Edição nº 594

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 14 de abril de 2014 a 27 de abril de 2014 – ANO 2014 – Nº 594

Telescópio


O Stradivarius seria um mito?

A superioridade inquestionável dos violinos produzidos pelos velhos mestres italianos dos séculos 17 e 18 – Stradivarius e Guarnieri, por exemplo – é um mito, de acordo com estudo publicado no periódico PNAS. “Grandes esforços têm sido feitos para explicar por que instrumentos feitos por Stradivarius e outros mestres italianos antigos soam melhor que os violinos modernos de alta qualidade, mas sem oferecer evidência científica de que este é mesmo o caso”, escrevem os autores, vinculados a instituições da França e dos Estados Unidos. Eles lembram que o verniz, a madeira e outras propriedades dos violinos antigos já foram estudados com grande atenção.

O artigo lembra que, num experimento realizado em 2010, no qual 21 violinistas profissionais compararam três violinos novos, dois Stradivarius e um Guarnieri – sem saber qual era qual – um dos Stradivarius ficou em último lugar, e o violino mais apreciado foi um novo. Esse trabalho de 2010 foi criticado pelo pouco tempo de contato dos violinistas com os instrumentos, pelo pequeno número de instrumentos envolvidos e pelo local, um quarto de hotel, tido como inadequado.

O novo trabalho usou doze violinos – seis modernos e seis de velhos mestres, incluindo cinco Stradivarius – que foram testados por dez solistas, em sessões de 75 minutos, sem que os músicos soubessem qual instrumento estavam tocando. As sessões foram realizadas num estúdio de ensaios e numa sala de concertos, e os pesquisadores pediram aos solistas para selecionar, dos 12 violinos, os que aceitariam como substitutos de seus instrumentos pessoais. 

No fim, dos dez solistas, seis escolheram violinos novos e quatro, Stradivarius. Um mesmo violino novo foi escolhido quatro vezes, e um mesmo Stradivarius, três vezes. Além disso, os solistas não foram capazes de distinguir os Stradivarius dos violinos novos com grau de acerto maior que o esperado pelo acaso. 

O estudo conclui que o mito da superioridade inquestionável dos violinos dos velhos mestres italianos “ainda requer forte apoio empírico” para se sustentar. Os autores afirmam também que “a busca pelo segredo de Stardivarius” revelou-se “um campo de pesquisa permanentemente estéril”.

 

Computadores estimulam o aprendizado, aponta artigo

Aulas interativas, nas quais os estudantes pesquisam, investigam e “descobrem” o conteúdo por conta própria são mais eficientes, para o ensino de ciências exatas, do que o modelo tradicional da aula-palestra seguida por avaliações. A interatividade, no entanto, consome muito mais tempo e é difícil de implementar, tanto em turmas grandes presenciais quanto em MOOCs – cursos online que reúnem milhares ou milhões de estudantes. Sistemas virtuais, no entanto, podem ajudar a aproximar os dois modelos, diz trabalho publicado na revista Science.

“Analisar textos ou desenhos feitos pelos estudantes, usando os resultados da avaliação para guiá-los, pode melhorar o aprendizado”, escrevem os autores, vinculados à Universidade da Califórnia em Berkeley e a Princeton. “Mas isso requer mais capital humano que os professores universitários e pré-universitários têm”. No entanto, diz o artigo, “orientação imediata, personalizada e gerada por computador pode motivar os estudantes”.

O artigo apresenta algoritmos que conseguem analisar o conteúdo de respostas escritas e sugerir correções, incluindo um programa, AutoTutor, que entra em diálogo com o aluno, pedindo que esclareça seu raciocínio e explique melhor seus pontos de vista. “Professores podem revisar as avaliações automatizadas para medir o progresso da classe e criar atividades que atendam a dificuldades específicas”, escrevem os pesquisadores.

O artigo aponta para a necessidade da criação de sistemas de aprendizado de código aberto (“open source”) que possam ser usados em cursos tradicionais. “O acréscimo de características de investigação e de tutoriais guiados para apoiar os estudantes deve se tornar uma alta prioridade no design de ambientes de aprendizado”, conclui o texto.

 

Dano cerebral reduz erro em jogos de azar

Praticantes de jogos de azar costumam cometer alguns erros de raciocínio que ajudam a enriquecer os cassinos: um deles, a chamada “falácia do jogador”, é a sensação de que a sorte “tem” de virar – por exemplo, a ilusão de que, depois de uma série repetida de resultados vermelhos numa roleta, a chance de um número preto sair aumenta. Na verdade, a probabilidade continua a ser a mesma, de pouco menos de 50% para cada cor (as chances são menores que meio a meio porque as roletas têm um ou dois números verdes, onde só a casa ganha). 

