Relação entre pesquisa, ciência e comunicação deve ser estreitada, analisa André Fonseca

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“A comunicação não é um ornamento na vida da ciência, mas um elemento indispensável”, define o professor do Centro de Educação, Comunicação e Artes (CECA) da Universidade Estadual de Londrina (UEL), André Azevedo da Fonseca. Ao se debruçar sobre 300 portais de instituições públicas de ensino superior, o docente constatou a necessidade de encarar a divulgação científica como serviço público, estreitando a relação entre universidade e sociedade. 

Para André, a comunicação nas universidades tem lacunas significativas, que precisam ser trabalhadas para aproximar a sociedade dessas instituições. A Unicamp, na análise realizada por ele e por estudantes envolvidos na pesquisa, é uma das exceções, com um portal que trabalha a comunicação de uma forma mais organizada e diversificada. Para falar sobre o estudo e sobre estratégias de comunicação, o professor esteva na Universidade ontem (16) e concedeu entrevista abordando a temática de ciência, pesquisa e comunicação. Confira:

André da Fonseca, professor do Centro de Educação, Comunicação e Artes (CECA)
"Vimos que as universidades falam muito para si mesmas, se comunicam muito mal com o público", diz André

Como você chegou a esse tema e por que se interessou em realizar uma pesquisa voltada para portais de universidades?

Eu fiquei uma temporada no exterior como professor visitante na Universidade Complutense de Madri e quando eu cheguei ao Brasil eu percebi que havia uma amplificação das hostilidades em relação às universidades. Em conversa com alunos, nós decidimos criar esse projeto, como uma iniciativa para apoiar as assessorias de imprensa. Para isso, nós deveríamos consultar um a um os sites das instituições públicas de ensino superior, que são 300, para verificar como trabalhavam com a divulgação científica. Nós percebemos uma grande carência, lacunas na comunicação e vimos que as universidades falam muito para si mesmas, se comunicam muito mal com o público e não divulgam o que há de melhor, que são as pesquisas realizadas pelos professores e estudantes. 

Qual foi o diagnóstico dessa análise realizada?

Nós vimos, em primeiro lugar, que falta muita informação sobre pesquisas. As assessorias tendem a noticiar muitos elementos que dizem respeito a questões internas das universidades. Fala-se muito sobre os editais, sobre homenagens aos dirigentes, fala-se de questões técnicas muito internas e que não são de interesse da sociedade em geral. Nós vimos também que a abordagem de temas acadêmicos nem sempre são necessariamente feitos através do viés da divulgação científica. Quando um professor apresenta um trabalho num congresso, esse ato em si recebe mais relevância do que o assunto que o professor está discutindo neste congresso, servindo mais de coluna social do que como uma forma de explicar para o público as inovações que o professor está desenvolvendo. Essa falta de hierarquia, essa dimensão muito mal resolvida entre assuntos internos e assuntos de interesse público é uma das características mais importantes que nós identificamos nesses sites.

Uma boa estratégia de comunicação pode auxiliar na valorização das instituições de ensino junto ao público externo?

Há muitos fatores que fazem com que o público tenha vários tipos de ressentimento em relação às universidades. A comunicação é uma das etapas, uma das dimensões desse diálogo entre as universidades e a população, mas é claro que não é o único. Há muitas outras dimensões da universidade para que esse diálogo ocorra de forma mais eficiente e mais próxima mas, em relação à comunicação, algumas mudanças de paradigmas podem ser importantes, como, por exemplo, assumir que um dos papéis relevantes da assessoria de comunicação é prestar um serviço público. Se as assessorias encararem, continuarem encarando ou fortalecerem esse papel de prestar serviço público, levando as informações ou traduzindo-as e correspondendo às necessidades do público, é um dos caminhos possíveis e complementares para melhorar a relação entre público e as universidades. Não é o único, mas é importante. 

Como fazer com que a comunicação universitária seja encarada não só como uma comunicação feita para o meio acadêmico mas também para a população que não tem acesso ao ambiente universitário?

Existe uma discussão muito importante sobre preconceito linguístico do Marcos Bagno que explica com clareza que nós podemos ser poliglotas na nossa língua. Determinados ambientes exigem uma determinada linguagem. Se o acadêmico não é capaz de dialogar em uma linguagem daquela comunidade, o problema não é da comunidade, mas do acadêmico que não soube adaptar o seu vocabulário, a sua sintaxe, a sua forma de falar, o tom de voz, os gestos, as imagens. Então fazer extensão, inclusive na concepção freiriana, em um livro importante chamado Comunicação ou Extensão, diz respeito a essa habilidade em dialogar de acordo com a linguagem do público com que você está se comunicando.

André da Fonseca, professor da UEL
Na pesquisa coordenada por André, o portal da Unicamp é classificado como uma das exceções, cumprindo o papel de difusão das pesquisas realizadas na Universidade

A capacidade de compreender a linguagem dos mais diversos públicos e produzir conteúdos que correspondam a essas linguagens é um exercício que não é feito com muita frequência, porque a universidade se restringe muito à linguagem formal, que é uma das linguagens possíveis. Vai exigir muito estudo, muita coragem para descobrir outras formas de comunicação popular e poder realmente falar com o público que tem a universidade com uma instituição absolutamente distante ou invisível, apartada da sua vida. Se esse status faz bem para as elites universitárias, de serem interpretadas como semideuses, faz muito mal para a relação entre a universidade sociedade. Para quebrar isso é preciso fazer uma reflexão profunda sobre as linguagens utilizadas para poder se comunicar com o público. 

Qual a importância dos profissionais de comunicação nas instituições de ensino?

Há um mito de que comunicação qualquer um é capaz de fazer desde que saiba falar e escrever. Não é verdade. Existem técnicas complexas, estudos que demonstram o que funciona e o que não funciona e os jornalistas são de fato as pessoas mais preparadas para poder desenvolver trabalhos de comunicação eficientes entre a universidade e o público. Hoje, talvez, essa crise tenha feito com que os dirigentes tenham ficado mais atentos em relação à comunicação, até para perceber que a comunicação não é um ornamento na vida da ciência, mas um elemento indispensável para fazer com que a sociedade conheça melhor os cientistas, que decida investir mais na ciência, que perceba a importância e apoie politicamente as universidades. A comunicação, mais do que nunca, é um dos elementos indispensáveis e cruciais da gestão de qualquer universidade. Universidades que compreendem o papel da comunicação no seu desenvolvimento conseguem mais recursos, mais aprovação social e isso cria um círculo virtuoso de ações de investimento e pesquisa.

Qual o diferencial dos portais que a pesquisa elencou como exceções e como identificaram a comunicação feita pela Unicamp?

A Unicamp faz um excelente trabalho, a gente vê materiais muito diversificados e o site tem uma organização muito favorável para encontrar as informações. Os destaques e as pesquisas são evidentes, é visível desde o primeiro momento a vitalidade da pesquisa na Unicamp por conta da visibilidade que o site promove para essa produção científica. Outras universidades nem sempre privilegiam, ou melhor, raramente privilegiam a pesquisa. Há muitas matérias de interesse meramente protocolar, notícias e releases de interesse interno e que acabam não contribuindo para a disseminação de ciência num contexto mais amplo. Não é a toa que Unicamp é muito reconhecida internacionalmente, claro que por sua qualidade de ensino e pesquisa, mas também por conta dos processos de comunicação.

 

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"Vimos que as universidades falam muito para si mesmas, se comunicam muito mal com o público", diz André

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Escritor e articulista, o sociólogo foi presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais no biênio 2003-2004