Celebrado no dia 21 de setembro, o Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência visa conscientizar sobre a importância do desenvolvimento de meios de inclusão. Na Unicamp, a preocupação em buscar soluções para melhor acolher sua comunidade vem impulsionando iniciativas em diversas frentes. É o caso do primeiro Ciclo Anticapacitista, que promove, na próxima quarta-feira (27/9), a Conferência Surdos no Ensino Superior, no Ciclo Básico I.
Da mesma forma que o evento, a implementação, em outubro, do Vamus (veículo para transporte de pessoas com deficiência ou dificuldade de mobilidade), o Programa Unicamp Acessível e o trabalho realizado pelo Centro de Estudos e Pesquisas em Reabilitação (Cepre) – que completa 50 anos em 2023 – são exemplos de uma estratégia de atuação ramificada que envolve a participação de docentes, pesquisadores, servidores e estudantes e que inclui, cada vez mais, a contribuição de pessoas com deficiência.
Para a professora Silvia Santiago, que preside a Diretoria Executiva de Direitos Humanos (DeDH), as iniciativas sinalizam o amadurecimento institucional da Unicamp no que diz respeito ao acolhimento da pessoa com deficiência. “A Universidade abraça, hoje, a questão da acessibilidade como um tema seu. Não apenas da administração central, mas da própria comunidade, que deseja ter essa diversidade e se coloca à disposição para acolher suas necessidades, pressionando a instituição para criar condições físicas e também de acessibilidade funcional, desenvolvendo condições para que essa pessoa esteja aqui e aproveite todas as potencialidades oferecidas. Não é propriamente uma obra de acessibilidade física ou a contratação de profissionais que vai permitir isso”, analisa.
Resultado da ação de movimentos sociais que datam da década de 1980, o Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência tem a função, pontua a diretora, de pautar a sociedade sobre a necessidade de integrar o tema da inclusão nas políticas públicas. “Ainda chegam à Universidade as pessoas com deficiência que têm melhores condições financeiras. Queremos fazer transformações nas comunidades pobres, superar a pobreza. Para que isso aconteça, é necessário que todos possam disputar essas vagas em boas condições. As crianças e os jovens com deficiência precisam ter condições na escola pública”, sinaliza.
Evolução
Na DeDH, essas atividades se concentram na Comissão Assessora de Acessibilidade (CAA), que se associa a especialistas da Unicamp e a entidades públicas de fomento para atuar em sete eixos, entre os quais a adequação pedagógica curricular, as melhorias de infraestrutura, o treinamento de gestores e atendentes e o levantamento de grupos de pesquisa. Já a cartilha Como Podemos Praticar Acessibilidade no Dia a Dia e a campanha Nem Toda Deficiência É Visível (executada em parceria com a Prefeitura do Campus) foram desenvolvidas com o propósito de conscientizar a comunidade sobre comportamentos e atitudes que possam dificultar a comunicação ou mesmo desrespeitar o espaço de pessoas com deficiência.
“A acessibilidade não pode parar. É preciso continuar sempre, para atender às demandas que vão surgindo na sociedade. Isso faz parte da evolução”, ressalta a professora Nubia Bernardi, presidente da CAA. Atualmente, a entidade – juntamente com o Serviço de Apoio ao Estudante (SAE) e a Comissão Central de Graduação (CCG) – trabalha para organizar a regulamentação do Atendimento Educacional Especializado (AEE). “A acessibilidade pedagógica é uma das questões mais complexas, porque envolve os desafios de cada carreira. Nas engenharias, algumas disciplinas exigem o uso de maquinário, e é preciso pensar no acesso de um estudante com deficiência a esse instrumental, considerando desde sua segurança até como ele pode manipular esse equipamento da mesma forma que os outros alunos”, observa.
Ciclo Anticapacitista
A parceria da DeDH com a Faculdade de Educação (FE) viabilizou a realização da primeira edição do Ciclo Anticapacitista da Unicamp, evento resultante das demandas de estudantes e funcionários com deficiência. O ciclo engloba diversos eixos de atuação do CAA e conta com a colaboração de coletivos formados por aqueles estudantes e funcionários. “O ciclo tem a importância de colocar de maneira técnico-política quais são as condições para que a pessoa com deficiência esteja na Universidade, trazendo-a para o centro”, pontua Santiago.
