Dados preliminares de um estudo conduzido na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) sugerem que a COVID-19 – mesmo nos casos leves – pode alterar o padrão de conectividade funcional do cérebro, causando uma espécie de “curto-circuito” no órgão.
As conclusões se baseiam em exames de ressonância magnética funcional (com sequência de repouso) feitos em 86 voluntários que já haviam se curado da infecção há pelo menos dois meses. Os resultados foram comparados com os de 125 indivíduos que não tiveram a doença e serviram como controle.
“No cérebro normal, determinadas áreas estão sincronizadas durante uma atividade, enquanto outras estão em repouso. Já no caso desses indivíduos que tiveram COVID-19, notamos uma perda severa da especificidade das redes cerebrais. Tudo está conectado ao mesmo tempo e isso provavelmente leva o cérebro a gastar mais energia e trabalhar de forma menos eficiente”, conta Clarissa Yasuda, professora da Faculdade de Ciências Médicas (FCM-Unicamp) e integrante do Instituto de Pesquisa sobre Neurociências e Neurotecnologia (BRAINN), um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) da FAPESP.
Os dados – ainda não publicados – foram apresentados por Yasuda nesta quarta-feira (27/01), durante o 7o BRAINN Congress. O estudo ainda está em andamento e o grupo tem a intenção de incluir mais participantes. A ideia é acompanhar os desdobramentos cerebrais da infecção pelo SARS-CoV-2 durante ao menos três anos.
Segundo Yasuda, ainda não se sabe de que modo o vírus causa essa alteração na conectividade cerebral, mas há algumas hipóteses a serem investigadas. “É possível que a infecção prejudique parte das redes neurais e, para compensar a falha no sinal, o cérebro ative outras redes simultaneamente. Essa hiperconectividade pode também ser uma tentativa do cérebro de restabelecer a comunicação nas áreas afetadas”, diz a pesquisadora.
Outra hipótese a ser estudada pelo grupo da Unicamp é se esse estado de disfunção cerebral tem relação com alguns dos sintomas tardios da COVID-19 relatados por diversos pacientes, como fadiga, sonolência diurna e alterações de memória e concentração.
“Pretendemos comparar o funcionamento cerebral de pacientes que apresentam esses sintomas tardios com o de pessoas que se curaram da doença e ficaram sem sintomas. Se essa relação entre hiperconectividade e sintomas neuropsicológicos persistentes se confirmar, poderemos pensar em drogas e outros tratamentos capazes de amenizar o quadro”, conta à Agência FAPESP.
Matéria na íntegra publicada no site da Agência Fapesp.
Interessados em participar do estudo podem entrar em contato com o grupo da Unicamp. São elegíveis todos os indivíduos que tiveram COVID-19, ainda que sem queixas residuais.