Um espaço de acolhimento para crianças, criado pela parceria entre a Sociedade Brasileira de Geologia (SBG), a Associação Brasileira de Mulheres nas Geociências (ABMGeo) e o GeoMamas - Rede de Mães Geocientistas da ABMGeo, foi apresentado durante a 9ª edição do Simpósio de Quantificação em Geociências, realizado na Unicamp. O espaço foi criado segundo o Guia de Acolhimento para Inclusão de Bebês e Crianças em Eventos e Espaços nas Geociências, elaborado pela GeoMamas. O Simpósio, promovido pela SBG, ocorreu entre os dias 18 e 21 de setembro na Unicamp e reuniu pesquisadoras/es, profissionais e estudantes de todo o Brasil, com o objetivo de conectar geocientistas e profissionais de áreas afins da academia, da indústria e de órgãos governamentais.
Francisco Tognoli, do comitê executivo do Simpósio, comentou o desafio de organizar o evento pensando no aspecto técnico-científico e no aspecto do relacionamento e da interação social entre os presentes. “Geralmente, fazemos um evento pensando exclusivamente na programação científica. Fizemos uma parceria desde o início da organização dos trabalhos com a ABMGeo e com a GeoMamas. Elas explicitaram a importância de tornarmos cada vez mais presentes esses espaços, porque muitas vezes uma mãe deixa de vir a esses eventos em razão de não ter onde deixar o filho, ou por precisar mobilizar pessoas da família”, disse. Para implantar o espaço, foi criada uma Comissão de Acolhimento, formada pela docente do Instituto de Geociências (IG) Maria José Mesquita, pela funcionária do IG Daniela Batista de Oliveira, pelas doutorandas da Unicamp Gabriela Bueno e Alice Cunha e Talita Gantus e pela doutoranda da USP Laísa de Assis Batista. “Achamos que seria bacana fazer no Simpósio uma espécie de teste piloto para que, a partir dessa experiência, outros eventos possam incluir o espaço em sua programação”, complementa Francisco.
A professora Carolina Zabini, do Departamento de Geologia e Recursos Naturais do IG, foi uma das parceiras no espaço Geocrias. A docente tem um programa na Unicamp, o Tempo Profundo, que já tem experiência em organizar oficinas e espaços de acolhimento. “Recebemos muitos elogios por termos ofertado esse espaço. Acredito que, conforme for se tornando mais usual a presença destes espaços nos eventos, os participantes irão aderir mais, sabendo que poderão se planejar para participar e já considerando levar suas crianças”, explica a docente. Dentre as atividades dedicadas às crianças, ocorreram escavação de fósseis, oficinas de origamis pré-históricos, de dinossauros com contação de história e de Pokémon fósseis. “Ouvimos de alguns participantes que a proposta é boa e que iremos ser contatados em breve pra participar de outros eventos”, comemora Carolina.
O Simpósio ganhou o selo Litosfera “Evento Amigo da Criança”, da Geomamas, que concede diversos tipos de selo de acordo com o comprometimento institucional por equidade, acessibilidade e diversidade, bem como o nível de adaptação de estruturas físicas. Além do espaço de recreação, outras demandas de infraestrutura e de suporte social são requeridas para o selo Litosfera, como espaço para lactantes, fraldário, banheiro e assentos para pessoas com deficiência, acessibilidade para cadeirantes e pessoas com baixa locomoção e banheiros que acolham pessoas trans. Para levantarem essas e outras questões colocadas pela Comissão de Acolhimento e Inclusão, foi veiculado entre os inscritos no Simpósio um formulário de acolhimento e escuta de demandas e necessidades específicas.
A Comissão de Acolhimento comemora o sucesso dessas ações de inclusão e diversidade no evento e os retornos positivos entre participantes. “Parabenizo a iniciativa da comissão de organização pela ótima ideia de inclusão de diversidade no evento acadêmico e acolhimento de acompanhantes e familiares junto aos congressistas. Em outra oportunidade, irei me programar para privilegiar essa participação de minha família quando houver eventos com esse suporte/apoio. Mais uma vez, muito obrigado pela oferta e carinho em pensar nessa dimensão humana” – escreveu um dos inscritos no simpósio. Outra participante comentou pelo formulário de acolhimento: “Eu não planejo levar criança neste evento, mas entendo que ter áreas que acolham crianças é algo a ser normalizado nos eventos. Assim, podemos nos planejar com antecedência para levá-las”.
