MANUEL ALVES FILHO
O colchão, objeto com o qual as pessoas mantêm um contato mais prolongado no ambiente doméstico, é o local onde existe a maior concentração de ácaros em uma casa. A constatação faz parte de duas teses, uma de mestrado e outra de doutorado, defendidas recentemente na Unicamp. Os trabalhos concluíram, ainda, ser impossível livrar as residências desses animais microscópicos, responsáveis pelo surgimento ou agravamento de alergias respiratórias no homem. Segundo os pesquisadores, porém, é recomendável a adoção de práticas higiênicas capazes de reduzir a população desses parentes do carrapato, minimizando assim os problemas de saúde que eles podem causar.
A bióloga Raquel Binotti e o médico Celso Henrique de Oliveira colheram amostras de poeira de 58 domicílios de Campinas para as suas teses de mestrado e doutorado, respectivamente. Ao analisarem o material, eles verificaram a presença de ácaros em todas as residências. O que mais chamou a atenção dos pesquisadores foi o fato de o colchão ser o "esconderijo" predileto dos acarídeos. "A concentração de ácaros na parte de baixo do colchão, que fica em contato com o estrado, é três vezes maior do que na de cima", afirma Oliveira.
Em seguida, no ranking de preferência dos bichinhos, aparecem o sofá, o tapete, a despensa e a cortina. Em uma das residências pesquisadas, os autores das teses encontraram uma concentração de 40 mil ácaros por grama de poeira. De acordo com alguns estudos internacionais, a presença de 500 indivíduos por grama de poeira é suficiente para causar crise alérgica numa pessoa, com sintomas como a falta de ar. "A concentração de 100 ácaros por grama de poeira já é o bastante para provocar alergia, embora não gere crise", esclarece Oliveira.
O médico lembra que cerca de 80% das alergias respiratórias estão relacionadas com esses acarídeos. Ele explica que os ácaros adoram poeira, umidade e ambientes pouco iluminados. Eles se alimentam normalmente de fungos e das escamas da pele humana. Uma pessoa adulta libera algo como cinco gramas de escamas por semana, um banquete e tanto para os bichinhos. Nas amostras de poeira analisadas, os pesquisadores identificaram 18 tipos diferentes de ácaros.
Os mais comuns, conforme Raquel, foram o Dermatophagoides pteronyssinus, presente em 55% das casas, e o Blomia tropicalis, encontrado em 14% dos domicílios. A bióloga diz que são as fezes e as carcaças em decomposição desses animais que causam as alergias. Quando ficam em suspensão, são aspiradas pelas pessoas e acabam irritando as mucosas do nariz e da garganta. Em contato com o pulmão, provocam a asma brônquica, conhecida popularmente como bronquite.
Precauções - De acordo com os autores das teses, que foram orientadas pelo professor Angelo Pires do Prado, do Instituto de Biologia (IB), é praticamente impossível eliminar os ácaros do ambiente doméstico. Como encontram condições favoráveis para estabelecer seus ninhos na área urbana, os acarídeos se multiplicam muito rapidamente. Cada animal vive, em média, 100 dias. Em 20 dias, já se tornam adultos. Durante a sua vida, uma fêmea põe até 200 ovos. "É ácaro que não acaba mais", constata Oliveira.
A saída, conforme os pesquisadores, é tentar controlar a população desses bichinhos, fazendo com que ela fique abaixo da concentração capaz de causar alergia ou mesmo crise. Algumas medidas trazem bons resultados. Virar o colchão a cada 15 dias e envolvê-lo com uma capa emborrachada internamente, fechada por zíper, são duas delas. Também é recomendável não usar tapetes e cortinas. No lugar das cortinas é preferível optar por persianas plásticas. Manter a casa sempre arejada e iluminada é indispensável para combater os ácaros. "Além disso, é preciso que as pessoas mantenham os alimentos bem fechados nas despensas e evitem fazer refeições na cama ou no sofá", aconselha o médico.
Oliveira e Raquel estão se dedicando, agora, à criação de ácaros. O objetivo é aprender um pouco mais sobre os hábitos e comportamentos dos bichinhos, para futuramente produzirem vacinas contra as alergias geradas por eles. Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) indicam que pelo menos um quarto da população mundial sofre de algum tipo de alergia. Entre 15 e 20% desse universo apresenta pelo menos uma vez o quadro de crise asmática. Alguns estudos apontam, ainda, que 10% das pessoas têm reações alérgicas provocadas por ácaros. Numa cidade como Campinas, isso representa 100 mil habitantes.