Um anfiteatro lotado esperava a chegada do escritor, dramaturgo e roteirista Marcelo Rubens Paiva, na tarde do dia 20 de outubro, ao Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) para a palestra inaugural de sua residência artística no Programa “Hilda Hilst” do Artista Residente, do Instituto de Estudos Avançados (IdEA). O autor foi calorosamente recebido pelo público presente, composto de alunos, professores e pessoas de fora da Universidade e que durante duas horas acompanhou atentamente a apresentação de Paiva, intitulada “A missão de um escritor”.
Durante sua palestra, o autor destacou como a Unicamp teve uma presença marcante em sua vida e como suas experiências no ambiente universitário de Campinas se refletiram na sua obra literária, desde o livro de estreia, o best-seller Feliz Ano Velho (1982) até sua obra mais recente, o romance Do começo ao fim (2022).
Uma primeira fase dessa experiência deu-se a partir de sua entrada no curso de Engenharia Agrícola da Unicamp, em 1977, no qual permaneceu até o acidente responsável por limitar sua mobilidade, ocorrido em 1979, durante uma festa às margens da Rodovia dos Bandeirantes. Depois do sucesso de seu primeiro trabalho como escritor e de uma produção literária que ganhou corpo com a publicação de outros livros, Paiva voltou à Unicamp, entre 1991 e 1994, quando fez um mestrado no IEL por sentir que precisava aprofundar seus estudos sobre literatura.
Na abertura da palestra, agradecendo o convite e dizendo-se honrado por estar na Unicamp, o escritor esmiuçou sua produção, passando por Blecaute (1986), Ua:brari (1990), Bala na Agulha (1992), Não És Tu, Brasil (1996) e Meninos em Fúria (2016), entre outros, destacando o romance de autoficção Ainda estou aqui (2015), vencedor do Prêmio Jabuti. O livro narra o episódio envolvendo o desaparecimento e assassinato de seu pai, o deputado cassado Rubens Paiva (1929-1971), e a biografia de sua mãe, Eunice Facciolla Paiva (1932-2018), advogada e militante pró-democracia e da causa indígena.
“Só a base que eu tive no IEL e a coragem e a ousadia de dizer ‘literatura é tudo’, ‘literatura é o que eu quero’, ‘literatura é o que eu vou fazer e, se for bom, o problema não é meu, o problema é do leitor, mas é o que eu quero fazer’ é que me fizeram conseguir escrever esse livro”, explicou o autor sobre Ainda estou aqui, que repassa episódios já narrados parcialmente em Feliz Ano Velho. “É uma mesma história, só que contada de uma forma completamente diferente, muito mais bem apurada, de um escritor que agora é um pai de 50 e poucos anos de idade falando de uma mãe que tem Alzheimer e que está perdendo a memória no ano da Comissão da Memória e Verdade.”
A mesa de abertura do evento contou com a participação da coordenadora-geral da Unicamp e reitora em exercício, Maria Luiza Moretti, do coordenador do IdEA, Christiano Lyra, da coordenadora-adjunta do IdEA, Isabella Tardin, do diretor do IEL, Petrilson Pinheiro da Silva, e de Gustavo Silveira, coordenador do XXVII Seminário de Teses em Andamento do IEL, cuja programação contemplou também a palestra. “Essa acolhida calorosa é fruto do carinho que você tem pela Unicamp”, afirmou Lyra, anunciando a série de cinco oficinas virtuais sobre a prática literária que o escritor fará entre outubro e dezembro. “Teremos a oportunidade de conversar com o autor, de conhecer um autor fundamental contemporâneo do Brasil e de trocar ideias. Ele vai falar sobre o processo de criação, a interpretação do momento que ele atravessa e como isso se transforma em literatura. E vai falar também sobre a mudança de suporte, já que muitos de seus livros foram para as telas e para o teatro.”
A vice-reitora destacou a beleza da expressão literária e falou sobre como é desafiador para um autor colocar no papel aquilo que pensa, fazendo-se compreender pelos leitores. “É emocionante encontrar você hoje e me lembrar do Feliz Ano Velho, que foi um livro que todos leram. Eu amei o livro e acho que, na ocasião, toda a juventude que partilhou essas duas décadas, de 1970 e 1980, leu, pois é um livro muito atual e marcante. Para mim é uma honra ter você aqui, ainda mais sendo você um egresso da Unicamp, a mostrar como a Universidade é transformadora”, declarou Moretti.
Entre 27 de outubro e 1º de dezembro acontecem as oficinas literárias voltadas a discutir o processo criativo do autor, em encontros semanais previstos para ocorrerem em uma plataforma de vídeo. No encerramento da residência artística, no início de dezembro, Paiva vai proferir uma segunda palestra, em dia a ser ainda anunciado.
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