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Estudo demonstra efeitos
de disfunção em crianças
Pesquisa foi feita com alunos de
nove
escolas da rede pública de Piracicaba
Tese
de doutorado sobre fatores associados à qualidade de vida
na saúde bucal mostrou que alunos de nove escolas da rede
pública de Piracicaba, na faixa etária de 8 a 14 anos, podem
estar sendo afetados por sinais e sintomas de disfunção temporomandibular
(DTM). Tal disfunção, a qual acomete a articulação temporomandibular
e os músculos faciais, normalmente ocasiona dor. A pesquisa
também apontou que fatores emocionais como ansiedade e depressão,
medidos por meio de questionários, interferiram na qualidade
de vida desses avaliados. Além do mais, evidenciou que a inclusão
de uma medida objetiva para avaliar o estresse – quantificação
do cortisol na saliva – não esteve propriamente associada
com a pior qualidade de vida e sim com a presença de sinais
e sintomas de DTM bem como o avanço da idade. A amostra somou
dados de 547 entrevistados.
Estas conclusões integram
a tese da odontopediatra Taís de Souza Barbosa, defendida
na Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP) e orientada
pela docente Maria Beatriz Duarte Gavião. Os resultados geraram
a divulgação de dois trabalhos científicos, que foram publicados
nos periódicos internacionais Health and Quality of Life Outcomes
de 2011 e Oral Disease deste ano. O terceiro artigo foi submetido
ao Journal of Clinical Epidemiology. Os três trabalhos pretendiam
ampliar o conhecimento sobre os fatores associados à qualidade
de vida impactada pelas doenças e pelas alterações bucais,
como cárie, maloclusão e DTM. A ideia era compreender melhor
o comprometimento do dia a dia em função destas condições,
bem como atuar na prevenção.
Primeiramente, para fazer
as avaliações, a autora adotou questionários originalmente
concebidos por pesquisadores canadenses, que foram adaptados
e traduzidos para o português ao longo da dissertação de mestrado,
denominados Child Perceptions Questionnaires (CPQ). Esses
questionários são específicos para as faixas etárias de oito
a dez anos (CPQ8-10) e de 11-14 anos (CPQ11-14), respeitando
o desenvolvimento cognitivo destes indivíduos. A amostra foi
dividida nesses dois grupos etários – no de crianças e no
de pré-adolescentes.
A qualidade de vida dos escolares
foi retratada a partir de quatro domínios de saúde: sintomas
orais, limitações funcionais, bem-estar emocional e bem-estar
social. “Concluímos que as crianças e pré-adolescentes que
apresentavam sinais e sintomas de DTM mostraram qualidade
de vida afetada nesses quatro aspectos”, realça Taís.
Como instrumentos clínicos, a pesquisadora utilizou os critérios
da Organização Mundial da Saúde (OMS) para avaliar cárie e
maloclusão, e o instrumento Research Diagnostic Criteria,
que avalia sinais e sintomas da DTM, abrangendo todos os aspectos,
dos movimentos da boca à musculatura da face e do pescoço.
De acordo com a autora da
tese, esta foi a primeira vez a ser utilizado um instrumento
específico de qualidade de vida relacionada à saúde em crianças
e pré-adolescentes com sinais e sintomas de DTM. No estudo,
verificou-se que escolares com a disfunção apresentaram sintomatologia
“dolorosa” (referente à dor muscular), limitações funcionais
(relacionadas à limitação na abertura da boca) e dificuldades
de mastigação.
Nos casos mais graves, envolvendo
as estruturas intra-articulares, comenta a pesquisadora, a
DTM poderia levar a processos inflamatórios em que a artrite
e a artrose poderiam acontecer, descreve ela. “Logo, a avaliação
e o diagnóstico precoce propiciariam evitar maiores comprometimentos
na fase adulta”, pondera, já que a disfunção pode inclusive
promover consequências psicossociais, tema discutido no primeiro
artigo. “Nos indivíduos avaliados, notamos maior comprometimento
dos aspectos emocional e social, por conta justamente da dor.”
Outras variáveis
O objetivo do segundo artigo foi investigar os fatores associados
à qualidade de vida na saúde bucal desses indivíduos. Então,
além da condição clínica do paciente, com problemas como cárie,
maloclusão e sinais e sintomas de DTM, observou-se que fatores
sociodemográficos, como o sexo feminino, por exemplo, podem
interferir na qualidade de vida dos avaliados. “Nessa investigação,
incluímos variáveis psicológicas pela primeira vez, como sintomas
de ansiedade e de depressão, para verificar se haveria influência
direta na qualidade de vida. Notamos que a qualidade de vida
relacionada à saúde bucal foi afetada em crianças ansiosas
e em pré-adolescentes depressivos”, constata a pesquisadora.
