Edição nº 564

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 09 de junho de 2013 a 15 de junho de 2013 – ANO 2013 – Nº 564

Para além do naipe de contraltos

Funcionária do suporte de informática do Cotuca articulou volta do coral do colégio

Década de 1980, algumas mãos generosas serviam a fila de alunos e funcionários que parecia infinda ao longo do corredor do Restaurante Universitário. Algumas pessoas, porém, serviam com os olhos, o sorriso ou um trecho de uma música, como o fazia Dona Carmen, uma das cantoras do Coral Alimentum, formado por funcionários do restaurante e regido por Renate Sthephanes Soboll. Entre os usuários do “Bandejão” servidos por Carmen estavam seus filhos, Mário, Cristina, Luciana, e o sobrinho Márcio (todos funcionários). A cantoria contagiou os filhos, que 12 anos após sua morte, seguem cantando. Mário integra o grupo de samba Partido Alto, Cristina participa do coro da Igreja Catedral Metropolitana de Campinas e participou do Coral da Unicamp Zíper na Boca, e Luciana Maria Rodrigues, tecnóloga da informação e da comunicação no Colégio Técnico de Campinas (Cotuca), está hoje entre os principais incentivadores, colaboradores e cantores do Coral do Cotuca, regido pelo maestro Danilo Demori desde 2011.

 

Luciana entendeu que a distância entre o campus de Barão Geraldo e o Cotuca, localizado no centro de Campinas, não poderia ser a mesma distância entre a comunidade do Cotuca e a música. Sendo assim, em 2008, ao perceber a impossibilidade de alunos, funcionários e professores participarem das atividades artísticas da Universidade, não hesitou em convencer a direção do colégio a viabilizar a volta do coro, proposto no início da década de 2000 pela bibliotecária Jacqueline Françoise Bressan Neptune. Com a aprovação, recrutou cantores entre funcionários, professores e alunos e assumiu o papel de “administradora” do coro. “O que eu acho fascinante é a incrível capacidade que o canto-coral tem de instigar nossos mais puros sentimentos, fazendo aflorar várias sensações diferentes no ser humano sem que, muitas vezes, nós tenhamos a percepção disso”, declara Luciana.

Ela enfatiza o impacto de algumas horas de música na qualidade de vida das pessoas, além do alto astral, que, em sua opinião, contagia o ambiente. O curto trajeto do ensaio à sala de trabalho é feito cantarolando, tornando o ambiente mais agradável, como fazia Dona Carmen. “Penso que cada vez mais, nos tempos modernos e corridos em que vivemos, precisamos nos dar um tempinho, de vez em quando, para fugir da rotina e do estresse que nos assola. A música pode ser uma verdadeira aliada nesse processo porque nos renova, faz pensar, deixa leve e purifica a alma”, reflete Luciana.

O coro é uma missão, a ponto de antecipar em pelo menos duas horas o horário de chegada de Luciana ao Cotuca às terças e às quintas-feiras, dias de ensaio. Para ela, a integração entre funcionários, professores e alunos aprimora as relações pessoais na sala de aula e no ambiente de trabalho. Ela concorda com a diretora de ensino do colégio Ângela Salvucci sobre a interferência do coro nas atividades cotidianas, desde a maneira como se atende um telefone até a organização e a disciplina no trabalho. A própria dinâmica do coro, assim como a técnica vocal e respiração, propicia tais melhorias, na opinião de Luciana e de Ângela.

Luciana também evidencia ganhos na relação professor-aluno, pois muitas situações vivenciadas no coro jamais existiriam em sala de aula. No coro, não tem como diferenciar professor de aluno, pois são todos coralistas, com as mesmas dificuldades e acertos.

Apoio

Segundo Ângela, a direção do colégio apoia a dedicação de Luciana, pois considera importante proporcionar aos funcionários um trabalho prazeroso e a oportunidade de aprender coisas novas. “Se não fosse o apoio dela na retaguarda, o trabalho não aconteceria. Neste momento, é ela, ao lado de Danilo, que administra agenda, dias de ensaio, divulga as apresentações na página eletrônica do Cotuca”, atesta a assessora da direção Ângela Salvucci.

Luciana é reconhecida não apenas pela excelência do trabalho desenvolvido como suporte de informática do Cotuca, das 14 às 23 horas, mas também como apoio no naipe de contraltos. “Ela é meu apoio entre as contraltos”, diz Demori. Ter a funcionária como aliada permite concentrar-se nas atividades artísticas do coro. “Para mim, é maravilhoso porque posso me reservar para preparar repertório e ensaio. É o sonho de todo regente ter alguém como a Luciana cuidando da parte burocrática e da organização.”

A inciativa de Luciana deveria ser seguida por outros campi distantes da Cidade Universitária, na opinião de Demori, que de 2004 a 2007, regeu também o coro de alunos da Faculdade de Tecnologia (FT), em Limeira, justamente pela impossibilidade das pessoas de se locomoverem a Barão Geraldo para participar de grupos como o Zíper na Boca, regido por Vivian Nogueira, ou o Coral da FCM (Faculdade de Ciências Médicas), regido por Carlos Rosa.

