Para Mozart Ramos, universidade precisa ter maior protagonismo na educação básica

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Mozart Ramos, diretor do Instituto Ayrton Senna e membro do Conselho Nacional de Educação
Mozart Ramos, diretor do Instituto Ayrton Senna e membro do Conselho Nacional de Educação

A universidade deve eleger como prioritário e estratégico o tema da educação básica, reduzindo seu distanciamento dos problemas da escola e contribuindo de maneira ativa para a melhoria desse setor no Brasil, defendeu nesta quarta-feira (23) o educador Mozart Neves Ramos, diretor de Articulação e Inovação do Instituto Ayrton Senna e membro do Conselho Nacional de Educação (CNE). Professor emérito da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde foi reitor entre 1996 e 2003, Mozart participou da terceira conferência do ciclo “A Crise Brasileira”, realizado pelo Instituto de Estudos Avançados (IdEA), no Auditório da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp.

“Se nós perdermos a visão sistêmica do valor da educação básica, estaremos dando um tiro no pé o tempo inteiro, e é impressionante como a universidade não vê isso”, criticou o educador, graduado em Engenharia Química pela UFPE e doutor em Química pela Unicamp. Ao discutir o tema “A Crise da Educação”, sugeriu ampliar a cooperação entre Estados e municípios, melhorar a gestão e ampliar o financiamento da educação, cobrando das autoridades das diversas esferas de poder a aplicação correta dos recursos.

Para Mozart, o Brasil precisa buscar modelos e estratégias bem-sucedidas de municípios de pequeno e médio porte que, muitas vezes com verbas escassas, obtêm resultados surpreendentes, com o objetivo de inspirar melhorias em outros locais do país. Segundo ele, cidades como Cocal dos Alves, no Piauí, e Sobral, no Ceará, podem contribuir para essa busca de soluções.

No diagnóstico que fez sobre a crise educacional, o diretor do Instituto Ayrton Senna citou o grave problema da evasão escolar que impede o cumprimento de metas de formação, tanto no Ensino Fundamental quanto no Ensino Médio, afastando o Brasil cada vez mais de indicadores dos países desenvolvidos. “De cada cem crianças que entram no Ensino Fundamental, só 50 concluem o Ensino Médio. E o mais grave é que, se fizermos uma conta rápida, hoje o Brasil perde, por reprovação e abandono escolar, R$ 27,5 bilhões.”

Em sua conferência, Mozart apresentou também dados sobre a agenda de aprendizagem e os parcos números apurados pelo Ministério da Educação (MEC). Em 2017, apenas 29% dos alunos haviam aprendido o que era esperado em língua portuguesa ao concluir o Ensino Médio. Em matemática, nas últimas duas décadas, a curva é descendente, chegando ao patamar de apenas 7% dos estudantes sabendo o conteúdo esperado ao final desse ciclo. 

 

Carlos Vogt, presidente do Conselho do IdEA, Mozart Ramos, diretor do Instituto Ayrton Senna, Teresa Atvars, reitora em exercício, e Paulo Markun, jornalist
Carlos Vogt, presidente do Conselho do IdEA; Mozart Ramos, Teresa Atvars, reitora em exercício, e Paulo Markun, jornalista


Exemplos dentro do Brasil 
Além da experiência como gestor universitário, tendo sido presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) entre 2002 e 2003, Mozart também foi secretário de Educação de Pernambuco (2003-2006), presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (2006) e presidente executivo do Todos Pela Educação (2007-2010). Desde 2018, ele é membro do CNE, posição que também ocupou entre 2005 e 2014.

Mozart citou o exemplo de Pernambuco e destacou que a descontinuidade política criou dificuldades na gestão da educação pernambucana, mas ressaltou que o Estado conseguiu saltar da 21ª colocação, em 2007, para o primeiro lugar, em 2015, no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB). Segundo ele, Pernambuco tem atualmente metade das escolas em tempo integral, o que representa a maior rede do Brasil. “Nós tínhamos um per capita aluno, em 2000, de R$ 2.100 por ano na Educação Básica. Hoje, está em R$ 6.300, nós triplicamos. Tem que ter mais dinheiro? Sim, porque, se formos comparar com o PISA [Programa Internacional de Avaliação de Estudantes], com os países da Comunidade Europeia,o per capita aluno é muito maior. Mas, não é só dinheiro, tem que melhorar a gestão”, afirmou, exemplificando com dados de financiamento em âmbito nacional.

Diálogo e pluralidade
Ele criticou a falta de norte do atual governo federal na área da educação e declarou que, para não ficar “refém” de disputas ideológicas, é necessário apresentar novas ideias e propostas para avançar. Mozart comentou o fato de ter recebido e aceitado um convite, em 2018, para assumir o MEC do governo Jair Bolsonaro, mas foi assertivo ao dizer que percebeu que a iniciativa não teria êxito. Apesar da oferta, houve um recuo posteriormente e seu nome acabou sendo vetado para a pasta.

Sobre sua carreira como gestor da educação, disse valorizar a pluralidade de opiniões na busca de um “bem maior” à comunidade. “Eu nunca fui filiado a partido nenhum e sempre tive posições muito claras sobre aquilo que acredito para a sociedade. Procuro ter diálogo de A a Z e procurei sempre tirar de cada um o que poderia ser melhor para a sociedade. Alguns me criticam por isso, outros me elogiam.”

Na conclusão da conferência, o educador sugeriu a criação de políticas de fomento dentro da universidade para um papel mais assertivo na educação básica do país, alegando serem insuficientes as metas de produção científica e inovação tecnológica. “Para mudar o Brasil, temos que ter uma ação estratégica, principalmente em uma época em que não temos um Ministério da Educação que deveria coordenar a política. Agora, mais do que nunca, nós precisamos ter as universidades, principalmente aquelas que têm a liderança no país, como a Unicamp e a USP, para poder ter esse papel de protagonismo nacional. Porque, caso contrário, ficaremos em um grande vazio, em um grande vácuo, e o custo disso vai ser muito maior no futuro.”
 

Teresa Atvars, coordenadora geral e reitora em exercício da Unicamp, na mesa de abertura
Teresa Atvars, coordenadora geral e reitora em exercício da Unicamp, na mesa de abertura


O evento contou também com a participação da coordenadora geral e reitora em exercício da Unicamp, Teresa Atvars, do presidente do Conselho Científico e Cultural do IdEA, Carlos Vogt, e do jornalista Paulo Markun, responsável pela mediação do evento. “A Crise Brasileira” é uma iniciativa que visa a trazer nomes importantes de distintas áreas do conhecimento para a Unicamp como forma de estimular a discussão de temas atuais em busca de diagnósticos e soluções para as diversas crises que afligem a vida do país.

A primeira conferência ocorreu no dia 18 de setembro, com o economista Luiz Gonzaga Belluzzo discorrendo sobre “A Crise da Economia”. Depois, o filósofo João Carlos Salles tratou do tema “A Crise da Universidade”, em 9 de outubro. Para novembro estão confirmadas palestras do diplomata Rubens Ricupero (“Relações Internacionais”, dia 6) e do advogado e ex-ministro da Integração Nacional Ciro Gomes (“Ciência e Tecnologia e Desenvolvimento”, dia 22). As inscrições para a conferência com Ricupero podem ser feitas no site do IdEA.
 

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A Crise Brasileira - Convite de Carlos Vogt

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Mozart Ramos, diretor do Instituto Ayrton Senna e membro do Conselho Nacional de Educação

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Escritor e articulista, o sociólogo foi presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais no biênio 2003-2004