No
terceiro artigo, foi investigada a variável fisiológica –
o cortisol, considerado o “hormônio do estresse”. Ela é medida
por meio da sua quantificação na saliva, um método simples
e eficaz que praticamente retrata a concentração do cortisol
no sangue. A intenção da autora era avaliar mais uma variável
psicológica, mas desta vez não por meio de questionários (como
foi avaliada a ansiedade e a depressão), mas usando dados
objetivos. Não houve associação entre o cortisol salivar (que
seria o biomarcador do estresse) e a qualidade de vida destes
indivíduos. Entretanto, o aumento na idade e a presença de
sinais e sintomas de DTM estiveram ligados a maiores concentrações
de cortisol, corroborando outros estudos da literatura.
Agora, como o estudo da odontopediatra
foi do tipo transversal, justifica ela, a coleta foi feita
num único momento e, deste modo, trouxe uma incerteza: a percepção
das crianças e dos pré-adolescentes sobre qualidade de vida
influenciaria os níveis de ansiedade e depressão ou vice-versa?
A pesquisadora acredita que os fatores psicológicos realmente
poderiam influenciar essa percepção, ressaltando a necessidade
de estudos longitudinais para confirmar tais achados.
Avaliação precoce
Na sua tese ainda, Taís procurou enfatizar a relevância
de se fazer uma avaliação precoce, isso a partir dos oito
anos, uma vez que a prevalência da DTM aumenta com a idade,
tanto que ela foi mais notada no grupo de pré-adolescentes
de 11 a 14 anos do que no grupo de oito a dez anos. O
ideal é que esta avaliação ocorra ainda na fase escolar,
aconselha.
Como tem sido verificado
que a DTM também pode mostrar interação com fatores psicológicos,
afirma a odontopediatra, é importante encaminhar pacientes
que apresentem esses indícios para um atendimento mais
específico. O bruxismo, por exemplo, recorda Taís, está
muito relacionado com a DTM e os fatores psicológicos.
Por isso, ao se notarem os seus primeiros sinais – que
são dores de cabeça frequentes e dor muscular na face
–, aconselha-se procurar ajuda profissional especializada.
Os estalos nas articulações
temporomandibulares são sintomas dos mais frequentes em
pacientes com a disfunção. Ocorrem devido ao errado posicionamento
da cartilagem, que está se deslocando para cima do côndilo
abruptamente, quando o paciente abre a boca. E este estalo
pode ou não vir acompanhado de dor. A conduta para o diagnóstico
de DTM deve ser, portanto, bastante criteriosa, exigindo
parecer de um dentista. A doença via de regra é descoberta
através de radiografia ou de ressonância magnética.
A autora da tese salienta
que a DTM pode ser curável, porém quando descoberta a
sua causa. O uso das placas de silicone é bastante encorajada
neste particular, por ser capaz de reposicionar a mandíbula.
Ao invés de ser apertada, é possível utilizá-las mais
‘afrouxadas’, de modo a se alcançar o relaxamento dos
músculos. “A qualidade de vida desse paciente melhora
sensivelmente, porque ele já consegue acordar sem dor
no dia seguinte”, destaca.
Publicações
- Barbosa TS, Leme MS,
Castelo PM, Gavião MB. Evaluating oral health-related quality
of life measure for children and preadolescents with temporomandibular
disorder. Health Qual Life Outcomes, 2011 May 12; 9:32.
- Barbosa T, Castelo P, Leme M, Gavião M. Associations between
oral health-related quality of life and emotional statuses
in children and preadolescents. Oral Dis. 2012 Feb 4. doi:
10.1111/j.1601-0825.2012.01914.x. [Epub ahead of print]
- Barbosa TS, Leme MS, Castelo PM, Gavião MB. Factors associated
with oral health-related quality of life in children and preadolescents.
Submetido ao periódico Journal of Clinical Epidemiology, 2012.
Tese: “Avaliação da saúde bucal, qualidade de vida
e fatores associados em crianças e pré-adolescentes”
Autora: Taís de Souza Barbosa
Orientadora: Maria Beatriz Duarte Gavião
Unidade: Faculdade de Odontologia de Piracicaba
(FOP)
Financiamento: Fapesp
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