O ator, diretor, produtor e dramaturgo Sérgio Mamberti atraiu um grande público ao auditório do Centro de Convenções da Unicamp nesta quarta-feira (11) para uma palestra sobre “A Crise da Cultura”, compartilhando sua experiência de seis décadas de carreira como artista, militante e gestor cultural. Durante o encontro, ele fez uma análise histórica das lutas da classe artística pela democratização da cultura e pela liberdade de expressão e definiu como essencial a mobilização da categoria contra os retrocessos em curso na esfera federal.
Apesar de se classificar como avesso ao pessimismo, Mamberti manifestou grande preocupação com o desmonte da cultura empreendido pelo governo Jair Bolsonaro. Rememorando sua trajetória desde a luta contra a ditadura militar instaurada pelo golpe de 1964, o ator vê paralelos entre o passado e o presente. “Essa mesma ameaça hoje está aqui, em um nível muito mais humilhante, porque ela se dá de um modo muito mais institucional, e hoje tem uma grande parcela da população que aderiu a esse processo”, lamentou, reafirmando a necessidade de resistência.
“A crise da cultura não é uma crise específica em relação à produção cultural, é uma crise cultural no sentido mais amplo possível. Então, temos que falar de cultura, educação e não podemos deixar de falar de comunicação, numa época em que ela assumiu essa importância estratégica a ponto de o governo se sustentar por Twitter”, avaliou.
Nascido em Santos (SP), em 1939, Mamberti é formado pela Escola de Artes Dramáticas (EAD) de São Paulo e construiu uma carreira de sucesso no teatro, cinema e televisão, além de ter ocupado vários cargos no Ministério da Cultura, entre 2003 e 2014, entre eles, presidente da Fundação Nacional de Artes (Funarte).
No extinto MinC, Mamberti foi também titular de várias secretarias, como de Música e Artes Cênicas, de Políticas Culturais, e da Identidade e da Diversidade Cultural. Na atual gestão federal, o antigo Ministério da Cultura se restringe a uma Secretaria Especial na estrutura do Ministério do Turismo, tendo agora como secretária a atriz Regina Duarte.
“Eu não estou aqui como conferencista no sentido acadêmico, é muito mais uma troca de experiências. Eu acho que é nesse tipo de troca que nós estabelecemos um processo de resistência a esse processo tão cruel que estamos passando hoje. É tão humilhante para nós, depois das conquistas históricas que tivemos nos últimos anos, estarmos submetidos ao pum do palhaço. É uma coisa muito triste”, criticou Mamberti em referência a Regina Duarte.
Durante o discurso de posse à frente da Secretaria Especial da Cultura, em 4 de março, a atriz elencou como manifestações da cultura, entre outras coisas, o “pum produzido com talco espirrando do traseiro do palhaço”. Apesar de expressar seu respeito profissional a Regina Duarte, com quem trabalhou em diversas oportunidades, Mamberti considerou como “uma tragédia” uma pessoa que teve uma atuação tão próxima dele estar se submetendo à “humilhação de fazer papel de marqueteira de um governo autoritário”.
Repassando sua história pessoal e suas interações com personagens importantes do mundo das artes, Mamberti se emocionou ao citar a amizade com a escritora e militante Patrícia Galvão (1910-1962), a Pagu, sua vizinha ainda nos tempos de adolescência em Santos. Recentemente, o octogenário ator e dramaturgo concedeu uma série de depoimentos que foram reunidos em uma biografia pelas Edições Sesc, com lançamento previsto para a próxima Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), em julho.
A conferência do ator santista marca a retomada da programação do ciclo “A Crise Brasileira” depois do período de férias. Em 2019, o IdEA recebeu as palestras do economista Luiz Gonzaga Belluzzo (Economia), do filósofo João Carlos Salles (Universidade), do educador Mozart Neves Ramos (Educação), do diplomata Rubens Ricupero (Relações Internacionais) e do ex-ministro Ciro Gomes (Política). O encontro desta quarta-feira teve a moderação feita pelo poeta e linguista Carlos Vogt, presidente do Conselho Científico e Cultural do IdEA.
Desde setembro do ano passado, “A Crise Brasileira” vem trazendo nomes de destaque de diversas áreas do conhecimento para a Unicamp para fomentar a discussão de temas atuais em busca de diagnósticos e soluções para as diversas crises que afligem o país. Mensalmente, o evento conta com a palestra de um ou dois especialistas, que abordam temas relevantes com espaço para o debate com o público.
Acompanhe o vídeo abaixo e aqui o podcast da Rádio Unicamp com a versão integral da entrevista do ator.