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Seminário de Arquitetura Latino-americana
e a construção de um pensamento crítico


Por: Maria José Marcondes

Os Seminários de Arquitetura Latino-americana (SAL) exerceram importante papel na construção do pensamento crítico sobre arquitetura e urbanismo no continente latino-americano nas últimas décadas, conforme aponta a historiografia e a crítica do citado seminário presente em diversas publicações ibero-americanas. Esse evento surge, em 1985, em um período marcado pela redemocratização de alguns países do continente e pela permeabilidade crescente de ideais neoliberais nas políticas culturais vigentes, contaminando diversas esferas da cultura, sobretudo, a arquitetônica e urbanística. Neste contexto foram fomentadas estratégias de resistência de determinado grupo de arquitetos latino-americanos sobre o pensamento e obra arquitetônica local frente às tendências internacionais, no sentido da construção de uma capacidade latente para resistir às forças culturais dos processos de dominação global.

No Seminário fundacional foram definidos os temas da modernidade e identidade como questão central da arquitetura latino-americana, temas esses que permearam as edições seguintes, constituindo um corpo de doutrina que pode ser considerado uma “teoria da arquitetura latino-americana”, como designado na historiografia existente sobre esse evento. A pauta da primeira reunião versou sobre as heranças pré-colombianas e europeias e sua influência na arquitetura latino-americana; a incidência do estilo internacional na região, a arquitetura como resposta à identidade regional, a confrontação das tecnologias próprias e importadas e balanço e prospectiva da arquitetura latino-americana1. Essas abordagens irão marcar as três próximas edições deste evento, apresentando-se diversas narrativas discursivas sobre as temáticas da modernidade e identidade latino-americana.

Na terceira edição do SAL, em Manizales, Colômbia, foi amplamente divulgada a concepção teórica do conceito de “modernidade apropriada”, desenvolvida pelo arquiteto chileno Cristián Fernándes Cox, propondo conceitualmente a existência de modernidades culturalmente diferenciadas, em contraposição à ideia eurocêntrica de uma modernidade universal. Para Cox existe um triplo sentido para o termo apropriação, derivado do conceito “modernidade apropriada”, no sentido de ser adequada a um determinado lugar, objeto ou sujeito, em outros termos ser pertinente ao território latino-americano; no sentido de transferir do outro, de abarcar elementos de outras culturas e utilizá-las como próprias, e finalmente no sentido de um devir próprio, correspondente ao sentido etnográfico de cultura, da relevância dos elementos identitários.

Em Manizales, a chamada terceira geração do movimento moderno, que “alcança paulatinamente seu valor de obra de arte universal a partir a partir de sua síntese entre modernidade e a cultura do lugar” 2 é destacada, como ilustra o Prêmio América atribuído a Luis Barrágan, criado nesta edição com a finalidade de valorizar trajetórias de arquitetos comprometidas com a América Latina e que possam servir de exemplos para as novas gerações.

Outro tema recorrente nas edições do SAL, nesse período, foi o do regionalismo na arquitetura em “contrapartida crítica às soluções universais na arquitetura e também como parte do reconhecimento mundial da pluralidade das culturas” 3 tema esse controverso nos debates do SAL. Como apontou Waisman: “pode significar desde a reinterpretação criativa de correntes mundiais, até, no extremo oposto, a atitude reacionária de um conservadorismo máximo ou de um revivalismo folclórico” 4.

Os temas da identidade, regionalismo e universalismo presentes nas primeiras edições do SAL, são revisitados no presente, relacionados às abruptas mudanças ocorridas nas sociedades latino-americanas nas últimas décadas e as evidências da diversidade latino-americana, ressaltando-se a necessidade de relacionar o continente latino-americano e a região do Caribe e delinear pautas convergentes.

A atualização dos discursos latino-americanos em arquitetura e urbanismo presentes nas últimas edições do SAL intenta rechaçar determinada geração vinculada ao internacionalismo da arquitetura, com uma linguagem arquitetônica e urbanística enfatizando a incorporação da alta tecnologia de forma acrítica. Como apontou Toca Fernández, “a nova arquitetura latino-americana deixará de ser uma possibilidade para converter-se em realidade , quando houver um esforço coletivo no qual os arquitetos atuem como verdadeira vanguarda cultural fazendo obras, que respeitando e valorando nosso passado, incorporem, também, os valiosos avanços da técnica moderna” 5.

Nas últimas edições observa-se, também, o deslocamento dos seminários centrados em obras e autores para a apresentação de grupos de pesquisa, com a ampliação dos temas relativos ao urbanismo e da escala de abrangência das análises, algumas voltadas para a macrometrópole; bem como o compromisso com a contemporaneidade, expressa em análises de novas propostas arquitetônicas para o continente, relativas à noção de público e comunitário.

A realização no Brasil do XIV Seminário de Arquitetura Latino-americana, de 8 a 11 de novembro, na Unicamp, insere-se em um contexto marcado por outros paradigmas na arquitetura e urbanismo contemporâneo em relação à fase fundacional, de resistência do local frente ao global, e por novas concepções da noção de identidade cultural. Sua proposta é a de analisar as contribuições do SAL à crítica da arquitetura e urbanismo latino-americano, decorridos 25 anos de existência do citado Seminário. Por outro lado, refletir sobre projetos de arquitetura pública para a cidade contemporânea.

1 Lala Méndez Mosquera . Identidad y Modernidad, Revista Summa, número 212, Buenos Aires, maio de 1985, pp.23-25
2 MONTANER, J.M.La Modernidad Superada: Arquitectura, Arte y Pensamiento del Siglo XX, Barcelona: Editora Gustavo Gili, 1997, p.22
3 WAISMAN, M.Arquitectura argentina: identidad y modernidad. TOCA FERNÁNDEZ, A.(Ed.) Nueva Arquitectura en América Latina: presente y futuro. México DF: Editora Gustavo Gili, 1990, p.252
4 Idem, op. cit., p. 252
5 TOCA FERNÁNDEZ, A.(Ed.). Nueva Arquitectura en América Latina: presente y futuro. México DF: Editora Gustavo Gili, 1990.


Maria José de Azevedo Marcondes, arquiteta, é professora do Instituto de Artes (IA) da Unicamp e coordenadora-geral do XIV SAL. Seminário de Arquitetura Latino-americana. Este artigo foi originalmente publicado na revista Nossa América, edição 43.

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