O ingresso na universidade é apenas uma das etapas enfrentadas por estudantes durante a trajetória acadêmica. Após a matrícula, os desafios seguem e, sem suporte material e pedagógico, as chances do sucesso acadêmico diminuem. Dessa forma, concebe-se a permanência estudantil como uma das políticas necessárias para a democratização dos espaços universitários. Com a compreensão da importância destes mecanismos, a Unicamp realiza, entre 21 e 22 de outubro, o II Congresso de Projetos de Apoio à Permanência de Estudantes de Graduação.
O evento, explica Helena Altmann, coordenadora do Serviço de Apoio ao Estudante (SAE) “é pensado a partir do princípio de conceber a permanência como princípio de equidade e democratização da universidade”. Além do debate sobre a permanência, o Congresso abarca um espaço de formação para os estudantes bolsistas, o que, conforme aponta a coordenadora, propicia também o retorno à sociedade em relação ao que é produzido através do investimento público em bolsas. Na apresentação de pôsteres, foram 268 trabalhos inscritos, com 965 autores distribuídos entre os projetos, realizados nas mais diversas áreas do conhecimento.
A abertura do evento contou com a participação da coordenadora geral da Unicamp e reitora em exercício, Teresa Atvars, que destacou a importância de visibilizar o importante trabalho realizado pelo SAE. Após, ocorreu a mesa “Trajetórias de Formação: Contribuições dos Programas de Permanência Estudantil”, conduzida pela pró-reitora de Graduação, Eliana Amaral. Participaram do debate as professoras Helena Altmann, do SAE; Rosana Hering, coordenadora do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Educação Superior da UFRJ; Mirza Ferreira, doutora em Educação e graduada em Dança pela Unicamp, e a estudante de Midialogia da Unicamp, Larah Camargo.
Antes da mesa, houve apresentação do Projeto Rosa, grupo de seis estudantes contemplados pelo Aluno-Artista, programa que tem como objetivo incentivar as produções culturais e artísticas dos discentes da Unicamp. O sexteto apresentou canções da cantora e compositora bahiana Rosa Passos.
Democratizar o ingresso e garantir a permanência
Em 2019, o investimento destinado pela Unicamp às políticas de permanência alcançou R$84.773 milhões, representando um aumento de 22% em relação a 2017. Os recursos são distribuídos entre 6.884 bolsas (auxílio social, auxílio transporte, entre outras), subsídio alimentação, moradia estudantil, atendimentos médicos e odontológicos. Para a coordenadora do SAE, o aumento dos investimentos acompanha uma mudança no perfil dos ingressantes na Universidade, com uma comunidade acadêmica que vem se tornando mais representativa ao perfil da sociedade brasileira.
“A Unicamp é uma instituição pública e também se propõe a ser um espaço democrático e organizado enquanto tal. Nesse sentido, precisa acolher a população brasileira em sua diversidade de renda, racial, entre outras. As políticas de permanência na Unicamp seguem em consonância com as políticas de ingresso, que vêm já há bastante tempo favorecendo a entrada de pessoas de menor renda na universidade”, explica Helena. Para ela, estas políticas são fundamentais para que os alunos possam seguir o percurso acadêmico, garantindo sua formação.
A pró-reitora de Graduação, Eliana Amaral, também destaca a relação entre as políticas de permanência e a diversificação das possibilidades de ingresso, que contemplam modalidades para estudantes oriundos de escolas públicas, cotas étnico-raciais e vestibular indígena, além de ingresso de refugiados e de medalhistas.
“Esse processo de diversificação se acompanha de uma mudança do padrão socioeconômico dos nossos alunos: 50% vêm de escolas públicas e 36% da turma que entrou em 2019 é de pretos e pardos. Isso tornou a universidade bem mais diversa e, ao mesmo tempo, a necessidade do apoio fica ainda mais evidente. Então nós temos trabalhado para aumentar o número de possibilidades de bolsas”, aponta. A pró-reitora também pontua que a preocupação com a permanência na Unicamp não é nova. O SAE, por exemplo, possui 43 anos, e a moradia estudantil, que possui 911 vagas, foi inaugurada em 1990.
Pôsteres visibilizam produção de bolsistas
A apresentação de pôsteres de projetos ligados às bolsas auxílio-social, auxílio-estudo/formação e programa aluno-artista lotou o Ginásio Multidisciplinar na tarde de segunda-feira (21). Um dos trabalhos, entre os 268 inscritos, foi o projeto “As cores da cidadania: higienização, catalogação, digitalização e processamento documental dos clubes negros do interior de São Paulo (1897-1952)”. Além de estudantes, o trabalho integra docentes e técnicos do Arquivo Edgard Leuenroth (AEL) da Unicamp e vêm possibilitando um resgate da memória associativa da comunidade negra, no período pós-abolição.
“O projeto visa resgatar o associativismo e dar memória aos grupos. A gente percebe que eles tinham muita força quando associados e não ficavam apenas nas suas associações. Existem muitas cartas das associações se comunicando a criando vínculos muito fortes, discutindo não só o preconceito, mas questões de formação e de trabalho”, destaca o estudante Diego Malta.
Além da relevância social, o projeto também possibilita que os alunos tenham contato com todas as etapas relacionadas à recuperação de acervos, como a higienização, a restauração e a digitalização. Uma das docentes orientadoras, a historiadora Silvia Lara, professora do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFICH), explica que o projeto possui múltiplas dimensões. “Existe uma função social para dentro da universidade, na permanência dos estudantes, e para fora, na preservação de acervos de interesse acadêmico e social, pois são clubes e associações ligados ao combate ao racismo no Brasil”.
Silvia também pontua que a permanência possui um sentido mais amplo no projeto, já que integra estudantes que têm um interesse na cultura negra e afro-brasileira, área para a qual a Unicamp se abriu para acolher, e possibilita uma vivência que não hierarquiza saberes. “Há uma troca que é fundamental na vida dos estudantes, e isso faz parte da permanência, não só permanência financeira, mas do espírito universitário”.
Além das pesquisas, os pôsteres também expuseram os projetos de extensão dos quais participam os estudantes. Adilce Ferraz, aluna de Tecnologia em Saneamento Ambiental (campus Limeira), por exemplo, explicou como funciona o Pré-Vestibular Colmeia, curso para estudantes de baixa renda e oriundos de escolas públicas que é realizado através de parceria da Unicamp com a prefeitura do município. “É um cursinho pré-vestibular para aqueles que estão querendo ingressar na universidade e já ajudou muita gente a concretizar esse sonho”, explica.
A estudante, que é monitora no Colmeia, ingressou na Unicamp no primeiro semestre de 2019, através do vestibular indígena, e considera a permanência fundamental. “Eu venho do Amazonas, não tenho família perto para poder ajudar e as bolsas são esse auxílio e suporte mais concreto”.
Oficinas
O II Congresso de Projetos de Apoio à Permanência de Estudantes de Graduação segue até o fim da tarde de hoje (22), com as oficinas temáticas.