Em parceria com a Federação Brasileira das Empresas de Consultoria e Treinamento (Febraec), a Unicamp realizou nesta quinta-feira (21) o evento "Inovações, Tecnologia e Regras Disruptivas no Sistema Financeiro Nacional". Ao longo das apresentações, os participantes discutiram sobre o atual cenário brasileiro e internacional do sistema financeiro e como o crescimento dos bancos digitais e fintechs podem contribuir com os desafios do mercado financeiro, dando a ele mais dinamismo e oferecendo aos consumidores novas oportunidades de crédito.
Participaram da abertura do evento o reitor da Unicamp, Marcelo Knobel; o presidente da Febraec, Rodnei Domingues; o secretário de desenvolvimento econômico, social e de turismo de Campinas, André Von Zuben; e Wagner Barbosa, vereador de Limeira. A palestra de abertura foi realizada por Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central dos governos Lula (2003-2010) e ex-ministro da Fazenda do gestão de Michel Temer (2016-2018) e atual secretário da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo. O encontro contou também com palestras ministradas por empresários e líderes do setor financeiro.
Em sua apresentação, Meirelles lembrou das experiências que teve à frente do BankBoston, nos Estados Unidos, comparando não apenas a estrutura do sistema financeiro norte-americano com o brasileiro, mas também a cultura econômica dos dois países. Segundo o secretário, o sistema brasileiro é conservador, uma das causas que levam a um dos principais desafios do setor a serem solucionados, que é a alta concentração bancária. De acordo com dados de 2018 do Banco Central, os cinco maiores bancos concentravam 81,2% dos ativos do país. De acordo com Meirelles, a pulverização de bancos e instituições financeiras menores, como ocorre nos Estados Unidos, aliado a um cenário de juros mais baixos, podem auxiliar também com a redução do spread bancário, que é a diferença entre os juros cobrados dos clientes pelos bancos e o custo pago por eles pelas movimentações financeiras. Essa concentração bancária, aliada a altas taxas de inadimplência dos consumidores, faz com que o spread brasileiro seja um dos mais elevados do mundo.
Meirelles afirma que o uso das novas tecnologias digitais pelo mercado provoca o fenômeno da desintermediação financeira, oferecendo aos clientes mais opções de bancos e empresas digitais que oferecem crédito e oportunidades de investimentos com juros mais baixos, competindo diretamente com os grandes bancos. "Isso está avançando muito e permite, lá na frente, que haja uma grande expansão do crédito e uma queda muito grande do spread e dos custos. Isso é uma tendência geral, hoje em dia as pessoas pegam transporte pelo celular, pedem comida, escutam música, fazem compras, assistem filmes, séries. Quase metade da população brasileira já tem acesso a smartphones. Tudo isso está avançando cada vez mais, o que inclui os bancos digitais", analisa o secretário.
Segundo ele, a participação das fintechs na concessão de crédito no país subiu de 5% em 2013 para 38% em 2018, enquanto a fatia representada pelos grandes bancos caiu de 40% para 28% no mesmo período, isso devido à diversificação do número de atores que participam no mercado de investimentos. Informações do Mapa de Fintechs do Brasil, elaborado pela Finnovation, mostra um crescimento de 34% do setor entre 2018 e 2019. Porém, ele alerta que a garantia de segurança dos dados de clientes tende a ser uma nova preocupação para essas instituições financeiras.
"Tudo que consegui na vida foi através da educação"
Meirelles também ressaltou que esse novo setor abre uma grande demanda por profissionais altamente especializados, que desenvolvam os aplicativos e demais recursos digitais e que saibam interagir com o mercado financeiro. Por isso, afirma que as universidades são fundamentais para a inovação tecnológica e o desenvolvimento das regiões que estão em torno delas. "Os países que estarão na ponta em tecnologia no mundo desse novo mercado serão os que têm uma melhor disponibilidade de o sistema educacional fornecer profissionais para participar desse setor. Não é por acaso que o Vale do Silício, onde foi desenvolvido todo o mercado de internet e tecnologia, esteja na Califórnia, junto da Universidade de Stanford. Isso mostra a grande sinergia que existe. Tudo isso é o que tenderá a acontecer certamente na região de Campinas com a Unicamp", comenta o secretário.
Ele também anunciou que o governo do Estado deverá investir na criação de espaços de trabalho compartilhados voltados especificamente para a criação de fintechs e empresas digitais do setor financeiro. O primeiro será na capital paulista, seguido de outros locais com o mesmo potencial. "São Paulo é o centro financeiro do país, representa cerca de um terço da economia nacional e é o maior mercado consumidor. Por isso está, cada vez mais, sediando esse grande mercado. Grande parte das fintechs está localizada em São Paulo, o governo do estado está criando uma área ao lado do IPT onde será um grande centro para o desenvolvimento de fintechs, com o suporte da secretaria de desenvolvimento, das Fatecs. Haverá incentivos para o desenvolvimento lá em São Paulo e estamos começando a estudar também isso na região de Campinas, que acho que tem um potencial enorme", revela Meirelles.
Professor da Faculdade e Engenharia Química (FEQ) e ex-diretor da Agência de Inovação da Unicamp (Inova), Milton Mori foi o responsável pela organização do evento. Ele comenta que a universidade tem tradição na criação de empresas e desenvolvimento de novos produtos e patentes e que esse potencial pode ser aproveitado também para o sistema financeiro. "O potencial é muito grande, vários bancos e fintechs estão entrando no meio. Tem vários alunos trabalhando nessa área, os aplicativos são imensuráveis, há bastante campo para ser aquecido", admite Milton.