“Esperamos mudar a cultura de eventos científicos e profissionais do nosso país e tornar a presença das crianças algo normal para incluirmos as mães geocientistas sempre. Com o apoio das instituições, públicas e privadas, e da sociedade civil, isto será possível” – afirma a Comissão de Acolhimento do evento realizado na Unicamp. Nesse sentido, a SBG é uma das instituições parceiras que estão comprometidas com as ações de diversidade propostas no Simpósio.
Sobre o Simpósio
O 9° Simpósio de Quantificação em Geociências começou em Rio Claro em 1985 por iniciativa do professor Paulo Landim, da Unesp. Por 15 anos, ocorreram 8 edições do evento. Quando ele se aposentou, o evento deixou de existir. Nos últimos 20 anos, no entanto, a quantificação em geociências cresceu de uma maneira muito acelerada. No início de 2021, em conversa entre Francisco Tognoli, Iata de Souza, da Unesp, e Wagner Amaral, da Unicamp – ligados à SBG –, surgiu a ideia de propor o evento, porque já era necessário para todos da área – professores, alunos, pesquisadores.
“Como a comunidade está há muito tempo desconectada, preferimos um local que fosse de fácil trânsito terrestre e aéreo, por isso, escolhemos a Unicamp,” conta Tognoli, ao mencionar a presença de participantes de lugares como Bahia, Sergipe, Amazonas, Pará, Rio Grande do Sul. Para Francisco, os trabalhos apresentados no Simpósio foram de excelente qualidade. Ele também destacou o discurso de abertura de Paulo Landim e Jorge Yamamoto, pioneiros em quantificação em geociências.
Durante o evento, a ABMGeo e a GeoMamas tiveram a oportunidade de organizar uma mesa-redonda que tratou do tema “O Censo das Geociências: instrumento quali-quantitativo para políticas de inclusão”. Foi lançado o Censo das Geociências e o Guia da Diversidade, ambos organizados pelo Grupo de Trabalho (GT) de Diversidade, composto por membras da ABMGeo. Os dois projetos dialogam com as iniciativas propostas pela Comissão de Acolhimento e Inclusão do Simpósio ocorrido na Unicamp, o que ressalta ainda mais a importância de escutar e acolher as demandas da comunidade que participa dos eventos para compreender como tornar esses espaços mais inclusivos e diversos.
O Guia da Diversidade tem como intuito abordar e discutir diversidade e inclusão nas geociências e em seus ambientes (empresas, academia, escolas, campo). É também um convite para que as pessoas discutam sobre o tema nos espaços em que se encontram. Segundo representantes do GT de Diversidade da ABMGeo, “este guia não tem o intuito de ser definitivo, e sim um começo para as discussões que se fizerem necessárias na medida em que a sociedade contemporânea demanda mudanças discursivas e transformações materiais, com vistas à maior equidade e diversidade nos espaços públicos e privados”.
Já o Censo das Geociências, por sua vez, tem como objetivo estabelecer uma base de dados sobre a diversidade sexual, racial, generificada, etária e socioeconômica de geocientistas em cada área de atuação e formação. Para as integrantes da ABMGeo e da GeoMamas, “isso facilita o acesso a profissionais que representam identidades e interesses diversos. Torna-se relevante, portanto, o desenvolvimento de um banco de dados unificado, público e intuitivo que contenha as informações da comunidade geocientífica. Por meio dos dados censitários, é possível construir planos de ação para a definição de metas, processos e ferramentas para combater a desigualdade no interior das instituições públicas e privadas”, apontam. Para elas, será possível, com isso, contribuir para o desenvolvimento de pesquisas acadêmicas que auxiliem na elaboração de medidas e ações para combater essas desigualdades estruturais e institucionais.