Sua programação, que se estende até dezembro, inclui o I Seminário de Pesquisadores em Acessibilidade da Unicamp – que visa mapear a produção científica sobre o tema e tem inscrições abertas até o próximo dia 30 de setembro – e um festival esportivo paralímpico, voltado para escolas públicas municipais. Além da FE, as atividades programadas envolvem a participação do Cepre, da Prefeitura do Campus de Barão Geraldo, da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (Fecfau), do Coletivo Autista da Unicamp, do Laboratório de Acessibilidade (LAB) da Biblioteca Central Cesar Lattes e da Faculdade de Educação Física (FEF).
Giovanna Romaro, servidora da FE e integrante do Coletivo Autista da Unicamp, participou da equipe que idealizou o evento. A intenção da iniciativa, explica, é trazer o tema à luz. “Para que vocês saibam o que é o capacitismo, entendam que não se trata só de acessibilidade. Precisamos ser uma comunidade menos discriminatória, reconhecer que as pessoas têm capacidade de fazer as coisas, independentemente da deficiência que tiverem. Nesse sentido, é importante saber que as barreiras existem e que não vamos conseguir mudar isso de um dia para o outro. É preciso conhecer as dificuldades das pessoas para conseguir avançar tanto na questão da acessibilidade quanto na da inclusão. É preciso reconhecer essas deficiências por uma visão social e não apenas médica.”
Barreiras atitudinais
A conscientização de professores, servidores, terceirizados e estudantes sobre atitudes e comportamentos que possam desrespeitar, constranger, ofender ou atrapalhar pessoas com deficiência também é tratada como prioridade estratégica e vem sendo trabalhada de diferentes maneiras – como indicam a cartilha e a campanha de conscientização, além do próprio Ciclo Anticapacitista.
Com a mesma finalidade, a Prefeitura do Campus preparou – em parceria com funcionários e estudantes com deficiência – um treinamento para instruir quem fica na linha de frente dos atendimentos. Testado em agosto no Centro de Saúde da Comunidade (Cecom), o curso deve ser aplicado em outras duas unidades da Unicamp, antes de passar por avaliação. Uma vez estruturado, será oferecido a todos os setores da Universidade.
Programa Unicamp Acessível
Evolução de um projeto iniciado em 2015, o Programa Unicamp Acessível, da Prefeitura Universitária, visa reduzir as barreiras de acessibilidade responsáveis por restringir o acesso e a movimentação de pessoas com deficiência ou criar dificuldades de mobilidade nos campi da Universidade. O programa busca viabilizar melhorias necessárias para permitir, por exemplo, a circulação de pessoas com deficiência visual ou locomotora em edifícios como os chamados “pinotinhos”, construções dos anos 1980 e 1990 do tipo bloco modular que não contam com sanitário adaptado no nível térreo nem elevador acessível.
Com esse objetivo, a prefeitura investe em ações pensadas para detectar problemas estruturais, adequar instalações e capacitar recepcionistas e profissionais responsáveis pelo primeiro atendimento à comunidade. Parte dessa estratégia, o mapeamento de calçadas, escadas e edificações deu origem à criação do Protocolo de Minimização de Impedimentos. E também resultou na concepção do Vamus, carro elétrico com capacidade para transportar quem utiliza cadeira de rodas, cão-guia ou andador (além de quatro acompanhantes).
Construído sob medida, o veículo entrará em circulação em outubro, em caráter de teste, e ficará disponível de segunda-feira a sexta-feira, das 7h às 23h. Para utilizá-lo, será necessário baixar um aplicativo, similar ao do Botão de Pânico, que está sendo desenvolvido. “Vamos testar por um ano para avaliar, por exemplo, se um carro é suficiente para atender à demanda”, esclarece Edilene Donador, arquiteta e urbanista responsável pela área de projetos e acessibilidade da Prefeitura Universitária.
Para além de adequar sua infraestrutura às normas da legislação vigente, o programa Unicamp Acessível busca incluir, em seus projetos, melhorias desenvolvidas em pesquisas realizadas na instituição. Como a maquete tátil, inspirada em trabalho empreendido pelo professor João Vilhete no Núcleo de Informática Aplicada à Educação (Nied), que permite a deficientes visuais e cegos compreenderem a disposição de um edifício a partir do tato e da descrição sonora. Fruto de uma parceria com o Smart Campus (iniciativa associada à própria prefeitura), dois exemplares estão sendo construídos em impressora 3D: uma maquete da própria instituição e outra do Cecom.