Em cerimônia realizada nesta quinta-feira (6), a Unicamp entregou o título de Professor Emérito Post Mortem à família de Mohamed Ezz El-Din Mostafa Habib, docente aposentado do Instituto de Biologia (IB) que faleceu em 26 de janeiro deste ano em decorrência de um câncer. A concessão do título havia sido aprovada pelo Conselho Universitário (Consu) em 29 de março. Amigos da universidade acompanharam o evento, que contou com uma apresentação especial de instrumentistas da Orquestra Sinfônica da Unicamp, uma homenagem à Habib por seu apreço pela música. Na ocasião, os familiares de Mohamed foram representados por seu filho, Nader Habib.
“A entrega desse título não é uma conquista única de meu pai. É uma conquista de toda a sociedade”, afirmou Nader. Em seu discurso, ele agradeceu as homenagens prestadas por professores e funcionários que conviveram com Mohamed ao longo de sua carreira na Unicamp e lembrou lições deixadas pelo pai, como o senso de compromisso com a coletividade. “Um país forte evolui em seu conjunto. Se não enxergarmos que fracassos individuais também são fracassos de nossa sociedade, não tem sentido celebrarmos as conquistas, porque nenhum dos dois ocorre individualmente. Tudo ocorre em sociedade”, comentou.
Nader ainda ressaltou que, mesmo com a tristeza provocada pelas saudades de Mohamed, cultivar a alegria de lembrar os bons momentos vividos é uma forma de valorizar o legado deixado por ele. “Usarmos a expressão ‘eu perdi alguém’ é algo negativo. Para aliviar nosso coração, devemos pensar que não perdemos ninguém. As pessoas que amamos simplesmente retornaram à sua origem. Em breve, nós também retornaremos, isso é um fato inegável de nossa existência.”
A mesa diretiva da cerimônia foi composta pelo reitor Antonio Meirelles, pela coordenadora-geral Maria Luiza Moretti, pelo diretor do IB, Hernandes Faustino de Carvalho, e por Alvaro Penteado Crosta, professor do Instituto de Geociências (IG) e padrinho do homenageado.
Crosta lembrou com carinho a convivência com Habib, que o chamava de “irmão mais novo”, e celebrou seu empenho no fortalecimento das ações de extensão universitária da Unicamp e o quanto seu trabalho era pautado pelo bem da comunidade. “Toda sua carreira acadêmica, desde o Egito, teve como pano de fundo princípios fundamentais que expressam sua preocupação com a saúde, o bem-estar dos seres humanos, o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável de nossa sociedade.” O diretor do IB também compartilhou suas experiências com Mohamed, a quem atribui aprendizados importantes. “Tenho muito orgulho de, hoje, ocupar a função que ele exerceu por dois mandatos. Sua titulação é motivo de orgulho para o Instituto de Biologia”, comentou.
O reitor e a coordenadora-geral da Unicamp salientaram a humanidade com que Mohamed desenvolvia suas ações na Universidade. Maria Luiza Moretti lembrou as ocasiões em que convidou o professor para falar em eventos que reuniam estrangeiros vindos de países africanos de língua portuguesa, por sua habilidade em se conectar com os demais. “O que me encantava no professor Mohamed é a forma como ele elevava o ser humano e o quanto isso se traduzia em seus atos e trabalhos”, refletiu.
“O grande exemplo que Mohamed nos deixa é a disposição de construir laços com a sociedade, que o sistema de ensino universitário de São Paulo tem papel essencial no desenvolvimento e que isso pode ser feito com inclusão, com respeito aos direitos das pessoas e ao meio ambiente”, apontou o reitor. Para ele, o exemplo de Habib é fundamental para que as universidades desempenhem seu papel de forma plena: “Que possamos usar todos esses exemplos para garantir a continuidade de nossa missão e a possibilidade de termos novos Mohameds em nossa universidade”.
Vida dedicada ao encontro com o próximo
Mohamed Habib nasceu na cidade de Port Said, no Egito, em 25 de janeiro de 1942. Formado em Engenharia Agronômica e mestre em Entomologia pela Universidade de Alexandria, foi pesquisador do National Research Centre, na cidade do Cairo. Por conta de turbulências políticas vividas no Egito após a morte de Gamal Abdel Nasser, Habib deixou o país e veio para o Brasil em 1972, em busca de uma oportunidade junto às universidades brasileiras. Acolhido na Unicamp por Zeferino Vaz em outubro do mesmo ano, Mohamed Habib foi admitido como professor de Entomologia do IB em março de 1973. Pela Universidade, concluiu o Doutorado em Ciências Biológicas em 1976 e obteve o título de livre-docente em 1982, tornando-se professor titular em 1986.
Ao longo de sua carreira no IB, destacou-se nas áreas de entomologia, ecologia aplicada, controle biológico, pragas agrícolas, agroecologia e educação ambiental. Teve também importante atuação em órgãos nacionais e internacionais, como a Secretaria Estadual de Agricultura de São Paulo, Conselho Estadual do Meio Ambiente, Ministério da Agricultura, Embrapa, Instituto de Pesquisas da Amazônia, CTNBio e Organização Mundial da Saúde. Ainda junto ao IB, foi chefe do Departamento de Zoologia e Diretor da Unidade nas gestões 1990-1994 e 2002-2005. Formou mais de 40 mestres e doutores e sua produção científica reúne mais de 200 trabalhos publicados em todo o mundo.
Habib teve uma atuação importante na institucionalização da extensão universitária na Unicamp e na ampliação da visibilidade dos projetos desenvolvidos junto à comunidade. Esteve à frente da então Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários (Preac) entre 2005 e 2012. Como pró-reitor, foi responsável pela condução de projetos que contribuíram para a integração da Unicamp com a sociedade e incentivaram a cultura extensionista entre docentes e pesquisadores, por meio de congressos e fóruns e com a busca de apoio em editais da Capes e dos Ministérios da Educação (MEC) e da Cultura (MinC).
Em sua gestão na Preac, foi inaugurado o CIS-Guanabara (Centro Cultural de Integração e Inclusão Social), espaço de preservação da memória ferroviária de Campinas e palco de diversas atividades de extensão e cultura da cidade. Também ampliou o diálogo entre as universidades do estado de São Paulo em prol da extensão e incentivou diversos programas de inclusão social e economia solidária.
Mohamed Habib foi também Coordenador de Relações Internacionais da Unicamp entre 1998 e 2002. Sua defesa da cultura de paz e do diálogo inter-religioso foram importantes em períodos de grandes debates sobre o Oriente Médio nos anos 1990 e 2000. Ele teve presença constante na mídia analisando os conflitos árabe-israelenses, os eventos de 11 de setembro de 2001 e a chamada "Primavera Árabe", entre 2010 e 2011. Na busca por ampliar o diálogo intercultural, esteve à frente do Instituto de Cultura Árabe do Brasil como vice-presidente (2008-2012) e presidente (2015-2019).
Entre os diversos prêmios e homenagens que recebeu ao longo de sua vida, foi reconhecido pelo Município de Campinas com os títulos de "Grande Defensor da Ecologia", em 1984, e "Cidadão Campineiro", em 1999. Em 2000, recebeu o prêmio "Personalidade Brasil 500 Anos", concedido pelo Centro Empresarial Cultural do Estado de São Paulo. Foi homenageado também, em 1998, pela Secretaria Nacional dos Direitos Humanos da Presidência da República, com a medalha "Direitos Humanos, o Novo Nome da Liberdade".
Confira a transmissão feita pelo canal Imprensa Unicamp no YouTube
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