Biobanco é uma espécie de biblioteca de material biológico que permite investigar a origem de doenças, sua evolução e fatores que contribuem para o sucesso do tratamento. Pesquisas com esse suporte, sobretudo em Oncologia, possibilitam uma avaliação mais específica sobre o câncer, colaborando para pesquisas relacionadas a um diagnóstico e tratamento mais eficazes.
Esse é um grande avanço pois as investigações são iniciadas com material coletado no biobanco com maior tempo de seguimento e pode-se avaliar DNA, microRNA, metabólitos e outros potenciais biomarcadores a partir de amostras de sangue e tecido de mulheres com câncer de mama e ovário, por exemplo. É o que vem fazendo a Divisão de Oncologia do Hospital da Mulher - Caism, ao disponibilizar o seu biobanco a pesquisadores. Com isso, o hospital tem alcançado avanços significativos, colocando pesquisas de ponta a serviço das mulheres, revela a docente da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) e médica do Caism Sophie Derchain.
Um dos objetivos dos pesquisadores é detectar marcadores de resistência ao tratamento neoadjuvante e a drogas antineoplásicas como a doxorrubicina e o taxol. Alguns estudos envolvem o uso de sangue de mulheres antes e depois da quimioterapia ou hormonoterapia neoadjuvante (tratamento sistêmico anterior ao tratamento cirúrgico ou radiações). Outros utilizam tecido fresco congelado e parafinado.
Vários trabalhos de pós-graduação vêm sendo desenvolvidos no Biobanco do Caism da Unicamp, na linha de pesquisa de marcadores biológicos para identificação da resposta ao tratamento em mulheres com câncer de mama. Luciana Rezende estuda microRNAs que podem ser marcadores de quimiorresistência para identificar mulheres que não responderam bem aos quimioterápicos, mas que são boas candidatas a uma melhor estratégia de tratamento. Marcella Cardoso realiza análises metabolômicas no soro e em tecidos de pacientes com câncer. Elas podem desvendar a reprogramação das vias metabólicas envolvidas na resistência à quimioterapia.
Andreia de Melo Porcari avalia o perfil metabólico das células do câncer de mama. Raquel Peres, orientanda do professor Luís Sarian, superintendente do Caism e coordenador do biobanco, compara, no momento, características genéticas no sangue e tecido de mulheres americanas e brasileiras com câncer de mama, procurando diferenças na evolução e resposta ao tratamento em cada país.
Esses estudos, comenta Sophie, buscam identificar, entre as mulheres com câncer de mama, quais se beneficiarão do tratamento já padronizado e quais, ao não responderem ao tratamento, poderão ter acesso a novas drogas ou a novos esquemas de quimioterapia. Nesta linha, o grupo publicou um artigo na revista Scientific Reports sobre a expressão dos microRNAs em cultura de célula. Outra publicação foi feita no início do ano no International Journal of Molecular Science – uma revisão de metabolômica.
Além das pesquisas com câncer de mama, o grupo estuda o câncer de ovário. Amanda Ferracini e Guilherme Aires, sob orientação de Priscila Mazzola e Sophie, em parceria com Carmen Silvia Passos, procuram polimorfismos relacionados à resistência a drogas no sangue das pacientes. Guilherme Ayres avalia resposta à quimioterapia, toxicidade e sobrevida em mulheres com carcinoma de ovário. Já Amanda Canato Ferracini analisa polimorfismos associados também com resposta à quimioterapia e toxicidade. Todos estes projetos são financiados pela Fapesp.
Contribuições
Uma paciente com câncer de mama submetida à quimioterapia antes da cirurgia tem, hoje, 15% a 45% de possibilidade de ter uma resposta patológica completa, eliminando a doença na mama e axila. Em longo prazo, esse prognóstico se traduz em cirurgias menores e em aumento de sobrevida.
De acordo com Sophie, atualmente a mulher com câncer de mama pode passar por diferentes tratamentos para diminuir o tamanho do tumor antes da cirurgia, como quimioterapia, terapia-alvo (tratamento atua diretamente nos alvos relacionados a crescimento tumoral por exemplo) ou hormonoterapia (tratamento que suprime hormônios para evitar crescimento de tumores). Em todas essas áreas, avançam as pesquisas graças a novas drogas e a novos esquemas com drogas mais conhecidas em cânceres que eram tratados de outra forma. O câncer triplo negativo de mama, em geral tratado com doxorrubicina, ciclofosfamida e taxol, agora também é tratado com carboplatina.
A contribuição do biobanco, nesse caso, está em guardar material de mulheres que fazem hormonoterapia para, caso surja novidade em termos de tratamento futuro, seja aproveitado o material já armazenado. Se identificado um microRNA ou um metabólito capaz de mostrar se a mulher, ao passar pela quimioterapia, terá uma ótima resposta, já se consegue saber antecipadamente se os efeitos colaterais da quimioterapia justificarão a realização do procedimento. Por outro lado, para as pacientes não responsivas ao tratamento, as quimiorresistentes, um caminho é procurar novas drogas para obter uma resposta patológica completa.
Biobanco
A médica patologista Geisi Russano, responsável pelo Laboratório de Patologia do Caism, sede do Biobanco, explica que os tecidos avaliados ficam ali armazenados por tempo indeterminado. Essa é uma coleção com amostras de sangue e tecido congeladas a -80º C que é gerenciada por um software que faz uma conexão entre os pesquisadores que atuam no biobanco. Deste modo, esses profissionais conseguem saber exatamente o que aconteceu com determinada paciente. Com o consentimento dela, a coleta de material biológico pode ser feita, e o estudo prosseguir sem a sua presença.
Atualmente, o Caism tem 10.630 amostras armazenadas, entre sangue e tecido. Só na área de Oncologia são 848 amostras de tecidos de pacientes. A maioria dessas pacientes tem sangue armazenado, que chega a um total de 8.038 amostras. “Quando falo de tecido congelado, refiro-me a tecido mamário e à placenta, pois o biobanco também contempla pesquisas da área de Obstetrícia", informa Geisi. “Em breve, teremos ainda amostras de ovário.”
O Biobanco do Caism é o primeiro biobanco da Unicamp aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep). A Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP), da Unicamp, também tem um biobanco credenciado pela Conep. Já o primeiro biobanco do Estado é o do Hospital do Câncer "A.C. Camargo".
Leia, a seguir, texto publicado no Jornal da Unicamp, explicando como é o trabalho realizado por pesquisadores da área de Obstetrícia, outra frente que reúne diversas investigações no Biobanco do Caism.
Um banco de pesquisa (e da vida)