Nem canto nem informática. Era assim em 1982, quando, ainda adolescente, Luciana lançou-se ao universo da Unicamp, sempre repleto de novidades. Apesar de Dona Carmen já fazer carreira na Universidade, Luciana se surpreendeu com o manancial de informações em um só espaço. Sabia que iria trabalhar na Unicamp, mas nem imaginava o que era informática ou canto coral. Se hoje as duas artes fazem parte de sua vida, deve a esse universo suas realizações. A paixão pela informática, presente em quase tudo hoje, como ela mesma descreve, foi despertada quando chegou ao Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) e encontrou os amigos Aguinaldo, Evaldo e Ricardo. A habilidade dos amigos chamou atenção e motivou Luciana a buscar formação superior na área de tecnologia da informação e comunicação na Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC).

Apesar de ter despertado para o canto-coral somente agora, a relação de Luciana com a música pode ser contada a partir de um trabalho de memória da cidade de Campinas, incluindo a Unicamp. Quando a tradição de grandes escolas de samba era forte na cidade, principalmente em locais chamados de bairros negros por historiadores, parte da família de Luciana participava da organização da escola de samba Acadêmicos de Madureira, do bairro São Bernardo, que estava sempre entre os grupos que disputavam as primeiras colocações.

Em respeito à tradição, estreou este ano, ao lado da irmã, Cristina, o irmão Mario e o amigo (irmão) Carlinhos, o bloco carnavalesco “Vai que Vira” em desfile no São Bernardo. O percurso local sobre um trio elétrico de Seu Dorival Messias, entoando músicas arranjadas pelo amigo Niva, do Grupo Partido Alto, arrastou em torno de 300 pessoas. Ousadia que pode estar relacionada às atividades de canto no Coral do Cotuca, já que, para Luciana, a experiência em coro torna a pessoa mais desinibida e ao mesmo tempo mais criteriosa. “Para mim, é mais que gratificante. Imaginarmos que as iniciativas vão além do trabalho do coro é o que nos faz ir além, faz imaginar que a semente da transformação plantada não fica somente naquele universo. Vai para o setor pessoal, atinge outras pessoas e amplia-se a rede de informações. É importante ver que informação está sendo absorvida, processada e sendo passada adiante”, afirma Demori.

Ele procura sempre pesquisar o gosto de seus coralistas para pensar suas possibilidades e escrever novos arranjos. “Ano passado fizemos um arranjo de Blackbird, de Beatles. Ao mesmo tempo em que fazia parte de um renascença inglesa ou música brasileira. Conhecendo o coro, tenho possibilidade de adaptar esse repertório para eles”, declara.

Iniciativas como a de Luciana ajudam a buscar parte da memória que talvez só seja lembrada por quem participou do processo, principalmente no que diz respeito a integrar pesquisadores, docentes, funcionários e alunos. Foi assim com o Coral da Unicamp, regido pelo então aluno Paulo Rocco, no final da década de 1980 e início da década de 1990, com o Zíper na Boca, o Coral da FCM, regido pelo ex-aluno e maestro Carlos Rosa e também com o Alimentum, no qual Carmen soltava a voz em concertos como Terras de Manirema, em conjunto com o Coral de Campinas (Coca) e Coral da Unicamp, e, 1990, na Igreja Nossa Senhora Aparecida.

A história de mãe e filha emociona a maestrina Renate, que relembra seu primeiro trabalho como regente em muitos finais de tarde no Restaurante Universitário, ao lado de pessoas que descreve como “gente simples e dedicada”. Assim como a diretoria do Cotuca, o reitor Paulo Renato Costa Souza não somente apoiava como assistia aos concertos, que tinham apoio também do maestro Benito Juarez, na época chefe do Departamento de Música do Instituto de Artes da Unicamp.

Quem quiser entender por que Luciana, hoje no Cotuca, consegue trabalhar com um sorriso muito semelhante ao da mãe, dona Carmen, 12 anos atrás no “Bandejão”, tente entrar para um coral, pois como acentua Renate em poucas linhas de conversa: “Esta é uma das funções de coral em empresas”. Afinal, como canta uma das intérpretes preferidas de Luciana: “Pra que chorar?... Bem melhor cantar.”

 

Comentários

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Parabéns Luciana, Mário e Tina.
Vocês conseguiram levar a alegria da Dona Carmen adiante.

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luciana ficamos orgulhosos tantas lembranças trazida nesta reportagem e o valor descrito através da descoberta do canto na vida, segue em frente abraços re toni ana.

Comentário: 

A herança musical deixada por Dona Carmen a Luciana e seus irmãos não tem preço,continuem com este excelente trabalho. Parabéns.

Atenciosamente,
Antonio Carlos de Oliveira

tony@cotuca.unicamp.br

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Parabéns pelo empenho e dedicação; sempre precisamos de quem faz a diferença!!!

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Lú.... Parabens...
Obrigado por fazer parte da sua historia...
Aguinaldo (IFCH hoje FEM)...

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Oi Lu, o gosto pela musica sempre esteve aflorado em todos da sua família, mais ainda, o sorriso sempre foi o companheiro de todos os dias vocês. É um orgulho poder dizer que estivemos trabalhando juntos por anos no IFCH e que tive o privilégio de conviver com você, seus irmãos e a saudosa dona Carmen que fazia o dia de todos muito alegre.
Parabéns pela iniciativa e pelo sucesso.
Grande beijo,
Ricardo (ex IFCH)