, é interessante destacar que o JPL tem uma longa história, que é anterior à da própria NASA. O Laboratório surgiu em meados década de 1930 em função do interesse de um grupo de engenheiros do California Institute of Technology (CalTech) pela então nascente tecnologia de propulsão a jato, que deu origem aos aviões a jato e foguetes. Esse grupo fazia experiências no campus principal do CalTech, situado próximo ao centro da cidade de Pasadena, Califórnia, que envolviam explosões. Depois de uma delas ter causado um grande susto, o grupo foi proibido pela direção do CalTech de continuar a realizar essas experiências no campus principal. Elas foram então transferidas para uma área então deserta, situada no sopé das Montanhas São Gabriel, na época bem distante de locais habitados e que hoje é parte da cidade de La Cañada-Flintridge (embora ainda seja associada à cidade de Pasadena). Assim nascia o campus do JPL que, com a criação da NASA em 1958, foi por ela assimilado e se tornou o principal centro de pesquisas da recém-criada agência espacial norte-americana, sendo operado pelo CalTech. Atualmente o JPL, com seus mais de seis mil cientistas, engenheiros e técnicos, tem mais de duas vezes o tamanho do CalTech, que tem apenas cerca de 500 docentes e pouco mais de dois mil alunos.
Como se pode inferir pela quantidade de pessoas que aqui trabalham, o número e a diversidade de projetos desenvolvidos é igualmente muito grande. Atualmente, o foco principal dessas atividades está na ampliação do conhecimento sobre corpos planetários do Sistema Solar e também sobre outros sistemas planetários. Ao mesmo tempo, o Laboratório mantém um conjunto significativo de atividades voltadas ao monitoramento ambiental da Terra.
O nosso tour iniciou pelo Laboratório de Montagem de Espaçonaves, onde está em curso a fase de integração e testes da espaçonave e dos equipamentos da Missão Mars 2020. Essa missão planeja colocar na superfície de Marte, em meados do próximo ano, um novo “jipe” (rover). Os objetivos científicos da missão são bastante ambiciosos: investigar a possibilidade de ter existido, no passado, vida em Marte e a eventual identificação de bio-assinaturas preservadas em materiais geológicos. O jipe irá também coletar, ao longo de sua rota, amostras do regolito e de rochas que ficarão aguardando para futuramente serem recolhidos por outra missão e trazidos para a Terra, onde serão analisados em detalhe. O local escolhido para o pouso e para as coletas é a cratera de impacto meteorítico denominada Jezero, com cerca de 50 km de diâmetro. Essa cratera exibe evidências geológicas de ter sido um lago no passado, associado a possível depósito de delta em leque rico em argilas. Esse lago seria contemporâneo à formação das redes de canais visíveis em boa parte da superfície de Marte e pode conter informações muito valiosas do ponto de vista astro-geológicos e astro-biológicos.
A próxima parada foi no campo de testes dos rovers de Marte, que procura simular as diferentes condições e obstáculos que os veículos irão encontrar na superfície daquele planeta. Ali há uma réplica totalmente operacional do rover Curiosity, apelidada de “Maggie”, usada para replicar movimentos do rover verdadeiro operando em Marte e, eventualmente, resolver problemas quando a Curiosity ficar detida em algum obstáculo.
Passamos também por vários laboratórios de acesso restrito apenas aos pesquisadores que neles atuam diretamente, alguns com nomes curiosos, como por exemplo “Laboratório de Simulações de Materiais Extra-terrestres”!
O tour seguiu com uma visita àquela que talvez seja a área do JPL mais conhecida do público em geral, que é o Centro de Operações de Vôos Espaciais, também conhecida como Centro de Controle das Missões. Esse local é aquele que aparece na mídia quando ocorre, por exemplo, um pouso planetário de uma das missões, como ocorreu no final de novembro de 2018, com o pouso da missão Insight em Marte. Esse centro funciona ininterruptamente, enviando comandos para todas as missões atualmente em operação e recebendo os respectivos dados coletados pelas mesmas.
O encerramento da visita foi no Museu do JPL, que contém informações e equipamentos de todas as missões da NASA em que o Laboratório esteve envolvido, assim como réplicas em tamanho real de espaçonaves como a Voyager e Galileo.
Essa visita representou uma oportunidade única de observar e sentir a ciência planetária de ponta em pleno desenvolvimento. A impressão que fica ao visitante é que os desafios colocados aos que trabalham no JPL são enormes, assim como são grandiosos os resultados que vêm sendo obtidos na conquista das fronteiras espaciais cada vez mais distantes. Enfim, uma experiência única e emocionante!
* O autor é professor titular de Geologia do Instituto de Geociências da Unicamp e se encontra atuando como pesquisador visitante junto ao Jet Propulsion Laboratory, CalTech/NASA, na Califórnia, EUA.