Ele não
gosta de ficar parado. Quer dizer, sem fazer nada. Por isso lê. Lê
muito. De preferência livros. E em inglês, embora não dispense
revistas e jornais. Não é capaz de ficar um só dia sem ter
em mãos algum livro, mesmo em português. Lê em média
de três a quatro livros por mês, garante. Já devorou obras
de Machado de Assis, Aloísio Azevedo, Jorge Amado, Érico Veríssimo
e Drummond. O mais recente foi Noite, de Veríssimo, na semana passada.
Agora está às voltas com 1968: O ano que não terminou, do
jornalista Zuenir Ventura. Diz que está gostando de ter uma outra visão
do que foram aqueles negros anos da história do Brasil. Na
Unicamp desde 74, José Benedito Anhaia atualmente é motorista do
Cepetro, unidade vinculada à reitoria. E como tal, freqüentemente
precisa viajar a São Paulo para levar professores ao aeroporto ou buscar
um pesquisador que vem de fora. Às vezes isso resulta numa entendiante
espera que pode ser longa, até horas. Enquanto espera, José
lê. Prefere preservar esse hábito do que jogar cartas ou conversa
fora, discutindo futebol ou política há ocasiões
em que conversar também é muito bom ele diz. Os próprios
colegas atestam esse hábito de José. O
Hotel, de Arthur Halley, e The case of the reluctant model, de Erle Staney
Gardiner, são dois exemplos de livros que mais gostou e livros que leu
no original. O prazer pela leitura de obras em inglês e a necessidade
da leitura começou quando ainda cursava o supletivo do segundo grau.
Um dia, antes de ingressar na Unicamp, ganhou um livro em inglês: Lições
sem Mestre. Na ocasião trabalhava como motorista da Ensatur, empresa
de ônibus. Como queria aprender inglês, ficava o tempo todo com o
tal livro debaixo do braço. Era só ter alguns minutinhos de folga
José o abria e tentava entender o idioma de Shakespeare. Essa atitude de
José acabava provocando comentários dos colegas de trabalho, que
o ironizavam: Como estudar inglês se nem o português você
sabe direito, diziam. O livro foi início de tudo, que despertou em
José Benedito o gosto pela língua, hábito que ainda tenta
preservar. José
conta que quando estudava o carro dele ficava cheio de livros de química,
de física, de matemática e português, inclusive apostilas
do curso. Mas o que eu gostava mesmo, sem desmerecer as outras disciplinas,
era o inglês. Até hoje leio e pratico para não esquecer o
que já aprendi, porque a gente conversa muito pouco com outras pessoas
que falam inglês, diz. Saber falar uma outra língua, principalmente
o inglês, tem facilitado muito o seu trabalho como motorista. Muitas
vezes quando a gente vai buscar nos aeroportos um professor de fora, geralmente,
mais para ter o que falar, quer saber coisas corriqueiras sobre a Universidade,
a cidade ou comentam sobre o tempo, essas coisas.
Aí até que dá para levar uma conversa legal, simples, sem
grandes problemas, quando a coisa é o trivial, revela. Ele conta
que às vezes, no Cepetro, é chamado para servir de intérprete
quando há visita de pesquisadores estrangeiros ou para socorrer alguém
ao telefone, embora as secretárias do setor saibam inglês.o.
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Autopercepção é tema de exposição no HC
Para
quem observa, a arte de Deolinda Della Nina pode ser considerada abstrata. Ganha,
porém, nova dimensão num ambiente hospitalar como o HC da Unicamp,
onde, desde 21 de junho, acontece a exposição Um olhar atencioso:
uma poética referenciada na autopercepção. São
quatro instalações, com alguns conjuntos de desenhos que representam
fragmentos do corpo humano. Essa
exposição, que fica suspensa entre o segundo e o terceiro andar,
ao lado dos jardins internos dos Ambulatórios, leva o mesmo nome da dissertação
de mestrado em Artes Visuais da autora, recentemente apresentada ao Instituto
de Artes (IA) da Unicamp. A pesquisa de Deolinda é baseada em um modelo
que passou a ser mais adotado após a década de 90. Ele reflete o
processo criativo das obras da autora, cuja linguagem formal é o desenho
de observação, que tem como referência o corpo humano do próprio
observador e do ambiente. Arte concebida O HC foi o local
que mais atraiu Deolinda para realizar a exposição. Segundo ela,
todas as pessoas, algumas vezes na vida, visitam um hospital: seja para cuidar
do próprio corpo ou para acompanhar o restabelecimento do corpo do outro,
seja ele parente, amigo, médico ou enfermeiro. No pronto-socorro,
desespero e agonia; no ambulatório, ansiedade e expectativa; na maternidade,
alegria e esperança, relata. O
cuidar do corpo ou da saúde é um dos aspectos dessa experiência
perceptiva. Daí sua relação com o ato de se observar ao desenhar
e com o contexto do hospital, explica Deolinda, que foi orientada pelo professor
Ernesto Giovanni Boccara, do IA. O que veio à mente da artista foi
criar organismos de natureza interior que se materializavam em um outro organismo.
Durante esse processo, os materiais ficavam mais nítidos: películas
transparentes, circulares, ovais ou recortadas, contendo no interior desenhos
do corpo materializados em uma substância pastosa e translúcida,
que circulariam ou partiriam em torno de um mesmo eixo, ligados por tramas de
fios transparentes. A vida e a morte entrelaçadas por um ciclo,
define Deolinda. Mais
informações sobre a exposição, que vai até
o dia 30 deste mês, através do telefone 3243-3702..
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