A Academia Brasileira de Ciências (ABC), Academia de Ciências do Estado de São Paulo (Aciesp) e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) emitiram notas em que se manifestam contrárias ao artigo 14 do Projeto de Lei 529/2020. O trecho do projeto de lei, que estabelece medidas de austeridade fiscal na administração estadual para conter os efeitos da crise econômica causada pela pandemia do coronavírus, prevê o recolhimento de superávits financeiros de autarquias e fundações do Estado e sua transferência para a Conta Única do Tesouro Estadual. A medida impacta diretamente as três universidades estaduais paulistas - Unicamp, USP e Unesp -, além da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), com o prejuízo estimado em cerca de R$ 1 bilhão.
Em nota, a Aciesp ressalta importância do sistema formado pelas universidades mantidas pelo Estado e pela Fapesp para o avanço científico do país. "Apesar da necessidade de austeridade fiscal no momento, a ciência é atividade essencial, tanto para o enfrentamento dos desafios atuais, quanto para o futuro desenvolvimento econômico do estado e do País. De fato, o estado de São Paulo sempre se destacou no cenário econômico e científico mundial por causa do seu excelente sistema de universidades e da atuação exemplar da FAPESP no financiamento de pesquisas básicas e aplicadas", afirma a entidade, que também lançou um abaixo-assinado contra a medida.
A ABC enfatiza que a proposta contida no projeto de lei vai na contramão dos investimentos necessários na ciência: "Entendemos que educação, ciência e inovação representam investimento e não despesas e o corte destes recursos terá consequências multiplicativas não apenas imediatas, mas de longa duração, causando um retrocesso irrecuperável no desenvolvimento do Estado e do País".
Já a SBPC alerta que outras instituições, além das universidades públicas estaduais, podem ser prejudicadas caso o texto seja aprovado dessa forma. "As universidades estaduais paulistas (USP, Unesp e Unicamp), a Unifesp, a UFABC, a UFSCar e os Institutos de Pesquisa do Estado, cuja maioria de projetos de pesquisa é financiada pela FAPESP, são responsáveis por mais de 33% da produção científica e tecnológica do país. Cientistas paulistas, dentro de universidades públicas e institutos de pesquisa, com apoio da FAPESP, têm atuado de maneira enfática para lidar com os desafios dos tempos atuais incluindo a primeira identificação e sequenciamento do novo coronavírus no país"
Proposta fere autonomia universitária
Segundo Marcelo Knobel, reitor da Unicamp, o trecho do PL 529/2020 fere a autonomia financeira e de gestão das universidades públicas paulistas. Prevista pelo Decreto nº 29.598, de 2 de fevereiro de 1989, a autonomia garante a Unicamp, USP e Unesp liberdade para gerir os recursos repassados pelo Estado por meio do percentual de arrecadação do ICMS. "Tivemos muitas dificuldades nos últimos anos para reequilibrar as contas e essa medida dificulta o trabalho de planejamento e fere diretamente a autonomia universitária de poder gerir os recursos que são repassados pelo contribuinte paulista", avalia o reitor.
Knobel explica que todo o projeto de lei está em análise pelo Conselho de Reitores das Universidades Estaduais Paulistas (Cruesp), pois além do artigo 14, outros trechos podem também impactar as universidades de forma indireta, como os itens relativos à arrecadação de impostos e o fechamento de autarquias e órgãos do Estado. Ele também detalha os esforços do Cruesp em dialogar com a Assembleia Legislativa e com o governo em busca de alterações no PL que não comprometam o trabalho das universidades e da Fapesp.
"Estamos em contato com os deputados, sensibilizando-os sobre essa questão. Também estamos conversando com o governo para mostrar a importância desses recursos para as universidades e por que isso vai contra o próprio decreto da autonomia. Temos então trabalhado intensamente para solicitar propostas de emendas que façam com que essa lei, nos termos em que está, não seja aprovada", ressalta Knobel.
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