Um estudo publicado no periódico PNAS indica que pessoas com dano numa estrutura do cérebro chamada ínsula são menos vulneráveis a se deixar levar pela falácia do jogador, e também ficam menos entusiasmadas com um “quase acerto” – por exemplo, quando uma jogada de caça-níqueis produz um padrão muito próximo do que garantiria uma vitória, como três símbolos iguais em uma fileira de quatro. “Quase acertos” também tendem a estimular as pessoas a continuar jogando – e perdendo dinheiro.

O trabalho comparou o comportamento de portadores de dano na ínsula ao de vítimas de danos em outras parte do cérebro associadas à tomada de decisões e à emoção – o córtex pré-frontal ventromedial  e a amídala – e com voluntários saudáveis.  Em todas as comparações feitas, as vítimas de dano na ínsula mostraram-se menos vulneráveis à falácia do jogador e ao efeito de quase acerto que os demais. 

Com base nesse resultado, os autores, de instituições do Reino Unido e dos Estados Unidos, especulam que jogadores compulsivos podem sofrer de um excesso de atividade na ínsula. Em 2007, outro estudo, publicado na Science, havia informado que pacientes com dano na ínsula tinham mais facilidade em parar de fumar, e menos recaídas. A ínsula está ligada a diversas funções importantes do cérebro, como o controle da pressão sanguínea durante exercícios físicos e o processamento de emoções sociais, como a percepção de injustiça

 

A longa espera pelo prêmio Nobel

Hoje em dia, o autor de uma descoberta científica significativa pode ter de esperar mais de 20 anos antes de ser reconhecido com um prêmio Nobel, diz carta publicada na revista Nature, e cada vez mais cientistas merecedores do reconhecimento correm o risco de não viver o suficiente para receber a homenagem. 

Os autores da correspondência, que tem como principal assinante Santo Fortunato, da Universidade de Aalto, na Finlândia, notam que, antes de 1940, Nobéis concedidos mais de 20 anos após a descoberta original eram 11% para física, 15% para química e 24% para medicina. A partir de 1985, porém, as proporções passaram a 60%, 52% e 45%, respectivamente. Se a tendência se mantiver, no fim deste século a idade média dos ganhadores “será maior que a expectativa de vida” – o que gera um paradoxo, já que o Nobel não pode ser concedido postumamente.

 

Populações indígenas podem se recuperar

Levantamento feito por pesquisadores dos Estados Unidos, com base em dados demográficos de 238 populações indígenas do Brasil, sugere que essas populações podem se recuperar e voltar a crescer, mesmo após o colapso inicial causado pelo contato com o mundo moderno. O estudo foi publicado no periódico online Scientific Reports, do Grupo Nature.

“Todas as séries cronológicas mostram evidência de colapsos populacionais durante o século 20”, escrevem os autores, que se valeram de dados oficiais e de ONGs. “De fato, cerca de um terço das séries detecta colapsos populacionais após o contato com até 99% de mortalidade”.

“No entanto”, diz o artigo, “nossos resultados mostram que todas as populações sobreviventes exibiram taxas positivas de crescimento na década seguinte ao contato”.

Os resultados indicam, de acordo com os autores, que as populações indígenas remanescentes da Bacia Amazônica são “notavelmente robustas e resistentes”, com cerca de 85% dos grupos sobreviventes atingindo crescimento populacional líquido no período pós-contato, muitos a taxas elevadas, de mais de 3% ao ano.

“Nossos achados pintam um quadro demográfico positivo para essas populações”, escrevem os autores, mas com a ressalva: “a sobrevivência de longo prazo continua sujeita a externalidades poderosas, incluindo política, economia e a exploração ilegal das terras indígenas”.

 

Ártico derrete por mais tempo

A temporada de degelo do Ártico vem prolongando-se mais e mais a cada ano, de acordo com informações divulgadas pela Nasa pelo Centro Nacional de Dados de Gelo e Neve (NSIDC) do governo americano. A temporada de degelo expande-se em alguns dias por década, diz nota divulgada pela agência espacial.

“O Ártico vem se aquecendo, e isso faz com que a temporada de degelo dure mais”, disse, por meio da nota, a principal autora do artigo que descreve o fenômeno, Julienne Stroeve, do NSIDC. “O prolongamento da temporada permite que mais energia do Sol fique acumulada no oceano, o que aumenta o derretimento no verão e enfraquece a cobertura glacial”.

O volume de gelo no Ártico vem caindo drasticamente ao longo dos últimos 40 anos. Cientistas acreditam que o degelo poderá ser completo, durante os meses do verão, ainda neste século.