Em meio à Covid-19, segue a busca por soluções para doenças negligenciadas

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** Este texto foi escrito para a campanha #CientistaTrabalhando

O Brasil vive uma crise sanitária, econômica, política e social que escancara desigualdades históricas.

O cenário de completa incerteza exige a multiplicação de esforços ao combate à Covid-19, sem esquecermos, entretanto, doenças como as tropicais negligenciadas (DTNs), que há tempos constituem um enorme desafio à saúde pública e ao desenvolvimento econômico em algumas das áreas mais vulneráveis do planeta. 

Sou pesquisador do Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) há 28 anos, e, desde 2013, coordeno um consórcio internacional que almeja descobrir tratamentos inovadores para as DTNs. Atuamos em parceria com a DNDi (Drugs for Neglected Diseases Initiative) e a Medicines for Malaria Venture (MMV), organizações com ampla experiência na pesquisa de medicamentos e novos tratamentos para populações negligenciadas e que estão contribuindo para salvar milhões de vidas. O projeto também envolve cientistas da Universidade de São Paulo (USP) e conta com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). 

Trata-se do primeiro projeto colaborativo da América Latina voltado às etapas iniciais de triagem e otimização de compostos químicos, cruciais para o processo de descoberta de medicamentos para DTNs. 

Temos o audacioso objetivo de entregar candidatos pré-clínicos de alta qualidade, que prossigam em estudos mais avançados, até se tornarem tratamentos eficazes, acessíveis, seguros e com baixa toxicidade mesmo para grupos mais sensíveis, como crianças e gestantes.

Trabalhamos com três doenças tropicais historicamente relegadas tanto por tomadores de decisão quanto pela indústria farmacêutica. Uma delas é a doença de Chagas, a enfermidade parasitária mais letal da América Latina, levando 14 mil pessoas à morte por ano. Causada pelo protozoário Trypanosoma cruzi e transmitida pelo inseto conhecido por “barbeiro”, a doença dispõe dos mesmos tratamentos há meio século: todos de longa duração, com efeitos colaterais e baixa eficácia em fases mais avançadas.

As leishmanioses, por sua vez, representam um conjunto de doenças causadas por mais de 20 espécies do protozoário Leishmania e são transmitidas a partir da picada do mosquito-palha. Estão diretamente relacionadas a mudanças ambientais, como desmatamento, migrações e falta de políticas habitacionais e de saneamento. Presentes em 98 países nas suas formas visceral, cutânea e/ou mucosa, as leishmanioses colocam em risco mais de 1 bilhão de pessoas.

Já a malária é uma doença infecciosa provocada pelos protozoários do gênero Plasmodium. Em 2018, mais de 405 mil pessoas perderam suas vidas para a enfermidade, sendo 67% crianças menores de cinco anos — em média, uma a cada dois minutos. A malária impõe um desafio adicional: encontrar um medicamento seguro e eficaz de dose única, que possa atuar na redução da transmissão da doença e pavimentar o caminho para sua eliminação. 

** Leia o artigo publicado originalmente no blog COM A PALAVRA da Veja Saúde. Espaço coordenado pelo jornalista Diogo Sponchiato, em que  especialistas, professores e ativistas dão sua visão sobre questões cruciais no universo da saúde. 

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ilustração do pernilongo transmissor da dengue

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Escritor e articulista, o sociólogo foi presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais no biênio 2003-2004