A preocupação com a integridade de alunos, docentes e funcionários da Unicamp durante a pandemia do coronavírus vai além dos cuidados médicos fundamentais desempenhados pelas unidades de saúde da Universidade e pelas pesquisas desenvolvidas pela Força Tarefa Unicamp contra a Covid-19. Com a suspensão das atividades presenciais e a necessidade de manter o isolamento social, a Diretoria Executiva de Direitos Humanos (DEDH), por meio do Voluntariado Unicamp, passou a cuidar do bem estar de toda a comunidade universitária em diferentes frentes, desde a preocupação em garantir a todos condições para que os estudantes pudessem acompanhar as aulas e desenvolver suas atividades de forma remota, até a oferta de um conforto para quem precisa desabafar as angústias ou simplesmente mudar de assunto e conversar.
Segundo a professora Josianne Cerasoli, membro da DEDH e coordenadora dos Observatório de Direitos Humanos, a Unicamp apresenta uma vantagem para o desenvolvimento dessas ações que são a estrutura e organização já estabelecidas do Serviço de Apoio ao Estudante (SAE), órgão que, dentre outras atribuições, é responsável pela identificação e prestação de apoio aos estudantes de baixa renda da Universidade por meio do pagamento de bolsas e de outros programas sociais. "O SAE foi estratégico porque, de imediato, nós já tínhamos ali a lista de pessoas que, potencialmente, seriam mais vulneráveis e teriam a necessidade mais urgente de um equipamento, de acesso à internet, de condições para poder estudar", avalia Josianne.
Empréstimo de equipamentos e inclusão tecnológica
Logo após a suspensão das atividades presenciais, uma das primeiras campanhas desenvolvidas pela DEDH foi a de empréstimo de equipamentos, como computadores, laptops e tablets, para que os estudantes pudessem acompanhar as aulas remotas e manter a realização de suas atividades. Para isso, as unidades da Unicamp fizeram um levantamento de máquinas que não estavam em uso e poderiam ser emprestadas. Antes de serem direcionados aos alunos, os equipamentos foram higienizados e passaram por revisões técnicas e atualizações de softwares. Também foram adquiridos cerca de 300 tablets, com recursos obtidos de doações, para aumentar o número de alunos que poderiam ser atendidos. Cerca de 460 equipamentos já foram emprestados a estudantes que manifestaram a necessidade e a demanda continua sendo atendida pelos voluntários.
Além do empréstimo de equipamentos, os alunos também puderam contar com chips para acesso à internet. Por meio de uma parceria com a operadora Claro, 500 chips com pacote de 10 Gb mensais foram distribuídos a estudantes que não contam com acesso à internet, em especial aos alunos indígenas que voltaram para casa em suas comunidades. "Nós mandamos por correio os chips para quem estava muito distante. Isso alcançou, sobretudo, as aldeias, que estão em regiões mais isoladas do país. Temos feito o possível para que todos que nos pedem sejam atendidos", conta Josianne. A parceria com a operadora está em processo de renovação para o segundo semestre.
No total, mais de 700 estudantes, entre alunos de graduação, pós-graduação e ProFIS, foram beneficiados. Para que toda a ação fosse realizada, a DEDH contou com o apoio do Instituto de Computação (IC), do Grupo Gestor de Tecnologias Educacionais (GGTE), do Espaço de Apoio ao Ensino e Aprendizagem (EA²), da Gráfica da Unicamp e da Pró-Reitoria de Graduação (PRG). Josianne ressalta a preocupação em garantir aos alunos a possibilidade de conexão durante o período da pandemia também como forma de eles manterem a comunicação com a Universidade e com o mundo. "Se eles não tivessem os equipamentos, talvez eu não conseguiria, como professora, sequer saber que eles podem ter alguma dificuldade para seguir com o semestre. A questão fundamental que nos move é entender o papel dos equipamentos e da conexão hoje como forma de inclusão", enfatiza a professora.
Conversando a gente se entende
Com o objetivo de oferecer apoio também a quem sente a necessidade de conversar sobre os sentimentos que toda essa situação provoca, o Voluntariado Unicamp deu início ao projeto Chamada Solidária. A demanda foi grande e a iniciativa evoluiu para a Roda de Conversa Solidária. Quem explica como ela funciona é a professora Sônia Seixas, coordenadora do Voluntariado Unicamp, em entrevista à TV Unicamp.
Atenção com alunos indígenas e comunidade
Desde 2018, a Unicamp realiza o Vestibular Indígena, modalidade de seleção que busca ampliar a diversidade entre os alunos da Universidade. No ano passado, foram oferecidas 96 vagas para essa forma de ingresso. Além de integrarem o corpo discente, os estudantes indígenas contam com uma rede de apoio acadêmico e social para a permanência na Unicamp. Durante a pandemia, esse apoio teve que ser intensificado, principalmente junto aos que optaram por permanecer em Campinas. Voluntários ligados à DEDH cuidam para que eles tenham acesso a serviços de saúde e prestam orientações de como prevenir o contágio pelo coronavírus.
"Há uma característica diferente do aluno indígena que, em geral, ele vem com a família, não vem sozinho. Então a moradia recebeu várias ações, tanto para fornecer roupas para o inverno, porque a maioria vem do Norte, como orientações específicas de como conseguir atendimentos de saúde para a família que a Unicamp não poderia fornecer", explica a professora Josianne.
Outra ação desenvolvida é junto à comunidade. Coordenados por Silvia Santiago, professora da Faculdade de Ciências Médicas (FCM), os voluntários prestam assistência médica a pessoas que integram grupos de risco, como diabéticos e hipertensos, que deixaram de realizar acompanhamentos necessários nas unidades de saúde de Campinas por causa da redução de atendimentos eletivos e concentração de esforços das equipes para atender à demanda causada pela Covid-19.
Testagem e novos comportamentos na Moradia Estudantil
Com cerca de 900 vagas, a Moradia Estudantil da Unicamp é o lar de alunos vindos de fora da Região Metropolitana de Campinas que não têm condições de se manter na cidade com recursos próprios. Lá, os cuidados com o coronavírus precisaram ser reforçados desde a atenção com o surgimento de possíveis casos, até as formas de convivência no local.
"A moradia tem uma contradição: ela foi projetada para ser um espaço de convívio, de compartilhamento de espaços, e ela é muito eficiente nisso. Só que o que a gente precisa hoje é de isolamento (risos)", reflete Josianne. Para que esse isolamento, necessário no momento, seja cumprido, foi elaborado um manual de cuidados para os alunos, com orientações como higienização de ambientes, compras, uso de espaços comunitários, tudo para que eles atravessem esse período de forma mais segura.
O local recebeu ainda uma testagem coletiva, necessária para identificar e isolar possíveis casos da Covid-19. A ação foi organizada também pela professora Silvia Santiago e contou com o apoio de estudantes voluntários do curso de medicina da Unicamp.
"Os alunos da medicina estão desesperados para ajudar, mas eles ainda não podem. Mas como voluntários, em ações como essa, eles podem. Foi muito interessante, quase todos eles falaram que nunca tinham pisado na moradia, que não sabiam como era, e lá é um espaço muito bacana", lembra Josianne.
Planejamento para o segundo semestre
A perspectiva é de que grande parte das atividades acadêmicas da Unicamp ainda sejam desenvolvidas de forma remota durante o segundo semestre de 2020. Ainda que muitas das ações já tenham sido estabelecidas, o trabalho do voluntariado continua e passa agora a atender novas demandas que começam a surgir. Josianne menciona, por exemplo, a necessidade de incentivar as unidades a verificar se ainda possuem outros equipamentos que possam ser emprestados para alunos que ainda manifestam a necessidade. Outra situação nova é de como prover a manutenção de computadores, laptops e tablets que apresentarem algum tipo de defeito.
A professora também analisa que, a partir da experiência do primeiro semestre, muitas questões poderão ser previstas e dimensionadas inclusive na organização de disciplinas e na forma com que os professores elaboram seus conteúdos para acesso remoto. "Já é muito claro para nós que, para o segundo semestre, vai ser preciso que os professores adequem um pouco mais seus conteúdos. Por exemplo, não enviando vídeos muito pesados para os alunos baixarem, isso é mais difícil. Talvez se for criado um canal no YouTube fechado para os alunos, que eles não precisem baixar os vídeos, já é uma possibilidade técnica", comenta.
Mas ela ressalta que o resultado dos esforços empreendidos por todos, não apenas pelos membros da DEDH, tem sido muito positivo, principalmente ao identificar que redes de colaboração e de solidariedade têm se consolidado, garantindo que a Universidade continue a ser um espaço de construção não apenas do conhecimento, mas também de uma sociedade mais inclusiva. "Tem alguns gestos que acontecem no meio do caminho que eu, como professora e como membro da Diretoria Executiva de Direitos Humanos, não vou esquecer tão cedo", sintetiza Josianne.